Beira Interior:
Beira Interior: desenvolvimento ou subdesenvolvimento?

António de Jesus Fernandes de Matos

Docente na Universidade da Beira Interior.
Doutorando na área do desenvolvimento regional/ordenamento do território

1. Introdução

A evolução das forças produtivas tem sido, ao longo da história, responsável pela evolução económica e social, pelas sucessivas mudanças dos sistemas políticos e pela crescente complexidade das relações inter e intra-sistémicas aos diversos níveis da sociedade.

Com essa crescente complexidade, aumenta também a necessidade de, por um lado, articular e hierarquizar os diversos níveis de planeamento (nacional, regional e municipal) e, por outro lado, de reforçar o trabalho interdisciplinar, quer a nível analítico, quer, sobretudo, a nível da escolha de estratégias, definição de objectivos, fixação de metas, elaboração de programas e de projectos e mesmo a nível da implementação dos planos e do controle da sua execução.

O reconhecimento progressivo da interdisciplinaridade do planeamento tem sido determinado, não só pelas lições do passado, como também pela própria dinâmica de transformação dos espaços urbano e rural e dos hábitos dos seus residentes, necessidades e exigências das populações. Nesta dinâmica de desenvolvimento económico e social, é de primordial importância criar redes de cooperação entre os vários agentes envolvidos (poder central e autárquico, agentes económicos, instituições de ensino formal e técnico-profissional e a população em geral), numa lógica de subsidiariedade e complementaridade.

2. Breve caracterização da região

A Beira Interior, compreendida entre os rios Douro e Tejo, é uma região de fronteira que cobre uma área de 7819 km2 e que representa cerca de 9% da superfície continental de Portugal. O relevo é, de um modo geral, acidentado, com uma altitude média aproximadamente igual a 700 m e que abrange uma só unidade morfológica - o Maciço Antigo. A elevada altitude, o relevo bastante acidentado, a sua disposição e distância em relação à costa são as principais condicionantes do clima desta região, de um modo geral temperado. A precipitação ao longo do ano é irregular.

Os recursos naturais são razoáveis, havendo a destacar as minas de urânio e volfrâmio e as pedreiras de granito. No entanto, os recursos do subsolo não estão devidamente estudados o que dificulta a avaliação do seu potencial económico. As principais bacias hidrográficas que abrangem esta área são as dos rios Douro, Côa, Águeda, Mondego e Zêzere. Em relação aos recursos aquíferos subterrâneos, estes são escassos devido às insuficientes infra-estruturas de retenção, armazenamento de águas e à fraca permeabilidade dos solos.

A capacidade florestal é, em geral, elevada, mas encontra-se subaproveitada, existindo um excessivo uso agrícola em comparação com as reais aptidões do solo. De referir que, segundo o último Censo Agrícola, a Beira Interior utiliza somente 19,6% da superfície agrícola utilizável - SAU - nas actividades silvícolas, enquanto que 64,1% da SAU é utilizada na agricultura. Dada a existência do evidente desfasamento entre as aptidões e a efectiva utilização dos solos, torna--se imperioso o reordenamento do espaço rural. A florestação/reflorestação dos terrenos com capacidade para a silvo-pastorícia poderá ser uma forma de travar a erosão dos solos e fixar a população.

A fraca percentagem do número de empresas localizadas nos distritos da Guarda e de Castelo Branco em relação ao total da Região Centro é sintomático da fraca dinâmica empresarial destes distritos. De referir que a Beira Interior ocupa cerca de 53% da superfície, 26% da população e concentra 24% do total de empresas da Região Centro.

Em termos de emprego, verifica-se uma elevada propensão da população para procurar emprego no estrangeiro, o que leva a que as taxas de desemprego sejam inferiores à do continente. O problema do desemprego é ainda agravado pela desadequada orientação da formação profissional que tem como resultado um forte desequilíbrio estrutural entre a oferta e a procura. No entanto, a presença da Universidade da Beira Interior e dos Politécnicos da Guarda e de Castelo Branco garantirão, a médio prazo, a formação de quadros superiores universitários e técnicos em número suficiente. Os Centros de Formação Profissional e Escolas Técnicas especializadas poderão também contribuir positivamente para o desenvolvimento da região.

A economia da região caracteriza-se pelo peso relativamente exagerado das actividades agrícolas, por uma indústria pouco diversificada e com predominância dos ramos tradicionais pouco inovadores e utilizadores de mão-de-obra intensiva sem grande qualificação técnico--profissional, por grandes diferenças ao nível da distribuição e comercialização de bens e serviços e por um sector de turismo débil. Esta situação reflecte-se na matriz multisectorial para a região, pondo à vista um tecido económico débil, pouco coeso e com importantes deficiências na coluna da produção, que se traduzem num elevado número de células vazias.

De entre os sectores com mais importância económica na região, são de salientar os sectores agrícola e silvícola, têxtil e vestuário, a energia e combustíveis, a madeira e mobiliário, o papel e publicações, a construção e recuperação e a hotelaria e restaurantes. De entre estes, destaque-se a agricultura, silvicultura, lacticínios, têxteis e vestuário dado o facto de serem superavitários no que diz respeito à balança comercial regional. Sublinhe-se, ainda, a importância dos sectores de bens alimentares na diminuição da nossa dependência externa, já que mais de 60% deste consumo a nível nacional é de origem estrangeira.

