Sessão Solene no Congresso Federal Brasileiro

Brasília
08 de Setembro de 1997


Ligam-me a este país múltiplos laços de afecto e o prazer de partilhar a amizade de tantos brasileiros com quem tenho convivido ao longo dos anos. Mas a esses laços acrescento hoje o prazer e a Honra de ser o portador da expressão do afecto do Povo português para com o povo brasileiro e o garante do empenho da República Portuguesa no aprofundamento da sua ligação com a República Brasileira.
Saúdo calorosamente o Povo brasileiro através dos seus representantes livremente eleitos. Faço-o em nome de Portugal que aqui hoje revê e reafirma a longa e íntima relação que há séculos nos une. Faço-o acompanhado, nesta cerimónia, por uma importante delegação de parlamentares da Assembleia da República que como representantes do povo português não quiseram deixar de me acompanhar nesta importante visita de Estado.
Saúdo vibrantemente o Brasil. Faço-o com emoção, convocando para essa saudação, como garante acrescido da sua perenidade, a vontade política de assegurar que para além dos séculos de história havida outros possam haver.
Senhor Presidente do Congresso Federal Brasileiro
O que nos une e é garantia de que nos continuará a unir, não é um qualquer determinismo da história, mas a força, conscientemente assumida, da importância política, económica e cultural das nossas relações bilaterais.
A minha presença no Brasil, a convite do Senhor Presidente da República, para participar no Dia Nacional, ficará como emblema do empenhamento dos nossos Povos e Estados na procura dos novos fundamentos do futuro das relações luso-brasileiras.
E é a força do interesse estratégico dessa relação, nas suas diversas vertentes, que nos deve sempre aconselhar a olhar para além de qualquer circunstância adversa que não deixará de encontrar a sua superação, para focarmos a essência das coisas e concentrar os nossos esforços no fundamental. Nunca, como hoje, foi tão clara e efectiva a aposta nas relações luso-brasileiras. Nunca, como hoje, se olhou tão determinante em frente.
Portugal aposta decididamente num novo ciclo de relações com o Brasil apoiado em três vertentes essenciais.
Em primeiro lugar, o reforço da concertação política e diplomática entre os dois Estados, transformando em mais valias recíprocas a inserção em espaços regionais e em factor de distinção a pertença a uma plataforma estruturada de articulação diplomática de sete estados: a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa é hoje uma realidade, de que é garante o compromisso fundador assumido pelo empenhamento político de todos os Estados. O se destino está nas nossas mãos. É a nós que criámos a esperança que cumpre realizar a obra. É preciso avançar com determinação e meios, garantindo as condições objectivas para que o seu projecto se consolide e desenvolva.
Destaco aqui a importância que os dois países têm atribuído ao processo de reforma da Carta das Nações Unidas e, em particular, à questão da reforma do seu Conselho de Segurança, que não poderá deixar de ser feita com o espírito de preservar o papel fundamental deste Conselho na manutenção da paz e da segurança internacionais e contribuir para o reforço da sua eficácia. No quadro desta reforma, Portugal apoia firmemente a entrada do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança.
Permitam-me, aliás, ao abordar o problema das relações diplomáticas entre os dois países que refira aqui a questão de Timor-Leste, cuja problemática e contornos actuais são do conhecimento dos Senhores Congressistas.
Recordo-a aqui para deixar expresso um apelo. Ao Brasil não cabe, naturalmente, desempenhar um papel semelhante ao que compete a Portugal na condução deste dossier. Portugal tem para com ele uma responsabilidade histórica própria e um papel específico a desempenhar no contexto das negociações que decorrem sob a égide do Secretário Geral das Nações Unidas. Mas o Brasil, que não tem deixado de manifestar nos momentos próprios a sua sensibilidade a esta questão, dispõe de uma diversidade de interlocutores e de canais de intervenção diplomática de cujas diligências, respeitando os termos globais do mandato do Secretario Geral das Nações Unidas, muito podem beneficiar os timorenses. É este o apelo que vos expresso, certo que o deixo depositado nas mãos de um país que também ele teve de lutar pela autonomia do seu destino.
O segundo desses três pilares é a aposta decisiva nas relações económicas entre os dois países, com trocas crescentes de participações em empresas e investimentos significativos, em ambos os lados do Atlântico.
Este é o novo pilar de sustentação das nossas relações que não deixará, estou certo, de desenvolver uma estratégia de parcerias que ultrapassam o domínio bilateral e encontrem interlocutores e oportunidades significativas, nomeadamente em África, como reforço de um importante relacionamento multilateral. Hoje as oportunidades nascem mais da concertação de interesses do que da concorrência de estratégias individuais.
Em terceiro lugar, o reforço do relacionamento científico e universitário e o aprofundamento do intercâmbio cultural. Hoje importa garantir a intensificação da cooperação cientifica e tecnológica. Hoje importa investir na nova dimensão política do património inestimável que representa a existência de uma língua comum em que se exprimem sete Estados a através dela culturas tão diversas.
Senhor Presidente do Congresso Federal Brasileiro,
As relações luso-brasileiras são também vividas, no dia a dia, por comunidades de residentes que em ambos os países procuram diferentes oportunidades para as suas vidas. Esta é uma longa tradição na nossa relação. E se historicamente as comunidades portuguesas no Brasil são mais antigas e de maior dimensão é bem verdade que hoje é crescente o número de brasileiros que procuram Portugal. Quero que saibam que Portugal os considera como estando em sua casa, do mesmo modo que ao longo de tantas décadas o Brasil considerou bem vindos os portugueses que aqui aporatram em busca de um futuro melhor.
As economias modernas, a braços com complexos problemas nos seus mercados de emprego, projectam naturalmente na sociedade ansiedades e angústias quanto á concorrência que outros, vindos de fora, possam representar. Esta é uma reacção natural. Mas para quem, como Portugal, tem espalhados pelo Mundo tantos milhões de cidadãos nacionais é fácil compreender a presença reciproca daqueles que nos procuram.
Quero que os Brasileiros, nos termos da lei portuguesa e os portugueses nos termos da lei brasileira e da sua desejável evolução, desfrutem de um número crescente de direitos e oportunidades para se integrarem plenamente na sociedade em que livremente escolherem viver.
Creio que a legislação de enquadramento das comunidades residentes consagra já, quer no Brasil quer em Portugal, um número significativo de direitos. É desejável que essa legislação esteja em permanente evolução e aperfeiçoamento, em ambos os países, considerando, naturalmente, o já vigente princípio da reciprocidade. Essa evolução fará com que sejam cada vez maiores os mecanismos de integração social. Sei que este não é um caminho fácil. Mas o que importa, digo-o mais uma vez, é o sentido em que se caminha. E esse é o sentido em que se caminha, independentemente das vicissitudes do processo. Sei que todos, em ambos os países, com elevação e sentido de ponderação, seremos capazes de olhar para além das circunstâncias e defender sempre o interesse estratégico entre Portugal e o Brasil.
Exmo Senhor Presidente do Congresso Federal Brasileiro,
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Agradeço-vos sentidamente a oportunidade que me deram de me dirigir ao Congresso Brasileiro e, através dele a todo o povo deste extraordinário país. Aqui vos deixo a expressão da vontade de Portugal em estreitar, em novos moldes, as relações entre os nossos dois países. Aqui vos deixo a expressão sincera do meu fascínio por esta terra, do meu afecto pelas suas gentes, e da minha admiração pela riqueza da sua cultura.
Viva o Brasil!
Viva Portugal!