Jantar Oferecido a Personalidades do Algarve (Visita ao Distrito de Faro)

Faro
12 de Junho de 1996


Estamos a viver mais um ciclo de Comemorações com significado eminentemente nacional, e o facto de o Presidente da República ter pretendido consubstanciá-lo numa série de iniciativas circunscritas ao Algarve não pode traduzir outro sentimento que não seja o de ele acreditar firmemente que o País sabe reconhecer-se e encontrar-se a si próprio, na plenitude das suas dimensões, mesmo quando, por uma ou outra razão, os olhares se deslocam ou a atenção se concentra numa qualquer parcela do território nacional.
Se hoje, neste dias, é ao Algarve que dedicarei uma particular atenção, não deixo, naturalmente, de o fazer considerando, que, quaisquer que sejam os problemas que importe ter em atenção, é ao todo nacional que eles dizem respeito, unindo, num sentimento de solidariedade e coesão, o todo nacional.

É esse o espírito das Comemorações do Dia de Portugal, espírito que gostaria que estivesse sempre presente quando, em iniciativas como esta, temos de perspectivar o futuro do nosso destino colectivo.

Tenho dedicado e dedicarei nos próximos dias, a maior parte do meu tempo a estudar, apoiar e incentivar soluções encontradas e importantes realizações, sejam elas no domínio da investigação científica, da preservação do ambiente, no combate à droga, onde tanto há a fazer, na preservação da nossa memória colectiva, parte essencial da nossa identidade, ou na reconversão de sectores produtivos, como o das pescas, onde modernização e solidariedade têm de andar sempre a par, ou do turismo, que conhecerá sem dúvida uma importante transformação nos próximos anos.

Mas não esqueço, naturalmente, que o Algarve, como a sociedade portuguesa no seu conjunto, vive também sob uma série de constrangimentos cuja dureza e complexidade o Presidente da República não pode ignorar.

Não será esta a altura mais adequada para inventariar sistemática e exaustivamente esses constrangimentos. Mas permitam-me que aproveite esta oportunidade para levantar uma ou outra interrogação, sobre questões, algumas delas de dimensão até nacional, que, creio, devem merecer a atenção de todos nós.

O dia-a-dia dos Portugueses ressente-se, antes de mais, como é sabido, de processos de reorganização da economia que transcendem de longe as fronteiras nacionais e mesmo europeias. Bastará pensar em duas actividades muito importantes da economia algarvia: as pescas e a agricultura, para se perceber todo o alcance desses condicionalismos.

Como ignorar que esses condicionalismos externos têm imposto grandes dificuldades às empresas, que provocam uma explosão urbana por vezes sem sentido, que têm desincentivado o investimento, que são factor de desemprego dificilmente reabsorvível pelo mercado de trabalho?

Sem podermos alimentar grandes ilusões sobre as possibilidades de responder com autonomia às exigências de uma economia globalizada, teremos de nos interrogar, com alguma pertinência, sobre a legitimidade de descurar a protecção do emprego em nome de um certo conceito de modernização e eficácia. Não haverá o risco de, por esta via, sermos conduzidos a limiares de desigualdade social tão acentuados que, afinal, acabem por comprometer, a prazo, o próprio crescimento económico, não sem, pelo caminho, gerarem desequilíbrios e conflitos para que se não podem encontrar saídas razoáveis.

Por outro lado, não posso deixar de chamar a atenção para níveis de sofrimento fruto de causas sociais a que não poderemos permanecer insensíveis, que, afectam tantos portugueses, remetendo alguns dos mais jovens para percursos de risco que terminam quantas vezes na dolorosa espiral da toxicodependência.

São seguramente estruturais as principais causas da pobreza, da solidão, do desemprego, do consumo da droga — mas por que razão não haveremos de as enfrentar com acções planeadas partindo do conhecimento que sobre elas já vamos tendo?

Tenho a consciência de que é necessário ir mais depressa, que a sociedade portuguesa necessita de uma resposta mais acutilante e eficaz a situações de exclusão social. Sinto que é necessário fazer mais em matéria de solidariedade.

Tentarei aproveitar esta permanência em terras algarvias, onde vou multiplicar contactos com as populações, com as suas obras, os seus anseios e com as suas dificuldades, para demonstrar que é possível dar um conteúdo mais concreto aos desígnios dasolidariedade.

Percebe-se que o combate contra as situações sociais mais complicadas tem de começar pelo diagnóstico rigoroso e pormenorizado dos factores de fragilização que ameaçam as populações de uma região.

Ora, parece-me desejável que as instituições mais vocacionadas para a investigação, nomeadamente as Universidades e outras escolas do Ensino Superior, sejam mais mobilizadas e apoiadas para elaborar inventários criteriosos das situações e modelos explicativos sobre os problemas que mais afectam a comunidade a que estão ligadas.

Não será verdade que há muitos recursos humanos que a nível local estão frequentemente subutilizados e têm na maioria dos casos um maior conhecimento dos problemas de uma determinada parcela do País?

Urge estimular, um pouco por todo o lado, um princípio de cooperação interinstitucional permanente que mude estruturas e filosofias de administração e seja capaz de envolver em autênticas redes de serviço público as empresas e outras entidades privadas.

Portugal não pode adiar por mais tempo uma modernização efectiva dos seus procedimentos administrativos. Sem isso continuaremos a desperdiçar recursos humanos e materiais tantas vezes por falta de colaboração e cooperação interinstitucional.

Ao longo destes dias, procurarei encontrar-me com o maior número de técnicos, personalidades, cientistas e criadores do Algarve, a todos quero dar uma palavra de incentivo pelo trabalho que desenvolvem em prol de Portugal. A todos quero exprimir a necessidade de conjugar esforços em torno do reforço do princípio da coesão e da solidariedade nacionais.

Tenho apelado com insistência aos valores da solidariedade nacional. Farei da defesa desse princípio uma das principais linhas de orientação do meu mandato.

Sei que posso contar com todos os algarvios para reforçar esse sentimento de comunidade nacional e de partilha colectiva de um destino comum.