Jantar em honra do Presidente Chissano


21 de Abril de 1999


Tenho o prazer e o privilégio de, em nome do Povo Português, exprimir quanto nos congratulamos com a presença de Vossa Excelência entre nós.

Presença que, desde logo, significa o reafirmar dos laços fraternos que unem os nossos dois povos e países, numa relação que, mergulhando no Passado, sabe ter no Futuro o seu destino.

Presença que, coincidindo com as comemorações do quarto de século da alvorada libertadora do 25 de Abril - a que Vossa Excelência nos concede a honra de assistir - assume, na linguagem necessariamente simbólica que enforma as Visitas de Estado, o claro reiterar de um reencontro, por vontade própria, entre dois Estados livres e soberanos.

Presença que, no complexo e conturbado Mundo em que vivemos, traduz a excelência de um relacionamento bilateral, que, em gratificantes palavras proferidas por Vossa Excelência, representa um caso exemplar para a Humanidade.

Entre Portugal e Moçambique, com efeito, os laços de solidariedade que exprimimos na mesma língua não são meras palavras de circunstância. São laços que se consubstanciam num permanente reforço da cooperação bilateral a todos os níveis - político, institucional, económico e cultural - e que se reflectem, quer na multiplicidade dos contactos entre os mais diversos sectores das nossas sociedades, como na frequência das visitas entre autoridades e governantes de ambos os nossos países.

Para além das importantes visitas levadas a cabo a Moçambique por Suas Excelências o Presidente da Assembleia da República e pelo Primeiro Ministro de Portugal, respectivamente em Abril e Outubro do ano passado, não posso aqui deixar de evocar a Visita de Estado que efectuei em Maio de 1997 e da qual guardo as mais comovidas recordações.

Em nome de minha Mulher e em meu próprio nome, quero uma vez mais testemunhar à Excelentíssima Senhora D. Marcelina Chissano e a Vossa Excelência o nosso profundo apreço pela hospitalidade e calor humano com que as Autoridades e o Povo Moçambicano nos receberam, assim como pela forma cativante como Vossas Excelências nos cumularam de atenções.
 
 
Senhor Presidente,
 
O empenho de Portugal no progresso e desenvolvimento de Moçambique está patente no esforço que levamos a cabo no sentido de incrementar a nossa cooperação bilateral. Cooperação que, privilegiando o apoio técnico e a formação humana, e norteando-se pelo reforço das capacidades institucionais e pela promoção dos valores da democracia e do Estado de Direito, continuará sempre a pautar-se pelo mais estrito respeito pela identidade histórica e cultural de cada um dos nossos países.

Congratulamo-nos com o facto de que a nossa cooperação bilateral esteja a incidir num cada vez mais alargado campo de actuação, sendo porventura de destacar, na vertente cultural e linguística, a criação de Centros de Língua Portuguesa em Universidades Moçambicanas, o arranque de numerosas escolas e o alargamento da cobertura das emissões de rádio e de televisão.

Igualmente nos congratulamos com o crescimento que se verifica numa outra área de particular relevância para o desenvolvimento sustentado de Moçambique: a da cooperação empresarial, sobretudo a do sector privado. Como já uma vez tive a ocasião de referir, importará aqui, tanto a nível oficial, como a nível privado, procurar sempre observar os mais rigorosos padrões éticos de comportamento, nomeadamente nas relações laborais, privilegiando a formação profissional dos moçambicanos como prioridade associada a qualquer investimento ou acção de cooperação.

O facto de Portugal ser hoje em dia um dos principais investidores externos em Moçambique, constitui uma cabal demonstração da confiança interiorizada pela sociedade portuguesa na estabilidade política e social do país, assim como na solidez das suas instituições livremente eleitas. Isso, acima de tudo, é mérito dos próprios moçambicanos! E se é verdade que a nossa cooperação bilateral pode efectivamente ser considerada como modelar, verdade é também que Moçambique, ele próprio, constitui um exemplo cada vez mais reconhecido pelo conjunto da Comunidade Internacional!

