Sessão Solene no Parlamento Suiço

Berna (Visita de Estado à Confederação Suiça)
08 de Setembro de 1999


Quero, em primeiro lugar, agradecer as tão amáveis palavras de boas-vindas que, em nome do Povo suíço, Vossa Excelência me dirigiu e que muito me penhoram.
Gostaria igualmente de expressar os meus agradecimentos pela forma compreensiva e aberta com que as autoridades helvéticas imediatamente aceitaram a alteração do programa da visita, motivada pelos trágicos acontecimentos que nos últimos dias marcaram o processo de transição de Timor Leste, território com o qual Portugal, por razões históricas sobejamente conhecidas, mantém os mais estreitos laços.
É para mim um prazer e uma honra estar hoje aqui, acompanhado por uma expressiva comitiva, para efectuar uma Visita de Estado que se reveste, para suíços e portugueses, de um importante significado.
A Suíça e Portugal têm mantido, desde há muito, um excelente quadro de relações que assenta num diálogo amistoso e aberto e num entendimento comum sobre um vasto conjunto de matérias de interesse mútuo.
A este bom relacionamento político corresponde um nível igualmente importante de relações económicas, cujas raízes se encontram na tão útil parceria que os nossos dois países mantiveram no quadro da EFTA, organização a que Portugal pertenceu até à sua adesão às então chamadas Comunidades Europeias e onde ensaiou a progressiva abertura da sua economia. Desejamos, naturalmente, que estas relações se possam aprofundar cada vez mais, para benefício recíproco.
Acresce que na Suíça vive e trabalha uma significativa comunidade portuguesa, que se integrou, com naturalidade, na sociedade que tão bem a acolheu. Estes compatriotas são, naturalmente, um muito relevante elo de ligação entre os nossos dois países.
Na memória dos portugueses permanece também o reconhecimento pela forma solidária como a Suíça acolheu os nossos compatriotas que - como tantos europeus em diferentes períodos da história - aqui buscaram refúgio e as condições que o regime deposto em 1974 lhes negava, para desenvolverem, em liberdade, o seu trabalho e os seus estudos. Alguns desses portugueses acompanham-me nesta visita e são hoje destacadas figuras da nossa vida pública, política e académica. Aqui lhes presto também a minha homenagem.
Portugueses e suíços têm, em suma, muitas e boas razões para ter relações estreitas e amigas. Estou certo que esta visita servirá para as fortalecer.
Senhora Presidente,
Senhora membro do Conselho Federal.
Senhores membros do Conselho Federal.
Comemorámos este ano o 25º aniversário da revolução de Abril, que reinstaurou a democracia em Portugal. No último quartel deste século, a consolidação da democracia política, a modernização da economia, a abertura da sociedade, transformaram profundamente Portugal.
Somos hoje um país moderno, orgulhoso do seu passado, mas virado para o futuro, fiel às suas raízes, mas aberto ao exterior, ciente dos desafios que ainda o esperam, mas confiante na sua capacidade para os vencer. Essa confiança, para além das vicissitudes e dificuldades do caminho, é, em si mesma, um sinal da nossa mudança.
Os portugueses vivem hoje numa sociedade aberta e disfrutam de um maior bem estar material, de que gozam em plena liberdade e segurança. A nossa economia desenvolveu-se e internacionalizou-se. Refiro, a título de exemplo, que em 1998, pela primeira vez na nossa história, o investimento português no exterior superou o investimento estrangeiro em Portugal.
A sociedade portuguesa sofreu uma mudança de mentalidade muito significativa que a tornou mais apta para enfrentar os desafios do nosso tempo. Os portugueses são hoje mais exigentes, mais informados, mais interessados em intervir nas escolhas que hão-de moldar o seu futuro colectivo.
A cultura portuguesa floresceu, na literatura, nas artes plásticas, na arquitectura, no cinema e na música e projectou-se internacionalmente.
A nossa voz é respeitada na cena internacional. Somos um país empenhado em contribuir, com os nossos parceiros, para a procura de soluções estáveis e duradouras para os problemas com que se defrontam muitos países e regiões.
Recuperada a democracia, assumimos plenamente a vocação europeia do nosso país. Mau grado as disparidades entre o nosso nível de desenvolvimento e o de muitos dos nossos parceiros, integrámo-nos com naturalidade na Comunidade Europeia, desempenhando um papel activo no seu processo de aprofundamento. O facto de termos conseguido, por mérito próprio, participar na primeira fase da União Económica e Monetária, atesta bem o alcance do caminho já percorrido.
No âmbito da União Europeia, procuramos hoje estender a outros a solidariedade de que beneficiámos. Apoiamos sem hesitações o alargamento da União, tarefa de alcance histórico que, estamos convictos, constituirá um contributo decisivo para o progresso e a estabilidade do nosso Continente.
