Sessão Solene Comemorativa do 25º Aniversário da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra

Coimbra
26 de Novembro de 1997


Este é certamente um momento singular da vida de uma escola, em que se celebra um quarto de século de existência. Honrado pelo convite para presidir a esta cerimónia, quero felicitar a Faculdade de Ciências e Tecnologia na pessoa do seu Presidente do Conselho Directivo, e a Universidade de Coimbra, na pessoa do seu Reitor. Mas também de todos os professores, estudantes e funcionários que fazem a Faculdade todos os dias.
Sei, e sinto também, o vosso contentamento pela concretização de projectos mobilizadores, pelos resultados de um esforço persistente. Saúdo todos os contributos individuais e institucionais que tornaram possível a construção desta grande escola e associo-me à homenagem prestada aos seus colaboradores. Estou igualmente ciente do entusiasmo com que todos encaram as oportunidades científicas e pedagógicas que a Faculdade de Ciências e Tecnologia representa.
Articulando a herança da organização pombalina dos estudos universitários e a reforma republicana do ensino das ciências, com os conceitos modernos do ensino e investigação, a Faculdade de Ciências e Tecnologia ganhou rapidamente um lugar entre as mais prestigiadas instituições do domínio científico e tecnológico em Portugal.
Quero congratular-me com esse facto, amplamente reconhecido. Não deixarei nunca de aplaudir e incentivar as iniciativas e as organizações que contribuem para integrar o nosso país no que tenho chamado o grande empreendimento da ciência e da tecnologia.
Trata-se aliás de um empreendimento nacional, de uma exigência tanto maior quanto avolumadas são as carências e atrasos acumulados. Não concebemos o futuro, com uma presença portuguesa de parte inteira, sem que se dominem as linguagens comuns, especializadas, do conhecimento científico.
Algumas das dificuldades a vencer radicam na própria configuração dos quadros culturais dominantes. Sabe-se que são débeis os níveis de cultura científica difundidos entre nós. A própria atitude experimental, tão importante para o despertar do gosto pela ciência, pelas tecnologias e, em última análise, pela inovação, não tem tido a necessária expressão no sistema de ensino, sendo além disso pouco estimulada pelos meios de comunicação com maior impacto.
Inverter esta situação é sem dúvida um dos grandes desígnios nacionais nesta viragem para o terceiro milénio. Dar mais expressão à componente científica e tecnológica na cultura portuguesa constitui uma tarefa essencial do nosso presente. A mobilização de conhecimentos avançados nos vários domínios do saber deve fazer parte integrante do esforço colectivo para atenuar as nossas vulnerabilidades e dependências.
As instituições de ensino e investigação enfrentam aqui desafios irrecusáveis. Sei que a Faculdade de Ciências e Tecnologia tem estado atenta a esta questão e dado um relevante contributo para um maior entrosamento entre a ciência e a sociedade, para que uma cultura da ciência obtenha uma difusão alargada.
Sei ainda que a Faculdade tem tido um empenhamento igualmente intenso no entrosamento entre ciência e economia, entre as actividades de investigação e o mundo empresarial.
Também neste campo o caminho não tem sido fácil, pois há que remover obstáculos múltiplos, feitos de distância e incompreensão. Acredito que uma mais forte e diversificada ligação entre as empresas e a investigação pode traduzir-se em ganhos para ambas as partes. O estímulo constituído pelos problemas que o mundo empresarial tem a colocar ao sistema de ciência e tecnologia é sem dúvida enriquecedor. O desenvolvimento da base tecnológica e a mudança organizacional das empresas podem receber um impulso decisivo da investigação científica. Uma aproximação criativa e realista entre os dois mundos está em curso e importa aprofundá-la.
Quero por isso sublinhar a importância do esforço realizado na Faculdade de Ciências e Tecnologia a tal respeito.
A expansão que tem caracterizado a evolução do ensino superior nas últimas décadas em Portuga, sendo um processo recente, não pode considerar-se um processo encerrado. A ampliação da oferta do ensino superior é uma condição necessária para a democratização do acesso, que está ainda distante, no nosso País, dos patamares desejáveis. O esforço no sentido de uma maior abertura social e de uma redução das desigualdades regionais no ensino superior, bem como de uma presença mais significativa das mulheres, deve continuar.
O acesso ao ensino superior condiciona a qualificação global duma sociedade e julgo não existirem dúvidas de que Portugal tem de continuar a melhorar os índices de preparação técnica e científica dos seus recursos humanos e em especial dos seus quadros superiores. Uma simples observação, por outro lado, permite constatar o papel de revitalização do tecido social e produtivo regional que o ensino superior descentralizado tem desempenhado.
O ensino superior continuará pois seguramente a solicitar uma grande atenção e a merecer um grande esforço de investimento. A ideia - por vezes ecoada com ligeireza - de que Portugal tem diplomados em excesso não faz o menor sentido. O que há em Portugal, para utilizar a expressão corrente, é “doutores a menos”.
As estatísticas infelizmente falam claro. Mesmo que consideremos unicamente os jovens, por exemplo na faixa etária dos 30 anos, há apenas 13% dos portugueses que obtiveram um diploma do ensino superior, ao passo que a média europeia é 22%, quase o dobro.
Admito porém que a expansão e diversificação da oferta do ensino superior se tenha feito por vezes de forma desordenada. As observações críticas quanto à falta de correspondência entre áreas de formação e necessidades económicas e sociais do País merecem outra atenção. A expansão da rede nem sempre obedeceu a critérios claros e consistentes.
Se bem que este tema não possa ser discutido de forma simplificadora, estou de acordo que nem sempre ao crescimento do ensino superior correspondeu qualidade. Seguramente este é hoje, para quem se ocupa e participa no sistema do ensino superior em Portugal, o grande desafio e a grande exigência, a da qualidade.
Sabemos que a qualidade não se obtém por decreto e que o controlo administrativo, ainda que rigoroso e expedito, tem limites que decorrem da natureza da actividade das instituições e do respeito pela esfera própria de competências, e respectiva autonomia.
Acompanho com muito interesse o debate em torno do tema da avaliação do ensino superior e creio que todo o sistema, reflectindo sobre a experiência própria e alheia, terá de aprofundar esse caminho. Sem uma cultura de avaliação, o ensino superior português terá muitas dificuldades em garantir os padrões de qualidade adequados ao desenvolvimento e modernização do País.
Pelos 25 anos desta escola perpassam vários séculos de reflexão e experiência de ensino e investigação científicas, em áreas cuja prioridade foi e continua a ser justamente reclamada pela sociedade portuguesa. Responsabilidade acrescida pois para quem tem a tarefa de actualizar e projectar no futuro essa mesma reflexão e experiência.
Daí os votos das maiores felicidades para professores, alunos, funcionários, todos aqueles que afinal fazem desta escola um corpo vivo.