Cerimónia de Apresentação Pública do Relatório da Comissão Mundial Independente para os Oceanos

Lisboa
01 de Setembro de 1998


Sendo o Oceano algo de absolutamente vital para os nossos equilíbrios globais, e estando Portugal e o Oceano habituados a viver em conjunto e a partilhar um destino comum - e assim é por via da Geografia, da História, da memória colectiva e até do nosso sentir mais simples, mais genuíno, mais básico ou fundamental, como o é o dos nossos poetas, sonhadores e gentes do mar - era pois inevitável reencontrarmos um dia o caminho que leva ao mar e a ele dedicarmos todo o nosso empenho.
Para Portugal e para os Portugueses, tal como, aliás, para todos os Estados e Povos do Mundo, empenhar-se na salvaguarda e valorização do Oceano não é um acto meramente altruista e desinteressado. A natureza profunda desse acto é mais do foro do bom senso e do puro e simples instinto humano de sobrevivência como espécie.
É por estas razões que saúdo, calorosamente, todas as individualidades aqui presentes, congratulando-me com a realização desta importante cerimónia.
Quero saudar, em especial, os vice-Presidentes e os Membros da Comissão Mundial Independente para os Oceanos e, muito em particular, o seu Presidente, Dr. Mário Soares, pela enorme importância do trabalho realizado.
O Relatório da Comissão - “O Oceano - nosso Futuro”, agora publicamente apresentado, abre, não tenho sobre isso qualquer dúvida, novos horizontes em matéria do relacionamento futuro da Humanidade com a efectiva perspectiva tridimensional do imenso espaço oceânico, bem como com as potencialidades, também elas imensas - mas, implacavelmente finitas - dos seus recursos vivos e não vivos, dos seus múltiplos usos e dos tão diversos quão fundamentais serviços prestados, que vão do seu papel decisivo na regulação climática à contribuição vital para a diversidade biológica do Globo.
A compatibilização - se não mesmo a criação de novas e talvez inesperadas sinergias - entre tantos e tão díspares usos e serviços e entre estes e a exploração racional e sustentável dos seus recursos é hoje, seguramente, o grande desafio colectivo que urge enfrentrar. Este Relatório, constitui uma contribuição relevante para tal desígnio.
Como aí é mencionado, são fundamentais no que respeita ao futuro do grande espaço oceânico, as questões da Paz e Segurança, considerada esta no seu mais amplo sentido, e da Equidade e da Democracia.
Começamos hoje a ter uma clara percepção de que as grandes questões que respeitam aos Oceanos, não deixando de ter uma forte, e até por vezes decisiva, componente técnica e científica, são, no fundamental, eminentemente políticas - e como tal deverão por todos ser assumidas.
A Ciência, o conhecimento científico e a sua difusão entre os jovens são hoje instrumentos fundamentais de um pleno exercício de cidadania. A intervenção cívica dos cidadãos na preservação dos Oceanos tem que ser, em termos técnico-científicos, absolutamente rigorosa - pois só assim se tornará responsável, credivel e, em última instância, eficaz.
Não é possível preservar o que se desconhece, sendo, por essa razão, o papel da investigação científica mais do que nunca condição básica de qualquer política dos Oceanos.
Este Relatório dá-nos pistas sólidas que nos permitem vir a articular no futuro o Desenvolvimento (que se quer, obviamente, sustentável) e a Segurança, em paz e seguindo princípios de equidade, confluindo todas estas vertentes para um ponto de facto crucial - o da Governação do Oceano no Século XXI, tendo como base uma opinião pública informada e responsável, motor de qualquer mudança ou ruptura, de que, notoriamente, carecemos.
Portugal assumirá as suas responsabilidades históricas neste contexto. Antes de mim, o Senhor Primeiro-Ministro António Guterres já vos deu conta das intenções que animam o Governo português e das medidas que ele tenciona adoptar com este objectivo.
Mas à Europa, no seu conjunto, cabe igualmente uma particular responsabilidade no sentido de tornar possível essa mudança, incentivando uma maior solidariedade na esfera da cooperação internacional.
Essa cooperação é indispensável no que toca, nomeadamente, à partilha de meios, tecnologias e recursos, contribuindo, assim, para uma efectiva Governação dos Oceanos.
A Declaração de Lisboa de 1998 sobre a «Governação do Oceano no Século XXI: Democracia, Equidade e Paz no Oceano», de que acabamos de ver a apresentação, espelha bem todas estas preocupações. Elas emergem hoje como imperativos cívicos e políticos e, em simultâneo, como vectores estratégicos de actuação, cruciais para assegurar a segurança colectiva, no seu mais amplo sentido, em 71% da superfície do Globo.
Sem qualquer tipo de paternalismos ou descabida presunção, penso, realmente, que, no actual contexto, o mundo espera da Europa um gesto decisivo e pioneiro nesta matéria - o qual, tomemos disso consciência, terá de ser necessária e urgentemente feito, para já à escala regional.
É este o meu desejo, é este o meu apelo pessoal como Português, como Europeu, como cidadão de um Mundo que se quer solidário.