Exemplo, na determinação com que todos os moçambicanos souberam trilhar e prosseguir os caminhos da paz e da reconciliação nacional!

Exemplo, na sua colectiva procura dos indispensáveis consensos para a estabilidade política e para a consolidação da democracia pluripartidária!

Exemplo, no persistente esforço dedicado ao desenvolvimento económico e à melhoria das condições de vida das populações!
 
 
Senhor Presidente,
 
A eleição de Moçambique para a "Iniciativa de Alívio de Dívida" corrobora a confiança que a Comunidade Internacional deposita no desempenho económico do país.

Idêntica confiança, mas agora relativamente ao edifício institucional do país, reflecte-se no apoio concedido pela Comunidade Internacional, designadamente pela União Europeia, à preparação das próximas eleições gerais. Apoio tanto mais merecido quanto é certo que - hoje - com o amadurecimento da sua vivência democrática - tal como ontem - com o sucesso do processo de paz, Moçambique se tornou efectivamente num exemplo que o Mundo muito valoriza, e que a África em particular, só terá a ganhar em ter sempre presente.

Com efeito, tendo corajosamente interiorizado as lições amargas de um passado recente em que a luta fratricida se sobrepunha ao entendimento e ao diálogo, Moçambique acumulou um inestimável capital de experiência e de sabedoria. Daí o respeito com que é hoje encarado a nível internacional, e o crescente papel a que é chamado a desempenhar, designadamente no contexto regional em que se insere.
 
 
Senhor Presidente,
 
Moçambique e Portugal partilham a mesma convicção de que a paz é um bem insubstituível, sem o qual o desenvolvimento e o bem estar económico nunca passarão de uma miragem eternamente adiada. Os conflitos de carácter étnico e as tragédias humanitárias que ensombram o continente africano e, agora, também o europeu, aí estão para o comprovar. Igualmente partilhamos a convicção de que a via do diálogo deverá ser sempre o caminho a privilegiar na procura da solução dos conflitos.

Gostaria aqui de mencionar a forma eficaz e empenhada como, no contexto da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, os nossos dois países contribuíram para a superação pacífica da crise em que se debateu a Guiné-Bissau e para a qual confiamos ter-se encontrado a definitiva resolução através do acordo que conduziu à formação do Governo de Unidade Nacional.

Ao conjugar os seus esforços no âmbito das diligências levadas a cabo no contexto regional da África Ocidental, a CPLP demonstrou não prosseguir quaisquer propósitos de protagonismo, norteando-se tão somente pelos princípios de solidariedade e cooperação consagrados no seu Acto Constitutivo.

Apraz-me igualmente salientar os resultados alcançados pela nossa Comunidade aquando da Cimeira reunida o ano passado em Cabo Verde, a qual deu um importante contributo para o reforço da projecção da CPLP na cena internacional, assim como nos diversos agrupamentos regionais em que se inserem cada um dos nossos países.

Por sua vez, a 3ª Cimeira da CPLP, a realizar-se no próximo ano em Maputo, irá seguramente conferir um adicional impulso à vitalidade e coesão da nossa Comunidade. Uma Comunidade que pretendemos cada vez mais activa e dinâmica no sentido do reforço da cooperação e solidariedade entre os povos e países que a integram, não num prisma de evocação do passado, mas sim com os olhos postos no futuro.

Mas não posso, neste momento, deixar de manifestar a preocupação que nos suscita a situação que se vive em Angola, preocupação tanto mais intensa quanto é certo que se avolumam os sinais que apontam para a sua envolvência por uma vasta e perigosa crise regional.

O drama de Angola não se compadece com tergiversações. Nem o sofrimento das suas populações inocentes merece o esquecimento da Comunidade Internacional que, de resto, já tanto investiu na procura da resolução do conflito angolano.

Pelo contrário; temos todos e cada um de nós o estrito dever de demonstrar a nossa solidariedade para com o povo angolano, não permitindo que prevaleça o sistemático desrespeito das Resoluções do Conselho de Segurança e a permanente violação dos acordos livremente aceites. Devemos simultaneamente assegurar que não se desperdice nenhuma tentativa nem nenhuma oportunidade para que seja alcançada a paz e a definitiva reconciliação da família angolana.