A breve análise do SC&T da Beira Interior revela um certo dinamismo da actividades científicas e tecnológicas, estimulado fundamentalmente pelas instituições do Ensino Superior, as quais apresentam uma dinâmica relativamente elevada no que toca às actividades de I&D. Tendo em consideração o quadro seguinte, é possível afirmar que o

SC&T regional possui uma componente predominantemente científica, como resultado do protagonismo da Universidade da Beira Interior e dos Politécnicos da Guarda e Castelo Branco, bem como de alguns centros de investigação aplicada existentes na região.

No que concerne ao Estado, apenas a Direcção Regional de Agricultura (DRABI) apresenta algum desempenho em termos de I&D. Outros organismos, como o Instituto de Apoio ás Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI), o Instituto de Comércio Externo Português (ICEP) e o Instituto
 

Mapa 1 Instituições e tipo de actividade (1)
 
Sectores  Instituições  Áreas  Tipo de actividade predominante Dinâmica relativa
Estado DRABI Agricultura, Silvicultura, Pecuária I & D XXX
  IAPMEI

ICEP

IEFP

Informação e apoio às empresas OAC&T XX
Ensino Superior UBI

IPCB

IPG

IPES

Ciência, tecnologia, educação e formação I&D XXX
Empresas   Empresarial OAC&T X
Centros Tecnológicos CITEVE

CILAN

CIEBI

C. Inf. de Debuxo

Informação e apoio tecnológico às empresas   XX
Associações Empresariais ANIL

NERCAB

NERGA

Associações comerciais

Informação e apoio às empresas OAC&T X
 

de Emprego e Formação Profissional (IEFP) têm alguma actividade no âmbito das OAC&T, mas de alcance significativo no contexto regional já que contribuem para a difusão e aplicação de novos conhecimentos.

Atendendo a que o tecido empresarial da região é composto predominantemente por pequenas e médias empresas, é natural que estas não desenvolvam actividades de I&D pelo que a execução de OAC&T se assumam como um vector importante das estratégias de inovação das empresas da região.
 
 

3. Modelos de desenvolvimento

3.1. Apresentação do modelo de desenvolvimento da Região da Beira Interior

Num contexto de desenvolvimento económico e social aos vários níveis (nacional, regional e empresarial), é cada vez mais importante descentralizar as actividades de I&D de forma a identificar os problemas e dinamizar os tecidos produtivos regionais, valorizando os recursos endógenos e exógenos, sob pena de os vermos desaproveitados. Além disto, se as regiões deprimidas, como é o caso da Região da Beira Interior, forem deixadas à sua dinâmica natural, não podemos esperar que estas aproveitam integralmente todas as possibilidades, incluindo aqui o investimento directo estrangeiro - IDE - e os programas de inspiração nacional e comunitária, de que dispõem num clima de livre competição com as regiões mais desenvolvidas. É, portanto, necessário um empenhamento das administrações central e regional, bem como de todos os outros agentes de desenvolvimento (instituições de ensino superior, associações empresariais, sindicatos, etc), de forma a superar estas lacunas.

Relativamente aos próximos anos, o Quadro Comunitário de Apoio II define para a Região Centro (a Beira Interior insere-se nesta região) a seguinte estratégia «? reforçar a rede urbana regional, contribuir para o reforço das infra-estruturas, nomeadamente em matéria de acessibilidade e de ambiente, reforçar as potencialidades da região, em especial pelautilização do património cultural, histórico e cultural, e promover a competitividade regional, contribuindo para aumentar o nível de serviços de apoio à produção disponíveis no interior da região em causa» (2).

No entanto, num país com grandes assimetrias regionais, o eixo 4 - Fortalecimento da Base Económica Regional - apenas representa, para todo o país, 19,8% do total de verbas comunitárias previstas no QCA II. Por outro lado, da distribuição das mesmas verbas por regiões verifica-se que, incluindo o Fundo de Coesão, foram destinadas 19% do total, ou seja, cerca de 97,8 milhões de contos entre 1994/99.

Face à caracterização desta região como fronteiriça, à distribuição de verbas do 2.º Quadro Comunitário de Apoio a Portugal e admitindo que a filosofia de distribuição dos meios, incluindo as do PIDDAC pelas várias sub-regiões da Região Centro, não será alterada significativamente, continuaremos a assistir à degradação das condições económicas e sociais da região e ao êxodo das populações para o litoral e o estrangeiro.

A inversão desta situação, ou por outras palavras, a forma de evitar que a região se transforme num vasto deserto europeu, terá que se basear na implementação de um modelo de desenvolvimento assente em quatro vectores fundamentais:

* Esbatimento do efeito fronteira/interioridade, através da intensificação de formas de cooperação, tendo em vista a coesão económica e social da região e a sua inserção crescente no mercado internacional;

* Desenvolvimento rural integrado da região e preservação do património cultural, arquitectónico, histórico e natural;

* Melhoria dos sistemas de comunicação e ordenamento do território;

* Desenvolvimento e especialização do Sistema Científico & Técnológico da Raia Central Ibérica.

O desenvolvimento destes quatro vectores chave, que constituem o modelo de desenvolvimento para a região, terá de ser encarado no seu todo, numa perspectiva integradora e articulante, sob pena de se empobrecerem consideravelmente os efeitos multiplicadores dos investimentos canalizados para a região. 

O modelo de desenvolvimento apresentado aposta, por um lado, na qualidade da nossa agricultura, indústria e serviços e, por outro lado, na conquista de nichos na vanguarda da tecnologia. O acompanhamento da evolução da ciência e tecnologia é importante, mas tal como para Portugal, a região transfronteiriça ibérica deve «ligá-las à cultura e definir um desenvolvimento, onde as grandes apostas de qualidade se relacionem com as pequenas e médias indústrias, com empresas familiares e artesanais, com iniciativas locais, apostas que permitem a defesa dos valores e de bens regionais» (3). Este modelo de desenvolvimento regional deve abranger, igualmente, as chamadas «indústrias culturais» e as «indústrias de ponta» ou nichos estratégicos para as quais a região disponha de vantagens competitivas.

