Almoço oferecido pelo Presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo

Sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
09 de Setembro de 1997


É com muito gosto que me encontro hoje entre vós. A FIESP ao dar-me o prazer deste encontro permite-me que eu possa prestar público testemunho de apreço pelo relevante papel que esta Federação tem tido na promoção das relações económicas e empresariais entre o Brasil e Portugal e entre o Mercosul e a União Europeia.
Esse papel assume na actualidade uma importância reforçada já que as relações económicas entre os nossos dois países se desenvolvem a um ritmo cada vez mais intenso.
Na verdade, as relações económicas entre Portugal e o Brasil entraram numa nova fase. Se outros indicadores não existissem bastaria assinalar que Portugal é hoje o 6º investidor estrangeiro no Brasil. Esta atracção pelo investimento neste país mantém-se e reforça-se, como o prova a entrada recente de capital português no Banco Boavista InterAtlântico.
Para uma economia da dimensão da portuguesa, trata-se de uma posição de grande significado, considerando que a abertura económica de Portugal em relação ao exterior é ainda relativamente recente.
Esta situação é reveladora de uma grande confiança dos meios empresariais portugueses no futuro da economia brasileira, tal como, aliás, tem também crescido a confiança do Brasil na economia portuguesa. Julgo que, em ambos os casos, essa confiança é plenamente justificada.
O Brasil tem introduzido reformas importantes na sua economia, conseguindo esse impressionante resultado que foi eliminar um processo de hiper inflação que parecia não ter solução. Embora em menores proporções, também Portugal seguiu uma política anti-inflacionista sustentada que permitiu a quase estabilidade de preços de que hoje beneficiamos.
Tal como Portugal, o Brasil tem tomado medidas para reduzir o peso excessivo do sector publico, melhorando a flexibilidade da economia, aumentando a sua eficiência e reduzindo o desperdício de recursos.
Portugal, tal como o Brasil, está activamente empenhado num processo de integração regional. Quer a União Europeia quer o Mercosul representam para os nossos dois países uma abertura e um estímulo de crescente significado que ultrapassa o mero domínio económico.
No que respeita a Portugal, este processo de integração crescente tem permitido uma convergência rápida com os restantes países europeus, de tal forma que nos últimos dez anos recuperámos cerca de 40% da diferença que nos separava dos níveis de vida médios da Europa.
Sempre defendi que os processos de integração regional em que estamos envolvidos, longe de representarem uma dificuldade para o desenvolvimento das relações económicas entre Portugal e o Brasil, iriam, pelo contrário, constituir-se em factores de desenvolvimento dessas mesmas relações, o que se tem vindo a verificar.
Abrem-se hoje perspectivas de colaboração entre unidades empresariais dos nossos dois países que podem mesmo ultrapassar as áreas geográficas em que estamos inseridos e permitir actuações conjuntas em outras regiões do globo, como a África, onde a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa poderá desempenhar um importante papel ou, ainda, o Extremo Oriente.
E é por isso que considero que uma cimeira ao mais alto nível entre o Mercosul e a União Europeia, destinada a fomentar um relacionamento mais estreito entre estas duas organizações regionais, seria do maior interesse, não só para os dois espaços em geral mas também para o incremento das relações entre os nossos dois países.
Defendo a ideia de uma Europa aberta ao mundo. A abertura económica mundial é um processo imparável e, desde que se respeitem as normas de comércio internacional - o que consideramos essencial - será um processo que trará benefícios para a evolução económica geral.
Com a criação da união monetária a partir já de 1999 a União Europeia ganhará um novo papel no sistema monetário internacional adquirindo no domínio financeiro uma posição mais próxima daquela que já tem no domínio económico como maior potência comercial do Mundo.
Com o esforço de redução da inflação e de reequilibro das contas públicas realizado nos últimos anos, Portugal encontra-se neste momento em excelentes condições para participar no grupo de países que integrarão a moeda única europeia em 1999. Será certamente um motivo adicional para consolidar a confiança na economia portuguesa que é já hoje uma realidade face aos bons resultados nos últimos anos.
