Semana da Educação - Acto de Constituição do Conselho Nacional de Educação de Vila Nova de Famalicão

Vila Nova de Famalicão
19 de Janeiro de 1998


É com muito prazer que me associo a esta cerimónia que tem como objectivo constituir o Conselho Local de Educação de Vila Nova de Famalicão. Neste primeiro dia do meu programa, tenho sublinhado o princípio da educação como responsabilidade social. Nada melhor do que participar, neste fim de tarde, numa sessão que define compromissos e acordos entre pessoas, instituições e entidades tão diversas.
O debate sobre educação interessa ao conjunto da sociedade portuguesa. Não é uma questão meramente técnica, reservada aos especialistas. Todos têm uma palavra a dizer e é útil que ela seja ouvida. Nem sempre assim foi no passado. É fundamental que assim seja no presente e no futuro.
Apesar dos esforços realizados nas últimas décadas, Portugal termina o século XX com défices importantes no sector educativo. É verdade que, durante muito tempo, o Estado português não investiu seriamente nesta área, criando uma situação grave de subdesenvolvimento educativo. Mas é preciso reconhecer que o problema é mais fundo e toca nos próprios modos de organização da vida social e económica no nosso país.
É este o primeiro sentido do meu apelo à responsabilidade social ? Peço a todos para colaborarem num projecto nacional que vise promover a educação como um valor insubstituível para o desenvolvimento de Portugal. Porque se a ignorância gera ignorância, a cultura gera cultura. E esta é uma condição necessária à democracia e à liberdade, ao exercício consciente da cidadania. É preciso inscrever os hábitos culturais no nosso quotidiano e transportá-los para as novas gerações de forma a aumentar a sua capacidade de conhecer e de intervir na realidade. Às vezes basta um pequeno gesto familiar (dedicar mais tempo à leitura com os filhos ou com os netos); outras vezes o que conta é a acção na comunidade em que estamos inseridos.
É por isso que me parece tão interessante a iniciativa de criar um Conselho Local de Educação. Ninguém pode ficar indiferente ao destino da Escola. Mas para que este apelo não seja meramente retórico, é necessário que se traduza em modalidades concretas de colaboração. É no plano local que os princípios da autonomia e da participação adquirem um verdadeiro significado.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Não se trata de diluir responsabilidades ou de criar novas estruturas que tornem ainda mais complicados os processos de decisão e a vida nas escolas. Trata-se, bem pelo contrário, de apelar a uma maior responsabilização de todos, marcando claramente as fronteiras de intervenção de cada um. Neste aspecto, é importante reforçar as competências profissionais dos professores e a capacidade de intervenção das autarquias. O trabalho conjunto só tem sucesso se cada parceiro se sentir seguro e confiante.
É este o segundo sentido do meu apelo à responsabilidade social ? Peço a todos para participarem na definição de um espaço educativo que dê coerência à acção integrada no plano local. Para que este apelo seja efectivo, sei que é urgente possuir melhores condições de trabalho, fomentar práticas de cooperação interinstitucional e consolidar dispositivos rigorosos de avaliação. As mudanças em curso exigem que cada um assuma as suas responsabilidades próprias. Caso contrário, a ideia da “participação de todos” fica numa referência vaga, sem grande significado. O acordo que se celebra neste momento é parte integrante de um processo de reorganização do sistema de ensino, que tem vindo a pôr em causa lógicas burocráticas, corporativas e centralizadoras e a construir novos compromissos sociais em torno da educação.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
É no espaço educativo local que a responsabilidade social ganha toda a pertinência.
Há problemas gravíssimos nas periferias metropolitanas e no mundo rural. A incapacidade de lidar com as diferenças e com a diversidade conduz, muitas vezes, à desigualdade e à exclusão. Temos mais tendência para sublinhar as “dificuldades de aprendizagem” dos alunos do que as “dificuldades de ensino” dos professores!
Acredito que as instâncias locais podem ter um papel decisivo na criação de ambientes sociais, que impeçam a exclusão e que ajudem cada um a ir o mais longe possível no seu processo de desenvolvimento. Muitas comunidades não cuidam dos seus jovens como deviam. Consideram que os problemas devem ser resolvidos pela família, pela escola ou, em última análise, pela justiça. Hoje em dia, o conceito de cidade educativa procura, justamente, sublinhar a importância de olhar mais atentamente para estes jovens, promovendo novos estilos de vida.
Parece-me urgente uma melhor articulação de recursos humanos e materiais no plano local para facilitar o acesso à cultura e promover a educação ao longo da vida. Tenho observado a disponibilidade dos portugueses para um reforço das práticas de voluntariado. Os sectores da educação e da cultura, da defesa do ambiente e do património, devem merecer uma atenção especial. Como Presidente da República, gostaria de apoiar este movimento, nomeadamente no contexto dos projectos educativos locais.
É este o terceiro sentido do meu apelo à responsabilidade social Peço-vos que cooperem localmente para que se criem as condições propícias à aprendizagem dos alunos e à sua formação cívica e cultural.
Ao chamar a atenção para a necessidade de restabelecer laços e solidariedades, revelo a razão essencial que me levou a promover a Semana da Educação. É inútil falar de cidadania, de democracia e de liberdade, se o modo como as escolas e a vida local estão organizadas contradisser estas intenções. É imperioso construir ambientes sociais que fomentem a tolerância e o pluralismo, que estimulem hábitos de trabalho e de convívio, que valorizem a aprendizagem da palavra e a aprendizagem do mundo.
Nada será feito sem o contributo da “sociedade toda”. Quis estar aqui convosco porque os Conselhos Locais de Educação podem contribuir para a emergência de verdadeiras comunidades educativas. Como Presidente da República quero agradecer-vos esta iniciativa e desejar-vos os maiores sucessos no caminho de colaboração e de partilha que escolheram.