O modelo exposto privilegia a componente interna, já que uma estratégia de desenvolvimento, para ser consistente e viável, terá de tomar como ponto de partida os recursos endógenos. É em torno do desenvolvimento endógeno que se elabora o plano de acção e se programam as necessidades de apoios exógenos de importância fulcral para o início de um processo de desenvolvimento auto-sustentável. Este processo implica que seja reconhecida a perenidade da actividade humana e do desenvolvimento sócio-económico, os quais dependem, por seu turno, da qualidade do ambiente, dos recursos naturais e da sua conservação em condições satisfatórias para as gerações seguintes. A admissão de que os recursos naturais são finitos deve levar ao encorajamento da reutilização e reciclagem dos materiais ao longo do processo de criação/consumo, de forma a evitarem--se os desperdícios e o seu esgotamento. Paralelamente, é necessário alterar os padrões de comportamento humano que devem reflectir este tipo de preocupações. É tendo em consideração todos os condicionantes atrás descritos que se aponta um conjunto de cluster?s, na terminologia de Porter, pelas quais passa o desenvolvimento da Raia Central Ibérica:

* Cluster dos lanifícios, cujos efeitos secundários devem ser procurados fundamentalmente nos multiplicadores de mercado, através do reforço da indústria do vestuário e confecções. De realçar, ainda, os efeitos a montante, nomeadamenteatravés da produção de maquinaria, equipamentos, componentes e actividades de manutenção e de reparação.

* Cluster das madeiras, com efeitos a montante na produção florestal e de equipamentos e actividades de manutenção e reparação. A jusante a sua influência faz-se sentir na produção de mobiliário, materiais de construção, pasta de papel e comercialização de madeiras nos mercados externos.

* Cluster dos produtos frutícolas, hortícolas e de pecuária, com efeitos, a montante, sobretudo nas actividades de manutenção e de reparação de equipamentos e maquinaria agrícola e, a jusante, nas indústrias agro alimentares, na criação de redes de frio, prestação de serviços diversos aos agricultores.

* Cluster dos vinhos, com efeitos nas actividades primárias e a exigir a criação de um organismo único para a comercialização e o marketing internacional, a modernização dos processos de produção e controlo de qualidade.

* Cluster do turismo, cujos efeitos se propagam na valorização do património cultural, na gastronomia e artesanato da região, na ampliação do mercado de produtos regionais e na melhoria da imagem da região no exterior.

* Cluster ensino/investigação com efeitos em toda a actividade produtiva, quer preparando quadros altamente qualificados, quer proporcionando novos conhecimentos, técnicas e métodos de produção inovadores. Estas instituições, funcionando como centros de investigação e difusores de conhecimento, são indispensáveis para o desenvolvimento da região.
 
 

3.2. Implementação do modelo

A implementação do modelo de desenvolvimento exposto no parágrafo anterior pressupõe a convergência de um conjunto de acções estratégicas, nomeadamente:

1. Forte empenho das administrações centrais e regionais, não apenas em termos de canalização de financiamentos para oreforço e melhoria da rede de transportes e comunicações, mas também no sentido de melhorar o nível educacional e de formação profissional, as condições de acesso à saúde e segurança social, o reforço de equipamentos culturais, do apoio logístico às actividades económicas e à investigação fundamental e, sobretudo, à aplicada.

2. Motivação das populações para se empenharem na implementação do modelo de desenvolvimento através da criatividade empresarial, da inovação em termos de consumo e de produção, na valorização dos recursos da região, nomeadamente os valores culturais, as actividades artesanais, a gastronomia, a preservação da natureza.

3. Reforço do espírito de risco e dinâmica inovadora dos empresários da região e atracção de novos empresários inovadores.

4. Orientação adequada da investigação e aplicação atempada dos seus resultados ao desenvolvimento económico.

5. Aposta na dimensão transfronteiriça do desenvolvimento, através da adequação das instituições, da legislação e regulamentação e de acções concretas de cooperação ao nível económico, cultural, social e científico.

A dinâmica de desenvolvimento regional, a sua consolidação como um modelo alternativo passa, entre outras dimensões, pela representação desse desenvolvimento enquanto «produto» de uma dinâmica horizontal de negociação colectiva e empenhamento solidário territorialmente localizada (4). A negociação colectiva é marcada pelo diálogo e interacção solidária num trabalho conjunto dos vários actores, ou seja, dos especialistas, representantes do poder público, empresários, instituições de ensino, associações empresariais e sindicais e da população, com igual capacidade de decisão. 

Deste modo, dado que a dinâmica de desenvolvimento regional se constitui em actos colectivos de articulação criativa entre distintos actores, é necessário dinamizar as estruturas e procedimentos formais do «partenariado». Em virtude de, como refere Abou Sada, estarmos perante diferentes instituições com estatutos diferentes que operam a níveis também diferentes e sem relações de dependência, a relação de partenariado estabelece sinergias entre os vários intervenientes com o fim de tratar tarefas complicadas que poderiam ser consideradas, por cada um dos parceiros, como sendo do seu domínio de competência (1993: pág. 58).