O Brasil não precisa, evidentemente, de qualquer mediador para desenvolver as suas relações com a União Europeia. Mas não quero deixar de afirmar, também aqui, que Portugal será sempre um aliado seguro com que o Brasil poderá sempre contar.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
A relação entre democracia e integração é um elemento essencial tanto na União Europeia como no Mercosul. Hoje, há um importante debate institucional que atravessa os dois espaços regionais, apesar de eles se encontrarem em diferentes fases da sua evolução. A União Europeia procura interpretar e aperfeiçoar a sua arquitectura institucional; o Mercosul, começa ainda a aprofundar este processo. O processo de estruturação institucional será seguramente gradualista, como o foi, e é, o processo da União Europeia
A União Europeia enfrenta assim o desafio da democratização do sistema institucional, de forma a assegurar a participação dos cidadãos. O Mercosul, desenvolve um processo de integrarão que é uma consequência dos processos de transição democrática e uma condição para a sua consolidação.
Hoje os dois espaços regionais reconhecem-se num modelo de sociedade que valoriza a democracia, os direitos do Homem, o pluralismo e a paz internacional, um modelo de desenvolvimento em que o crescimento e a competitividade têm de coexistir com a preservação da qualidade do ambiente.
E por democracia não entendo só a estrutura formal do Estado e a sua Constituição, mas também, a sociedade civil que é um elemento fundamental da democracia. Por isso mesmo, quer nos países da União Europeia quer nos do Mercosul o reforço dos sistemas políticos e o maior diálogo entre decisores políticos e os cidadãos sobre os respectivos processo de integração permitirão que as integrações regionais se possam desenvolver-se com um amplo apoio das respectivas sociedades.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
As sociedades desenvolvidas continuam, por um lado, a ter significativas zonas de pobreza e, por outro, a ser espaços em que as expectativas e as reivindicações socio-económicas crescem mais depressa do que a capacidade para as satisfazer.
Portugal tem, portanto, de continuar a gerir um conjunto de mudanças que lhe permitam enfrentar as consequências da perda de competitividade dos sectores tradicionais da sua economia, ao memo tempo que garante novos investimentos produtivos em sectores mais exigentes em termos de qualificação e de qualidade.
E tem de conseguir fazê-lo num quadro macro-económico de redução da inflação e do défice público, de modo a assegurar que se manterá no centro político da construção europeia, sito é, no grupo dos Estados que participarão da moeda única.
Apesar de reconhecer que existem problemas sérios de competitividade empresarial, quero dizer-vos que não creio que o progresso económico exija a desregulamentação dos mercados de trabalho e a redução dos níveis de protecção social, sob pena de se ver crescer o desemprego de massa.
Quer em Portugal, quer na generalidade dos países da União Europeia, a abordagem predominante desta situação difícil tem consistido em enfrentar o problema da competitividade das empresas pela moderação salarial, por algum grau de flexibilidade dos mercados de trabalho e pelo reforço das políticas activas de formação e emprego. Mas creio que devemos reconhecer que tais estratégias não permitiram ainda progressos suficientes no combate ao desemprego e à exclusão social.
Como se sabe, há quem, argumentando com as exigências da competitividade e com a garantia formal dos direitos cívicos e políticos, remeta os direitos sociais para um plano residual, a desenvolver se e quando os ganhos de eficiência económica tenham produzido excedentes que os tornem possíveis.
Discordo destas teses por duas ordens de razões.
Em primeiro lugar, porque, como sabemos, a degradação das condições económicas e sociais implica, muitas vezes, limitações do exercício dos direitos cívicos e políticos que estão formalmente garantidos.
Em segundo lugar, as tensões e as rupturas sociais estão, elas próprias, na origem de algumas restrições fundamentais ao desenvolvimento económico.
A questão social é um dos pontos essenciais da agenda política contemporânea. Trata-se de saber como conjugar as necessidades e as possibilidades das empresas e dos trabalhadores em domínios tão importantes como o acesso à formação, à qualificação e ao emprego, a duração e a gestão tempo de trabalho ou a repartição dos rendimentos. Trata-se de saber como combater quer à persistência da dificuldade dos jovens no acesso ao mercado de trabalho, quer o crescimento da precariedade do emprego e do desemprego de longa duração.
É, por isso, tão importante ter em conta as experiências de outros espaços regionais em integração crescente. Estou certo que Portugal ganharia em juntar à cooperação económica com o Brasil alguma troca de experiências no domínio da procura de novas articulações entre eficiência económica, emprego, equidade social e liberdade política.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Ao património histórico e cultural que une os nossos dois países tem vindo a juntar-se o aprofundamento das relações económicas.
Regozijo-me por assim ser, certo como estou que há boas razões para pensar e sentir que a cooperação entre os dois países se desenvolverá e se consolidará.