Posse do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas

Palácio Nacional da Ajuda
16 de Março de 1998


Começo por cumprimentar Vossa Excelência, Senhor General Espírito Santo, no momento em que toma posse como Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas.
Todos conhecem as suas distintas qualidades, que se exprimem numa brilhante carreira de Oficial ao serviço do Exército, das Forças Armadas e de Portugal. A sua superior competência profissional, demonstrada no exercício de funções de comando e estado-maior, bem como a sua larga experiência internacional, tornam Vossa Excelência uma escolha natural para o mais alto cargo da hierarquia militar.
Estou certo de que saberá desempenhar essa funções com elevado espírito de responsabilidade e com a cordialidade de relacionamento que é de seu timbre, pelo que lhe desejo os mais sinceros votos de sucesso no cumprimento da sua nova missão.
Não quero nesta oportunidade deixar igualmente de proferir a palavra de reconhecimento que é devida ao seu antecessor na chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas. As circunstâncias que levaram à sua substituição em nada impedem o Presidente da República de reconhecer os altos serviços prestados pelo Senhor Almirante Fuzeta da Ponte às Forças Armadas e a Portugal, entre os quais julgo dever realçar a meritória acção por ele desenvolvida no processo de restruturação dos comandos da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
As circunstâncias que levaram à substituição do anterior Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas foram marcadas por sinais de controvérsia, que considero negativos. Como Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas fui obrigado a retirar a minha confiança política e funcional no seu antecessor perante atitudes de relacionamento com o poder político que considerei desajustadas em democracia e conflituantes com o nosso ordenamento constitucional. Nesse quadro, o próprio prestígio da instituição militar exigia uma decisão clara, que os responsáveis políticos assumiram em tempo oportuno.
Fique claro que nenhuma crise se verificou ou verifica, artificial que fosse. Na verdade, a substituição de altos comandos militares, mesmo quando determinada por motivos inesperados, nunca poderá ser tida como propiciadora de crises, sempre, em qualquer caso, incompagináveis com a vida das Forças Armadas em democracia. Insinuar ou pretender o contrário constituirá um inaceitável desvio à verdadeira natureza, aos fins e ao posicionamento, todos de grande mérito e importância, das Forças Armadas no quadro do nosso ordenamento político-constitucional.
Ultrapassada essa situação conjuntural, é necessário continuar a trabalhar, com determinação, no processo de reforma e modernização das Forças Armadas, indispensável para as adequar às prioridades nacionais e às mudanças internacionais.
Esse processo de modernização, determinadamente definido e assumido pelo Governo, com o constante apoio do Presidente da República, implica, como se sabe, a consolidação de um novo quadro conceptual, o aprofundamento da restruturação e redimensionamento das Forças Armadas e o desenvolvimento coerente e sustentado da programação militar.
Em todas essas dimensões estão em jogo as decisões que irão moldar as estruturas de Defesa Nacional e das Forças Armadas no futuro, o que continuará a exigir, da parte de todos os responsáveis, firmeza, empenho e abertura para a mudança.
A Defesa Nacional constitui uma função essencial do Estado, que deve ser, em democracia, um imperativo partilhado por todos os cidadãos. Neste sentido, a reflexão e o debate sobre os temas estratégicos e as políticas de segurança e defesa não podem ser apropriados por meios restritos, dominados por especialistas. Pelo contrário, devem ser tão alargados quanto possível.
Nesse contexto, assume particular relevância o tratamento das grandes orientações estratégicas de Portugal no domínio da segurança e da defesa nacional ao serviço dos objectivos nacionais permanentes e das prioridades assumidas na sede própria. Um debate aberto e participado é necessário para se formarem os consensos indispensáveis, que podem assegurar uma linha de continuidade e estabilidade das políticas nacionais neste domínio.
O principal desafio da restruturação e redimensionamento das Forças Armadas consiste em estabelecer um novo modelo organizacional, assente na prestação do serviço militar em regime de voluntariado. A gradual profissionalização das Forças Armadas representa uma mudança política e institucional complexa, com incidências a múltiplos níveis, desde a definição legislativa do novo modelo do serviço militar, até às acções de redimensionamento, quer do dispositivo, quer dos recursos humanos.
Como tem sido afirmado pelo Governo, um programa de redimensionamento coerente com o modelo organizacional adoptado é essencial para garantir tanto os equilíbrios orçamentais e um investimento preferencial na modernização qualitativa das Forças Armadas, como a dignificação das carreiras dos militares, indispensável para assegurar a sua crescente motivação profissional.
Quanto ao apetrechamento das Forças Armadas, que tem vindo a operar-se progressivamente, de acordo com as disponibilidades financeiras, está em curso - e é prioritária - a preparação da nova Lei de Programação. Para que a sua execução permita potenciar o sistema de forças e a capacidade das Forças Armadas, de acordo com as necessidades reais da defesa e da segurança nacional, a Lei de Programação - como é por todos admitido - deve respeitar, rigorosamente, as orientações e prioridades estabelecidas pelos instrumentos legislativos confirmados e definidos pelos órgãos constitucionalmente competentes.
Torna-se assim imperativo atender às necessidades mais prementes decorrentes da conjuntura, as quais requerem um emprego efectivo de meios, e conseguir um balanceamento ajustado das forças e meios pelas missões das Forças Armadas, ao mesmo tempo que se consolida a posição de Portugal como parte integrante de um espaço de alianças, designadamente da Organização do Tratado do Atlântico Norte, onde se materializa a solidariedade da defesa colectiva.
Finalmente, a modernização das Forças Armadas implica uma afirmação da continuidade dos seus valores essenciais ao serviço de Portugal, que fazem a sua grandeza e as definem como instituição nacional.
O prestígio das Forças Armadas decorre tanto do seu passado, que se confunde com a nossa história, como da forma como se integram na Nação e cumprem as suas missões, quer em acções internacionais, essenciais para assegurar a projecção externa do Estado, quer em tarefas internas de interesse público.
A prioridade atribuída à reforma das Forças Armadas é inseparável da afirmação do seu valor nacional. Pela minha parte, como Comandante Supremo das Forças Armadas, continuarei empenhado em defender o prestígio e a dignidade da instituição militar no quadro democrático português.
Os desafios são grandes e as tarefas a desenvolver complexas e de grande alcance nacional. Estou certo, Senhor General, que saberá encontrar as respostas mais adequadas para os levar a bom termo e cumprir as missões que lhe estão confiadas.
Reitero-lhe as minhas sinceras felicitações e quero que saiba que poderá continuar a contar com o meu apoio institucional e pessoal no desempenho das suas novas funções.