No contexto histórico e geográfico em que nos movimentamos, em termos de partenariado, importa realçar a pertinência do reforço da cooperação universidade/empresa à qual deve ser imprimida uma dimensão transfronteiriça. Só assim se poderão conhecer as necessidades do tecido empresarial, garantir o encurtamento do ciclo investigação-desenvolvimento tecnológico-inovação-competitividade e desenvolvimento, contribuindo para aumentar a rentabilidade económica da investigação. Esta cooperação universidade/empresa exige a convergência de esforços dos empresários e das instituições de ensino superior e de investigação da região.

O protagonismo das autarquias e de outras instituições públicas na promoção dessa cooperação é igualmente importante. A cooperação transfronteiriça garantirá um enriquecimento mútuo, permitindo a troca de experiências e facilitando a difusão da informação. Permitirá também obter uma «dimensão crítica» nas actividades de investigação e facilitará, por vezes, a utilização de equipamentos e laboratórios existentes numa das instituições por investigadores de ambos os países, contribuindo para aumentar a sua rentabilidade. Permitirá ainda dar à investigação a dimensão transfronteiriça que o modelo de desenvolvimento requer.

Os diagnósticos económico e social, onde se definem os estrangulamentos e potencialidades desta região transfronteiriça, as perspectivas de evolução da economia mundial, a política económica e social do país, a avaliação do potencial científico e tecnológico, do sistema de ensino e das necessidades de I&D, são os elementos imprescindíveis para a elaboração de um modelo de desenvolvimento. A integração sistémica do ensino, da investigação, da inovação e do desenvolvimento no todo social sugere a elaboração de três planos de acção devidamente articulados:

* O plano de desenvolvimento do sistema real em causa;

* O plano de ensino técnico e superior;

* O plano científico e tecnológico.

O processo investigação-descobertas científicas-progresso técnico-inovação-desenvolvimento não é linear, mas sim um processo que, por um lado, necessita de um meio apropriado para se desenrolar sem bloqueios e, por outro, é dinâmico e iteractivo, é um processo de cognição e de aprendizagem. Esse meio apropriado é formado, por um lado, pelas tradições, pelo património arquitectónico e cultural e pelos costumes locais e, por outro lado, pelas dinâmica empresarial e possibilidade de existência de sinergias no processo. O espírito de risco dos empresários, a identificação do trabalhador com os objectivos do processo e as exigências do consumidor, em termos de qualidade, são também elementos importantes do meio. 

O ciclo interno do processo de investigação deve partir das necessidades potenciais das actividades económicas e terminar na investigação fundamental. Isto é, sem pôr em causa a liberdade do investigador e a sua criatividade, importa criar mecanismos que garantam que, em primeiro lugar, a investigação se oriente para satisfazer as necessidades de desenvolvimento económico da região, começando pelos estudos de mercado, actividade de planeamento, investigação aplicada ligada às questões da produtividade, melhoria da qualidade e da apresentação dos produtos, terminando na investigação fundamental.

Assim, em termos sectoriais, importa que a investigação se oriente, em primeiro lugar, para:

* Reestruturação integral dos lanifícios e do vestuário;

* Reforço e modernização da agronomia e da indústria agro alimentar;

* Desenvolvimento do «cluster» das madeiras, mobiliário e produção florestal;

* Preservação das fontes e aproveitamento multi-uso dos recursos hídricos.

* Preservação do património arquitectónico e arqueológico e do artesanato;

* Desenvolvimento do turismo na base das potencialidades da região.

A investigação, se bem que orientada sectorialmente, deve ser eminentemente pluridisciplinar, de forma a que os vários pontos de vista e sensibilidades diferentes sobre o mesmo problema permitam encontrar as soluções mais racionais e economicamente rentáveis. Esta investigação deverá indicar os meios e as formas de promover o desenvolvimento auto-sustentável, assegurando, deste modo, às gerações futuras, recursos naturais e condições ambientais favoráveis. 

Num contexto em que, um pouco por todo o mundo, os problemas do ambiente e do ordenamento do território atingem proporções preocupantes, pensamos que a investigação sobre esta temática na região poderá ser um contributo importantíssimo para o seu desenvolvimento. A criação de um centro transfronteiriço de informação geográfica na UBI (5) poderá constituir uma base sólida para a promoção do crescimento económico harmonioso que se pretende imprimir nesta região deprimida. A investigação a realizar terá como objectivo principal responder ás solicitações dos agentes de desenvolvimento, no âmbito da sua especialidade, a divulgação dos produtos do Centro e sua utilização na actividade económica, bem como a elaboração e aferição de metodologias no domínio da recepção, tratamento e difusão da informação.

As orientações concretas de investigação e estudos de desenvolvimento, orientadas pela procura, deverão em nosso entender apoiar-se a longo prazo no seguinte modelo apresentado sob a forma de fluxograma (6).

3.4. Ordenamento do território: condição essencial para o desenvolvimento

3.4.1. Considerações gerais sobre ordenamento do território

A crise da economia ocidental e com ela das regiões, na década de 70, conduziu a uma profunda mudança no tipo dos problemas de ordenamento do território. Uma das roturas mais evidentes traduziu-se pelo denominado processo de «desindustrialização». A importância desta questão foi tal, ao ponto de se identificar completamente a crise urbana com a crise industrial (Martin; Rowthorn, 1986). A diminuição de postos de trabalho já existentes e a quebra drástica dos ritmos de criação de novos empregos industriais levam as aglomerações urbanas não só a perderem uma boa parte dos seus efeitos de atractividade, como a acumularem tensões sociais cada vez maiores, já que a sobre-especialização dificulta a mobilidade profissional. Ao nível territorial/urbano, a crise industrial é visível na degradação ambiental, como são os casos dos edifícios e zonas industriais «abandonadas» ou das infra--estruturas portuárias desactivadas, mas também no acentuar da marginalização das antigas «cinturas vermelhas», onde se concentravam as populações operárias. A perda de competitividade e a obsolescência de muitos segmentos da produção industrial conduzem à sua migração para países e regiões onde o custo dos factores de produção e as exigências sociais e ambientais são menores. Paralelamente, assiste-se à crescente internacionalização do sistema económico e terciarização das economias, com a consequente desertificação de vastas zonas de território. A internacionalização urbana tem várias incidências, nomeadamente:

