Reunião com as Autoridades Responsáveis pelo Combate ao Narcotráfico (Visita ao Distrito de Faro)

Ancão — Loulé
13 de Junho de 1996


E´ impossível voltar as costas à realidade. O problema da droga é hoje um flagelo gravíssimo da sociedade portuguesa. Afecta todo o País — as próprias comunidades rurais estão já afectadas por este problema — e todos os grupos sociais sem excepção.
É impossível olhar para a situação grave que hoje se vive sem afirmar com clareza: é preciso fazer mais, é necessário avançar mais depressa.

Esta é a primeira mensagem que aqui quero deixar.

O problema das drogas é, todos o sabemos, um problema transnacional: transnacional porque a droga atravessa as fronteiras e afecta gravemente a vida de indivíduos e famílias em todo o mundo, transnacional porque a abordagem eficaz para enfrentá-lo é a da comunidade: comunidade local e nacional, seguramente, mas também a comunidade internacional.

A droga é hoje um fenómeno de grande complexidade, passível de ser abordado sob múltiplas perspectivas. Hoje quero dar particular destaque à política de combate ao narcotráfico. É dela que depende a possibilidade de destruição das grandes redes internacionais de traficantes. É dela, em última análise, que depende a possibilidade de diminuição de um flagelo que a cada ano que passa apresenta estatísticas mais alarmantes de volume de droga traficado e consumida.

O facto de o fenómeno «droga» ser agora reconhecido como global exige uma utilização racional dos meios envolvidos. Para além do contributo que a aplicação dos instrumentos comunitários pode dar aos esforços feitos pela União Europeia contra o tráfico de droga, é indubitável que os aspectos mais directamente operacionais incumbem às polícias, às alfândegas e às agências especializadas, nomeadamente em matéria de informações e de segurança e que é delas que os cidadãos esperam que combatam as poderosas organizações criminosas que controlam e exploram o tráfico lucrativo de drogas ilícitas.

Aos pais que vêem os seus filhos ameaçados por uma comercialização avulsa à porta das próprias escolas, ou viram já a vida de um familiar seu destruída pela toxicodependência, a diversidade das causas sociais ou a complexidade das ramificações internacionais do problema não serve de amparo à situação angustiante de viver numa sociedade permanentemente ameaçada e quase refém de uma escalada de tráfico e consumo.

Em Portugal temos razões sérias para estarmos preocupados: o número de consumidores de drogas ilícitas estará, ainda, em crescimento. O número de traficantes detectados pelas forças policiais e o número de reclusos condenados por crimes de tráfico tem vindo também a aumentar.

Quer dizer, provavelmente, que todos as iniciativas, e foram muitas, planeadas pelos Governos e executadas por organizações governamentais e não governamentais devem ser, ainda mais, consistentes, articuladas e ter como base uma estratégia consensual.

Por isso, o segundo apelo que aqui quero deixar vai no sentido da necessidade de criação de condições de reforço das políticas e actos legislativos que permitam um esforço de articulação e de harmonização. Articulação de pessoas, instituições públicas e privadas, cujas actividades devem ser conhecidas, coordenadas, apoiadas e enquadradas. Harmonização para que os analistas e os decisores políticos disponham de boa informação.

Uma palavra, também, para a investigação nesta área. A droga é um problema que atravessa longitudinalmente toda a sociedade e também as respostas terapêuticas e a investigação. A investigação clínica é, seguramente, determinante mas também a investigação em ciências sociais. Tentar encontrar a possível nacionalidade social para este fenómeno deve ser missão dos nossos cientistas sociais, de forma a investirmos, cada vez mais, na causalidade social do problema da droga e não, apenas, nas suas consequências, tantas vezes irremediáveis.

Mas, principalmente, o que a situação exige e aconselha é a necessidade de garantir um reforço urgente dos meios afectos ao combate ao narcotráfico — refiro-me à necessidade de reforço dos meios de todas as forças envolvidas neste combate, sejam elas de natureza civil ou militar — e, a par desse esforço, é urgente intensificar os instrumentos de cooperação nacional entre forças e internacional entre Estados. Também aqui creio sinceramente que é necessário fazer mais e mais depressa. Os Portugueses exigem do Estado uma resposta mais determinada quecontrole de maneira mais eficaz a fronteira terrestre e marítima.

Mas temos razões, também, para ter confiança. Confiança na determinação dos agentes, os mais diversos, no combate ao tráfico de estupefacientes e no combate às organizações criminosas nacionais ou transnacionais que com o produto destas actividades criminosas se proponham corromper as estruturas do Estado, as suas legítimas actividades comerciais e financeiras. Com os meios de que dispõem têm feito um trabalho assinalável a que quero hoje prestar homenagem.

E, finalmente, uma palavra para o mais importante de tudo, que deve ser preservado destas terríveis agressões de terceiros: as crianças e os adolescentes que têm direito a um saudável e livre desenvolvimento protegidos pelo direito penal e pelas instituições de todo o Estado.

A droga não pode permanecer como uma ameaça crescente ao desenvolvimento das novas gerações. É necessário dar uma resposta veemente ao narcotráfico.