Findas as guerras coloniais, passámos a participar mais activamente nas tarefas de defesa colectiva da Europa, no âmbito das alianças em que nos inserimos.Quando a OTAN foi chamada a intervir militarmente nos conflitos provocados pela dissolução da Jugoslávia, não regateámos o nosso contributo. Na Bósnia e, mais recentemente, no Kosovo, tropas portuguesas integram as forças da paz da OTAN, prestando um contributo muito válido para a desejada pacificação e estabilidade dos Balcãs.
Sentimos uma especial responsabilidade pelos países irmãos de língua portuguesa, hoje agrupados na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Temos por isso, empreendido todos os esforços no sentido de contribuir para o seu progresso, o seu desenvolvimento e a sua estabilidade. O projecto solidário corporizado pela Comunidade Lusófona tem, de resto, encontrado um eco assinalável na sociedade civil, cujas iniciativas e propostas vêm concorrendo para o dinamizar.
Senhora Presidente,
Senhora membro do Conselho Federal,
Senhores membros do Conselho Federal,
O destino de Timor Leste e a sorte do seu martirizado povo, estão neste momento na mente e no coração de todos os portugueses, constituindo para nós motivo de profunda preocupação.
Os factos falam por si e dispensam grandes comentários :
- No dia 30 de Agosto de 1999 o povo de Timor Leste, numa inequívoca demonstração de coragem, determinação e sentido democrático, afluiu massivamente às urnas, escolhendo soberanamente o seu futuro ;
- A consulta popular foi considerada justa e livre pelas Nações Unidas, bem como pela própria Indonésia ;
- Apurados os resultados, concluiu-se que 78,5 % dos timorenses desejavam a independência do seu território, anúncio que foi publicamente efectuado pelo próprio Secretário Geral das Nações Unidas ;
- Na sequência deste anúncio e apesar das garantias de segurança fornecidas pelo Governo indonésio, num total desrespeito pela vontade democraticamente expressa, forças paramilitares lançaram uma campanha orquestrada de terror e destruição em todo Timor Leste, assassinando e deslocando pela força populações indefesas, saqueando e incendeando casas, incluindo a do Prémio Nobel da Paz, D. Ximenes Belo, obrigando os jornalistas estrangeiros a abandonarem o território, sitiando a sede da Missão das Nações Unidas e intimidando os seus funcionários, atacando igrejas e instituições religiosas e assaltando a delegação do Comité Internacional da Cruz Vermelha.
Senhora Presidente, Senhores membros do Conselho Federal, será necessário dizer mais para expressar a medida do nosso repúdio e justificar o bem fundado dos veementes apelos e empenhadas diligências que, aos mais diversos níveis e nas mais variadas instâncias, Portugal tem vindo a desenvolver nos últimos dias, para que se ponha rapidamente cobro à enormidade de uma tal situação ?
Estou certo que a Suíça, país de profundas tradições democráticas e de defesa da Paz e dos Direitos do Homem, saberá bem avaliar a dimensão da enorme tragédia humana que se abate neste momento sobre o corajoso e determinado povo irmão de Timor Leste, agindo em conformidade.
Portugal, pelo seu lado, lutando contra todas as adversidades, tudo continuará a fazer para que a vontade democraticamente expressa pelos timorenses, para nós sagrada, triunfe e se venha a tornar uma realidade, consubstanciando-se no nascimento do novo Estado de Timor Lorosae.
Madame la Présidente,
Madame membre du Conseil Fédéral,
Messieurs les membres du Conseil Fédéral
Ces dernières années, lŽEurope et le monde ont subi des nombreuses et décisives transformations, dont la portée est aujourdŽhui encore difficile à évaluer avec rigueur.
Je crois, sincèrement, que les transformations se sont produites dans un sens positif, malgré la turbulence causée dans certaines parties de notre continent.
La conscience sŽest généralisée quŽil y a un ensemble de principes et de valeurs, une sorte de grammaire de la démocratie, dont lŽapplication constante et effective constitue une condition essentielle pour lŽobtention de la paix, du progrés et du développement, que nous souhaitons pour les Peuples.
Je crois que cŽest dans ce sens – et je lŽai dit à plusieurs reprises – que lŽEurope devra assumer les responsabilités accrûes en matière de politique mondiale, dans le respect du principe de lŽégalité entre les peuples et de leur souveraineté.
Les suisses et les portugais ont, je nŽen doute pas, un rôle à jouer dans la construction conjointe dŽun monde plus juste, plus équilibré et plus développé, indépendamment des différentes formes dŽinsertion politique et économique dans lŽEurope quŽils ont choisie ou pourront choisir.