1. Ao nível da progressiva concentração urbana de funções económicas de carácter direccional, conferindo a algumas metrópoles papéis-chave na gestão e no controlo da rede global das transacções internacionais, e do desajustamento crescente entre o quadro de incidência das políticas (local e urbano), por um lado, e a regulação (internacional) do sistema económico, por outro;

2. Forte polarização entre cidades que funcionam como «portas», «placas giratórias» e «nós» do relacionamento internacional à escala da economia-mundo, por um lado, e cidades que ficam limitadas à sua influência regional e nacional, por outro;

3. Importância crescente das condições logísticas.

O processo de terciarização, a que se assiste um pouco por todo o mundo, é uma componente da complexificação dos processos de produção e distribuição. A expansão e diversificação das funções e das actividades de serviços inscrevem-se no processo da divisão social e técnica do trabalho. A ocorrência dos vários serviços tem uma matriz predominantemente urbana, levando à concentração nas cidades segundo um processo de «aglomeração em rede» cuja raiz explicativa tem a ver com o efeito das «economias de aglomeração» que derivam da proximidade física entre actividades especializadas mas, de alguma forma, complementares ou interdependentes do ponto de vista da organização da oferta, do uso de infra-estruturas comuns, do acesso a um mercado de trabalho diversificado, da aproximação a clientelas comuns, etc. 

É assim que, do período em que se programavam investimentos públicos, fazendo uso da folgada capacidade financeira da administração central e local, se passou a uma situação de crise, em que a definição de prioridades e o faseamento cuidadoso dos investimentos se tornaram críticos. Além disso, em muitos casos, deixou praticamente de ser necessário prever extensas áreas de expansão, tornando-se mais útil dar prioridade às acções de conservação, renovação e restauro das áreas urbanas existentes. Do ponto de vista físico, morfológico estes planos serão os «planos de 3.ª geração» (Venutti, 1987) ou, como refere Nuno Portas (Portas, 1992), os planos dos «rr», isto é, renovação, recuperação e revitalização. Estes planos não são generalistas e reguladores da expansão urbana, antes pelo contrário são planos de transformação e de urbanismo intensivo.

As relações entre a gestão dos recursos, os sectores da produção e dos serviços e a gestão da mobilidade, bem como as relações entre estes e o desenvolvimento sustentável (ao nível do país e/ou da região) não são unívocas; pelo contrário, é de realçar a sua interactuação einterdependência. Em termos de gestão da mobilidade, o ordenamento do território aparece em lugar de destaque e, sendo este interdisciplinar, é composto por vários sistemas e domínios, nomeadamente: a demografia, os estabelecimentos humanos, a floresta, a agricultura, a ecologia, as redes de distribuição, a conservação do património e o recreio, que, por sua vez, se desdobram em vários subsistemas tal como se pode verificar no quadro adaptado de A. V. Barreto (7).

Quadro 1 Componentes do ordenamento do território

Sistemas e domínios

Sub-sistemas
 
1. DEMOGRAFIA
1. Urbanização

2. Espaços rurais

3. Regiões de fronteira

 


2. ESTABELECIMENTOS HUMANOS

1. Habitação

2. Indústria

3. Equipamentos e serviços

 


3. FLORESTA

1. Produção

2. Conservação

3. Ordenamento

 


4. AGRICULTURA

1. Classificação dos solos

2. Intensiva

3. Extensiva

 


5. ECOLOGIA

1. Gestão e utilização da terra (recursos)

2. Protecção e conservação da  biodiversidade

 


6. REDES DE DISTRIBUIÇÃO

1. Transportes

2. Telecomunicações

3. Energia

 


7. CONSERVAÇÃO DO PATRIMÓNIO

1. Natural

2. Cultural

3. Humanização

 


8. RECREIO

1. Actividades desportivas

2. Actividades de lazer

3. Viagens turísticas

 
   

A complexidade do ordenamento do território leva a que a elaboração de um Plano de Ordenamento do Território compreenda seis etapas principais, nomeadamente:

* Identificação e descrição do sistema com reconhecimento das variáveis mais importantes;

* Estabelecimento de uma hierarquia de valores considerados essenciais no Plano;

* Definição de objectivos baseando-se nos problemas actuais e nas aspirações e expectativas dos agentes económicos;

* Elaboração de alternativas que satisfaçam os objectivos sem violarem o sistema;

* Apuramento da solução, isto é, classificação e escolha da melhor solução tendo em consideração as alternativas existentes e conceitos mais subjectivos;

* Execução do Plano e seu controle.
 