Conforta-me a ideia de que os nossos dois países, nesta, como em tantas outras matérias, fazem uma idêntica leitura da situação.

Como idêntica é a leitura que fazemos relativamente à questão de Timor-Leste, cujo povo, tenaz e heroicamente, luta há mais de vinte anos pela sua liberdade.

Mau grado alguns sinais positivos de mudança na Indonésia, o Povo de Timor-Leste continua a ser alvo de sangrentas perseguições, como mais uma vez ficou demonstrado com os bárbaros massacres perpetrados em Díli e Liquiçá.

A deliberada onda de violência que avassala Timor-Leste tem como objectivo, não apenas instalar um clima de terror e de intimidação naquele território, como também prejudicar os esforços que estão a ser envidados para se concluir um acordo no quadro das conversações tripartidas que decorrem sob a égide do Secretário-Geral das Nações Unidas.

Quero daqui lançar um veemente apelo a todos os que, como Vossa Excelência, sempre demonstraram o seu profundo apego à causa de Timor-Leste e compartilham dos valores da Liberdade e do Direito, para que, com redobrado ânimo e determinação, empenhem o melhor dos seus esforços e das suas capacidades no apoio e solidariedade para com o povo mártir de Timor-Leste.
 
 
Senhor Presidente,
 
O 25 de Abril em Portugal e a independência de Moçambique - independência para a qual Vossa Excelência tão persistentemente lutou - são acontecimentos históricos que, para além de tudo mais, permitiram que ambos os nossos países encontrassem novas formas de inserção nos espaços regionais em que, naturalmente, se integram.

Através da sua adesão à União Europeia - para cujo processo de construção e aprofundamento tem activamente contribuído - Portugal reencontrou a Europa a que se sempre pertenceu, tendo nos últimos anos beneficiado de uma acelerada dinâmica de progresso económico e social.

Moçambique, por sua vez, usufrui no âmbito do SADC - de que Vossa Excelência é Vice-Presidente - de um vasto e importante espaço de cooperação regional.

Por outro lado, ciente de que os conflitos em África são o trágico resultado de profundas carências políticas, económicas e sociais, Portugal protagonizou a iniciativa de uma Cimeira entre a União Europeia e a África, cimeira essa que se irá concretizar no primeiro semestre do próximo ano, por ocasião da Presidência Portuguesa.

Desde a primeira hora, Moçambique foi receptivo à ideia da realização daquele importante evento, encarando-o, tal como nós o fazemos, como uma oportunidade privilegiada para se estabelecer um diálogo político ao mais alto nível em matérias de interesse comum, e para se lançarem as bases de uma parceria mais efectiva e consistente entre os dois continentes.
 
 
Senhor Presidente,
 
Quero terminar esta intervenção, reiterando as boas vindas a Vossa Excelência, saudações que, naturalmente, são extensivas à ilustre comitiva que o acompanha.

Comitiva que, de resto, muito nos gratifica por integrar tão relevantes personalidades dos mais diversos sectores da sociedade moçambicana: governantes, parlamentares, escritores, artistas, empresários, técnicos, mulheres e homens da política, da cultura, da ciência, do jornalismo e do desporto. A todos dirijo as nossas mais amigas e sinceras saudações de boas vindas, e a todos peço que se sintam no Portugal de hoje como em vossa própria casa.

Permita-me ainda - Senhor Presidente - que aproveite esta oportunidade para daqui lançar um repto e um apelo a todos os presentes - quer moçambicanos, como portugueses - para que nunca se contentem com o que já está feito, e para que, pelo contrário, pugnem sempre no sentido de se ir mais longe no fortalecimento dos laços de cooperação e de fraternidade entre os nossos dois povos e países.

Peço a todos que me acompanhem num brinde pelas felicidades pessoais de Sua Excelência o Presidente da República de Moçambique e da Excelentíssima Senhora D. Marcelina Chissano, pela prosperidade de Moçambique e pela perene e fraterna amizade entre os nossos dois povos.