Nous nous sentons particulièrement reconnaissants à lŽégard de la Confédération Suisse pour lŽaide quŽelle à prêtée aux pays européens, qui, au prix de maints sacrifices, cherchent à effectuer une transition difficille vers des économies ouvertes et modernes.
Nous nous réjouissons de la participation de la Suisse, ayant statut dŽobservateur, au Pacte de Stabilité, ainsi que des importantes ressources financières quŽelle à disponibilisées aux fins de reconstruction de la région balkanique.
Il y a également lieu de louer le généreux accueil qui a ici été dispensé aux milliers de réfugiés de la Bosnie et du Kosovo.
Nous apprécions la participation suisse au Partenariat pour la Paix, ainsi que as présence si active au sein de lŽOSCE, dont elle a détenu la présidence au moment historique du Sommet de Lisbonne.
Je ne peux non plus manquer de vous dire combien nous nous réjouissons du rapprochement progressif entre la Suisse et lŽUnion Européenne, avec laquelle nous aurons tous deux à gagner parce que nous partageons les mêmes valeurs, ainsi que la même vision du monde.
Enfin, je profiterai de cette occasion pour souligner le legs de nombreuses années dŽininterrompu vécu républicain et démocratique de la Confédération Suisse. Le monde qui sŽest implanté ici est aujourdŽhui respecté par le monde un exemple bien réussi de démocratie participée, décéntralisée et effective.
Senhora Presidente,
Ao longo desta visita, teremos oportunidade de conhecer melhor o vosso país e de melhor nos dar a conhecer. Estou certo de que dela sairão reforçados os laços de amizade que nos unem.
A Suíça pode contar com Portugal. Estivemos sempre disponíveis e continuaremos a estar para prosseguir um diálogo sério e rigoroso sobre todas as matérias de interesse comum.
Quero, através de Vossa Excelência, reiterar ao Povo suíço o meu muito sincero agradecimento pelo tão caloroso acolhimento que nos tem dispensado, a mim, a minha mulher e à comitiva que me acompanha.
Senhora Presidente,
Senhores membros do Conselho Federal
Estamos, suíços e portugueses, activamente empenhados na construção de uma Europa que queremos mais próspera, mais coesa, mais solidária e que desejamos seja também, cada vez mais, um espaço de paz.
São valores e anseios que os nossos povos compartilham, para além das distintas formas de participação política e económica na Europa que cada um legitimamente escolheu.
A grandeza da Europa reside na diversidade de que é feita. A sua vitalidade não pode reconduzir-se a um coro de vozes concordantes, nem se esgota no projecto político e económico da União Europeia, em que Portugal participa activamente.
Queremos uma Europa capaz de fazer face à exclusão social e à marginalização; queremos uma Europa dos cidadãos e não apenas dos consumidores; queremos uma Europa que faça da diversidade cultural e humana uma riqueza; queremos uma Europa aberta ao mundo e com respostas para quantos anseiam por segurança e por progresso; uma Europa cujas fronteiras sejam as da democracia e da liberdade; em suma, queremos uma Europa de paz, que gere e promova a estabilidade e o desenvolvimento e que seja capaz de agir face aos grandes desafios que o presente nos convoca.
Nesta Europa que desejamos e somos seguramente capazes de construir, a Suíça e Portugal têm, não o duvido, muito para dar e muito para receber.
No plano bilateral, mantemos hoje excelentes relações de amizade, sólidas e confiantes, tanto a nível político como económico.
Com certeza que é sempre possível fazermos mais e melhor. É também este estímulo e esta vontade que aqui quero deixar.
Senhora Presidente,
Senhores membros do Conselho Federal
Tenho a lamentar que esta visita, que desejava fosse uma ocasião festiva para os nossos dois países, decorra num momento em que toda a sociedade portuguesa está absorvida pela tragédia que se abateu sobre o povo de Timor Leste, à qual já tive ocasião de me referir públicamente esta tarde.
Nos encontros que hoje mantivemos, as autoridades suiças tiveram a bondade de me manifestarem a sua solidariedade para com o povo de Timor e a sua compreensão pelos motivos que me levaram a encurtar esta viagem. Queria por isso exprimir-lhes aqui o meu reconhecimento.
Esta é mais uma prova do bom entendimento e da amizade existentes entre os nossos dois países, que esta viagem serviu, sem dúvida, para reforçar.
Estou certo de que os nossos dois países continuarão a encontrar, no futuro, inúmeras ocasiões para aprofundaram os laços de cooperação e entendimento mútuo que os unem. É com esta certeza que aqui viémos e é com esta certeza que daqui partimos.
Peço a todos que me acompanhem num brinde pelas felicidades pessoais de Vossa Excelência, dos Senhores membros do Conselho Federal, à prosperidade crescente do Povo suíço, e ao fortalecimento da cooperação entre a Suíça e Portugal.