 

3.4.2. Os Planos de Ordenamento do Território a nível nacional

Os Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT), elaborados pelas Comissões de Coordenação Regional, constituem-se de acordo com o Decreto-Lei n.º 176-A/88, de 18 de Maio, como «? instrumentos de carácter programático e normativo visando o correcto ordenamento do território através do desenvolvimento harmonioso das suas diferentes parcelas pela optimização das implantações humanas e do uso do espaço e pelo aproveitamento racional dos seus recursos» e têm por objectivos (8), entre outros, a concretização para a área por eles abrangida da política do ordenamento, a definição das opções e o estabelecimento dos critérios de organização e uso do espaço, tendo em conta, de forma integrada, as aptidões e potencialidades da área abrangida, bem como o estabelecimento de normas gerais de ocupação e utilização que permitam fundamentar um correcto zonamento, utilização e gestão do território abrangido, tendo em conta a salvaguarda de valores naturais. No início de 1995, estavam em vigor quatro PROT, nomeadamente: PROZED - Plano Regional de Ordenamento da Zona Envolvente do Douro; PROZAG - Plano Regional de Ordenamento das Albufeiras da Aguieira, Coiço e Fronhas; PROTALI - Plano Regional de Ordenamento do Litoral Alentejano; PROTAL - Plano Regional de Ordenamento do Algarve e encontravam-se em elaboração o Plano Regional de Ordenamento do Alto Minho, o Plano Regional de Ordenamento do Centro Litoral, o Plano Regional de Ordenamento da Zona dos Mármores (PROZOM) e o Plano Regional de Ordenamento da Zona Envolvente da Albufeira do Alqueva (PROZEA). Há, ainda, uma proposta de Plano Regional de Ordenamento da Área Metropolitana de Lisboa. De forma a ordenar as zonas de protecção das albufeiras, designadamente a definição dos princípios e regras de utilização das águas públicas e da ocupação, uso e transformação do solo da respectiva zona de protecção foram aprovados, por despacho conjunto do MPAT e do MARN, os Planos de Ordenamento das Albufeiras do Azibo, Caniçada, Vigia, Gameiro e Castelo do Bode.

Os Planos Municipais de Ordenamento do Território (PMOT) constituem-se como Planos de Desenvolvimento Económico e Social, de Ordenamento do Território e de Ordenamento Urbano. Os PMOT (9) são da competência dos municípios e compreendem os Planos Directores Municipais (PDM), os Planos de Urbanização (PU) e os Planos de Pormenor (PP) devendo estes três níveis de planeamento municipal estarem articulados entre si. Os PDM, como peças fundamentais obrigatórias incluem a Carta de Ordenamento, a Carta Actualizada de Condicionantes, a Carta de Enquadramento e o Relatório de Medidas, Indicações e Disposições Adoptadas (10). De referir, no entanto, que as duas primeiras são consideradas peças fundamentais do PDM, enquanto as restantes são complementares. Em Setembro de 1994, do conjunto dos 275 concelhos do Continente, 103 ou seja 37,5% das autarquias dispunham de PDM. De referir que estes concelhos representam um terço da superfície do Continente e mais de metade da população (52,6%). Em Julho de 1996, 228 dos municípios, ou seja cerca de 83% do total, tinham o seu PDM ratificado. De registar que na «região» Norte e do Algarve o processo encontra-se mais adiantado com um índice de quase 100% de processos concluídos. Em contrapartida, Lisboa e Vale do Tejo parece ser a região em que o processo está mais atrasado; na verdade mais de 40% dos municípios não dispunha nesta data de PDM. Em termos de PU e PP a situação tem vindo a conhecer algum desenvolvimento, prevendo-se um maior dinamismo na elaboração destes planos por parte dos municípios o que poderá significar, a prazo, uma mudança qualitativa na produção do solo urbano, até há pouco tempo predominantemente assente em operações de loteamento promovidas pelos particulares, na maior parte dos casos sem enquadramento estratégico em instrumentos de planeamento do município.

Na preparação dos Planos Municipais de Ordenamento do Território, que correspondem ao nível mais baixo dos PROT, por um lado, tem que se ter em consideração «? as normas, princípios e decisões que traduzem a consideração do interesse nacional, consolidam opções de âmbito supra municipal e asseguram a homogeneidade ao tratamento de situações exigindo actuação integrada» (11) e, por outro, pretende--se promover a racionalização da ocupação do território nacional e da utilização dos seus recursos naturais, pelo que os Planos Municipais de Ordenamento do Território devem ser articulados com os Planos Regionais de Ordenamento do Território. De uma leitura preliminar, necessariamente não exaustiva, de um número significativo de PDM já finalizados tiram-se duas importantes conclusões:

a) Os casos em que do dossier se retira um quadro estratégico de desenvolvimento do concelho minimamente sistematizado são minoritários. Não obstante, nos PDM é geralmente abordada a problemática do desenvolvimento local e são formuladas propostas coerentes neste domínio;

b) Os regulamentos dos PDM são bastante latos, deixando margens de liberdade para o uso e transformação do solo, permitindo estratégias de desenvolvimento eventualmente divergentes ou até contraditórias entre si.

No sentido de integrar nos PDM a componente estratégica, seriam necessários dois ajustamentos, ou seja, por um lado incluir-se-ia oQuadro Estratégico de Desenvolvimento (opções estratégicas do Município e por ele assumidas) e, por outro, um Quadro de Iniciativas a Desenvolver (incluindo as condicionadas pela verificação de determinados pressupostos ou que vissem a sua efectivação dependente de contratualização com a administração central/regional). A implementação destes dois quadros levaria à criação de um mecanismo específico proporcionador, de forma expedita, da alteração do plano/regulamento do uso dos solos para introdução das implicações territoriais das iniciativas atrás referidas que se fossem formalizando. Admitindo que o processo de produção da primeira geração de PDM (a terminar a muito curto prazo) permitiu ultrapassar a inexperiência neste tipo de planos, pensamos ser necessário proceder a uma revisão dos actuais PDM de forma a ultrapassar as lacunas que se vão detectando: desactualização geral da cartografia utilizada, a incorrecta definição dos critérios de delimitação espacial das Reservas Agrícola Nacional e Ecológica Nacional (RAN e REN), a quase inexistente interligação dos vários PDM de concelhos limítrofes, que se traduz frequentemente na sobreposição de propostas. A resolução destas graves lacunas só poderá ser levada a bom termo se dispusermos de bases cartográficas de qualidade e devidamente actualizadas. Aliás, a digitalização das mesmas, a criação de bases de dados geo-referenciáveis (SIG?s) e a utilização de satélites no âmbito do planeamento/ordenamento do território, além de serem indispensáveis para a actualização permanente de toda a informação de âmbito municipal e regional, tornaram-se, por outro lado, num instrumento de importância primordial para o planeamento a nível municipal, sub-regional, regional e nacional. 

O Ordenamento do Território é pois um processo mediante o qual se estabelecem, em sentido amplo, as necessidades das populações actuais e futuras de forma a conciliar a oferta biofísica e as suas possibilidades com a procura sócioeconómica. Qualquer dos métodos utilizados actualmente no ordenamento do território tem, à semelhança do planeamento de desenvolvimento social e económico, como característica importante a sua interactividade. O carácter cíclico dos métodos utilizados, ao contrário dos métodos sequenciais, consoante as etapas dos estudos a realizar e dos factores e domínios a percorrer, geram sucessivamente novas propostas em contínuo processo de tomada de decisões. Daí se poder afirmar que, normalmente, a gestão territorial põe permanentemente em causa o próprio planeamento, de tal forma que o Ordenamento do Território nunca se encontrará plenamente realizado. Ao mesmo tempo, este deve-se limitar, cada vez mais, às grandes linhas orientadoras de carácter nacional, deixando ao nível local e à gestão a responsabilidade da sua adaptação às condições reais do meio envolvente. É, contudo, imprescindível que o planeamento a nível local respeite, sem deturpações nem ambiguidades, as grandes linhas de orientação da política nacional que se traduzem nas leis fundamentais do Ordenamento do Território de forma a integrar os vários planos. Assim, e a título de exemplo, os Planos Directores Municipais (PDM) devem integrar-se de forma harmoniosa nos objectivos e orientações dos Planos de nível mais geral, como os Programas Operacionais de Desenvolvimento, e nos Planos de nível regional ou sub-regional, que se integram por sua vez, no Plano de Desenvolvimento Regional. Por outras palavras, os vários níveis de planeamento (municipal, sub-regional, regional e nacional), além de apresentarem dinâmicas próprias e características específicas, estão interligados entre si, sendo mutuamente influenciados. Assim, um plano de nível inferior deve-se enquadrar harmoniosamente num plano de nível superior e este, por sua vez, exerce influência no anterior. Por outras palavras, pode-se afirmar que os planos, embora se possam situar em níveis diferentes, são interdependentes e inter-actuantes. Não obstante o esforço desenvolvido, nos últimos tempos, continua a existir um desfasamento entre os instrumentos de planeamento à escala municipal e os planos de escala hierárquica superior, designadamente os Planos Regionais de Ordenamento do Território.

Em Portugal, a base legal do Ordenamento do Território é constituído fundamentalmente pelas Leis das Reservas Agrícola Nacional e Ecológica Nacional (RAN e REN), Bases do Ambiente e de Ordenamento do Território. No entanto, elas não estão enquadradas num «pacote» legislativo uniformizado e iterativo provocando uma certa desorientação aos investidores, organismos de controle e à população em geral, pelo que a sua elaboração é urgente. Outra questão a merecer atençãoé o facto de as questões ambientais e do ordenamento do território se encontrarem sob a responsabilidade de Ministérios diferentes, o que restringe, por um lado, uma unidade de pensamento e de acção e, por outro, reduz a eficácia de uma política global e correcta de desenvolvimento, já que o ordenamento do território não existe sem os estudos de caracterização local que permitem definir com rigor a aptidão biofísica, ambiental e paisagística do terreno.

De referir que a integração das várias economias europeias coloca novos desafios e problemas aos agentes económicos nacionais e estrangeiros, enquanto utilizadores de espaço. O planeamento espacial a nível europeu acaba por ser um requisito essencial para o desenvolvimento harmonioso da União Europeia e para uma melhor integração das áreas que lhe são periféricas. Por outro lado, os benefícios potenciais do Mercado Interno serão, eventualmente, melhor realizados se liquidarmos os problemas espaciais tais como o congestionamento dos grandes centros e da área central mais rica da Europa, a falta de ligações nas redes de comunicações e uma certa incongruência das políticas económicas dos países-membros, já que estas situações diferenciadas acabam por impedir uma afectação mais racional dos recursos comunitários. Na sequência da reforma dos Fundos Estruturais, levada a cabo em 1988, e tendo em consideração a necessidade de promover a Coesão Económica e Social e o Mercado Interno, a Comissão nos seus documentos «Europa 2000» e «Europa 2000+» analisa diversos factores importantes para a organização do território europeu, as principais evoluções urbanas, rurais e fronteiriças e os sistemas e instrumentos de ordenamento do território que dependem essencialmente da responsabilidade dos Estados-membros e das instituições regionais, bem como apresenta as perspectivas transnacionais do território europeu até 2010.

A Comissão, atenta aos problemas do desenvolvimento/ordenamento do território, criou, além dos instrumentos financeiros, um Comité de Desenvolvimento Espacial (constituído pelos vários Estados-membro) para troca de informações sobre as Políticas de Ordenamento do Território dos diferentes países, bem como para a preparação das decisões do Conselho de Ministros da Política Regional e Ordenamento doTerritório. Discute-se igualmente, no seio da União o EDEC - Esquema de Desenvolvimento do Espaço Europeu - que deverá reflectir três grandes preocupações, ou seja, um sistema urbano mais equilibrado e policêntrico, a gestão do património natural e cultural e o acesso equilibrado às infra-estruturas e às redes imateriais de infra-estruturas, nas quais se incluem as redes científicas (Pires, M. 1995).

Assim, tendo em consideração que a situação económica e social tem características bastante semelhantes em ambos os lados da fronteira luso-espanhola, pensamos que o desenvolvimento da vasta área correspondente à raia central portuguesa-espanhola deveria seguir um padrão idêntico ao dos países europeus mais avançados nesta matéria, já que, ao estabelecermos políticas de ordenamento e desenvolvimento devidamente articuladas e compatibilizadas, estaremos a potenciar os laços históricos, culturais e económicos já existentes, criando complementaridades que se poderão transformar num instrumento, de primordial importância, na ordenação territorial desta área transfronteiriça e na maximização dos recursos endógenos.

5. Notas finais

A escolha de uma estratégia de desenvolvimento, para ser consistente e viável, terá de tomar como ponto de partida os recursos endógenos. É em torno do desenvolvimento endógeno ou desenvolvimento «from below», na terminologia de Stohr (1981), que se elabora o plano de acção e se programam as necessidades de apoios exógenos, de grande importância para o início de um processo de desenvolvimento autosustentado.

Não sendo elevados os recursos e as potencialidades de desenvolvimento da região, contudo, eles estão longe de serem plenamente utilizados, não podendo o seu atraso relativo ser totalmente atribuído à inexistência de recursos endógenos mas, fundamentalmente, à ausência de uma política de desenvolvimento regional harmonioso que canalize para esta região os apoios exógenos necessários para criar condições do desenvolvimento assente na valorização dos recursos locaisdevidamente enquadrados por uma política coerente de ordenamento do território nacional. A situação em que nos encontramos é resultado, por um lado, de uma política muito branda ou quase inexistente de ordenamento do território, embora, nos últimos anos, se tenha a vindo a notar um esforço do poder central e local para alterar esta realidade. Por outro lado, os crescentes problemas ambientais (poluição de vastas áreas terrestres, do oceano e zonas ribeirinhas, dos cursos de água e lagos e da atmosfera) levam a uma tomada de consciência nesse sentido. O terceiro factor tem a ver com a escala crescente de utilização de recursos naturais que pode pôr em causa a própria sobrevivência da humanidade. É assim que ganha importância crescente a utilização das chamadas tecnologias limpas, consumidoras de menores recursos, menos poluidoras e que possibilitam a reciclagem e reutilização dos materiais. Aliás, a indústria do ambiente tem condições únicas para, num futuro muito próximo, se constituir num importante ramo de produção com amplas possibilidades de desenvolvimento, movimentando importantes recursos humanos, materiais e tecnológicos.

O ordenamento do território é um elemento importante que permite estruturar o espaço, enquanto suporte de toda a actividade humana de acordo com as suas aptidões biofísicas. Assim, ganha importância crescente a elaboração dos PMOT, constituídos pelos PDM, PU e PP, e dos PROT que embora sejam elaborados a níveis e por entidades diferentes devem estar interligados entre si. Da mesma forma, os vários PROT devem estar em consonância com o PDR elaborado pelo governo central. De referir ainda que a elaboração dos vários PDM têm levantado problemas (cartografia desactualizada, desarticulação entre os PDM de concelhos vizinhos, critérios deficientes de delimitação das áreas destinadas à RAN e à REN) que será necessário suprimir aquando da revisão dos planos, sob pena de corrermos o risco da sua desvalorização.

A criação e manutenção de SIG a nível concelhio e regional será uma forma inovadora, pelo menos para a Beira Interior, de resolver este problema e paralelamente permitirá aos decisores públicos e privados acederem a um importante instrumento de planeamento do desenvolvimento sócioeconómico e de ordenamento do território.
 
 
 

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"Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1994", 1995, DGOTDU/MPAT, Lisboa
 
 


(1) Reigado, F. M. e outros, 1995, Avaliação do potencial científico e tecnológico e das necessidades de investigação orientadas para o desenvolvimento da região, Programa Stride, CEDR/UBI, Covilhã.

(2) Quadro Comunitário de Apoio 1994/99 Portugal, Comissão das Comunidades Europeias, Bruxelas.

(3) Veiga Simão, J., "Estratégias de I&D para o século xxi", in Seminário «Investigação, Inovação & Desenvolvimento», CEDR/UBI, 15 e 16 de Abril de 1994, Covilhã.

(4) Novoa, A. et all, 1992, Formação para o desenvolvimento (Uma experiência participada de formação de agentes de desenvolvimento), Fim de Século Edições, Lisboa.

(5) Em colaboração com a Universidade de Salamanca e e os Institutos Politécnicos da Guarda e de Castelo Branco.

(6) Reigado, F. M., 1995, "Modelo de Desenvolvimento e Necessidades de Investigação", in Seminário «Investigação, Inovação e Desenvolvimento Transfronteiriço III», CEDR/UBI, 26 a 28 de Janeiro, Covilhã.

(7) Barreto, A. V., 1991, "O ordenamento do território e a floresta", in Ingenium Revista da Ordem dos Engenheiros, Julho/Agosto.

(8) Decreto-Lei n.º 176-A/88, de 18 de Maio, Diário da República, n.º 115, de 15 de Agosto de 1988.

(9) Decreto-Lei n.º 69/90, de 2 de Março, Diário da República, n.º 51, de 2 de Março de 1990.

(10) Idem.

(11) Idem.boa.