Discurso de Encerramento da VIII Semana Ibero-Americana


16 de Outubro de 1998


Chegámos ao termo desta nossa VIIIª Cimeira Ibero-americana.

Reunimo-nos num ambiente fraterno e solidário. Acima das perspectivas diferenciadas que necessariamente existem, apesar dos circunstancialismos específicos que legitimamente moldam a abordagem individual das questões concretas, prevaleceu e reforçou-se a amizade que nos une e o esforço comum para encontrar respostas para as grandes questões que preocupam as nossas sociedades.

É com esta mesma amizade que vos acolhemos em Portugal, nesta bela cidade do Porto, que se orgulha de ter sido, hoje, capital ibero-americana; e a minha primeira obrigação é agradecer-vos o facto de terem aceite o nosso convite, contribuindo, com a vossa presença, para um debate franco e enriquecedor, garantindo o sucesso dos nossos trabalhos.

Vivemos numa sociedade internacional que, em muitos aspectos, assume as características de uma ``vida quotidiana mundial'' dada, nomeadamente, a rapidez dos fluxos informativos.

Uma sociedade em que a integração mundial dos mercados financeiros e cambiais constitui uma realidade sem precedente histórico e com profundas consequências a nível das sociedades nacionais nos mais variados domínios, no económico, no cultural, no social e no político.

Alguns defendem até que é o próprio papel do Estado - enquanto actor político fundamental - que é alterado ou mesmo reduzido, num sistema que se torna cada vez mais policêntrico.

Não creio, todavia, que possamos aceitar uma tal perspectiva. Há funções, há tarefas, há responsabilidades que os Estados têm de continuara a assumir, sob pena de porem em risco a solidez e a coesão das nossas sociedades e o seu desenvolvimento económico e social.

O que me parece importante, o que nos parece a todos essencial, é que a globalização financeira e económica constitua um efectivo factor de progresso crescente para os nossos países, que não podem ficar sujeitos a turbulências externas que fragilizem as suas economias.

É preciso evitar que os efeitos da globalização ponham em causa o desenvolvimento das economias nacionais, acentuando fenómenos de exclusão social e de pobreza, aumentando a desigualdade e comprometendo a consolidação de processos de integração regional que são fundamentais para a estabilidade e a paz no mundo.

A marcha da globalização é, todos o sabemos, irreversível, mas terá de ser um processo em que todos possam participar, assumindo os custos e os desafios, mas colhendo igualmente os benefícios e as oportunidades.

Este é, sem dúvida, um dos grandes desafios políticos da era em que vivemos.

Falámos aqui da complementaridade entre os processos de globalização e os de integração regional. É uma complementaridade que os vários espaços regionais aqui representados querem crescentemente afirmar.

A experiência portuguesa de integração europeia, que aqui evoquei esta manhã, consequência natural do restabelecimento de um regime democrático no meu país, disse-nos da importância de saber que não estamos sós perante os problemas com que nos defrontamos, de que existe uma procura de soluções comuns, colectivamente decididas e assumidas.

Se evoquei esta cultura política solidária é porque creio que ela nos aponta os caminhos para um relacionamento e um diálogo frutíferos entre espaços regionais. Um diálogo que será tanto mais efectivo quanto maior for o grau de coesão e desenvolvimento de cada um deles.

Os avanços verificados na América Latina no que respeita aos vários processos de integração regional são um sinal muito positivo de que temos boas razões para encarar o futuro com justificada confiança.

Não creio que haja processos de integração bem sucedidos se não tiverem uma dimensão política, claramente assumida, baseada em princípios e em valores comuns, e desde logo na dimensão ética da própria democracia, que no ano passado abordámos, na Cimeira de Ilha Margarita.

O reforço dos regimes democráticos, o fortalecimento da sua credibilidade, a defesa das liberdades e das garantias, o compromisso permanente com a salvaguarda dos direitos humanos são premissas essenciais que não basta enunciar, mas que é preciso sobretudo assegurar.

A globalização terá de ser também um processo de mundialização de valores e de princípios, terá de ser igualmente uma aposta política no futuro da nossa aldeia global. Não queremos com certeza que ela se traduza apenas no conjunto de efeitos provocados pela liberdade de circulação de capitais, pela internacionalização da produção ou pela modernização dos meios de comunicação. Não é, com certeza, apenas isso que queremos. Temos pois de agir para que assim não seja.

Para além do riquíssimo conjunto de intervenções feitas ao longo deste dia de trabalhos, a declaração final que aqui aprovámos é o documento que permanecerá como o nosso compromisso colectivo relativamente ao tão importante tema que abordámos. Nela se condensa a mensagem que deixamos aos nossos povos, uma mensagem que é de esperança, de solidariedade, de confiança no futuro e nas nossas capacidades para o enfrentar procurando respostas conjuntas, porque comuns são também os desafios.

Os trabalhos da nossa Cimeira foram acompanhados de um conjunto de iniciativas, de debates, de encontros entre especialistas de vários domínios, todos eles indispensáveis para aprofundar o nosso entendimento e cooperação, para buscar respostas conjuntas para os problemas com que as nossas sociedades se defrontam.

Esta dimensão essencial do envolvimento da sociedade civil nas nossas Cimeiras é um fermento indispensável da nossa Comunidade.

Não posso, por último, deixar de me congratular com a importante decisão que tomámos no sentido de conferir um carácter institucional à nossa cooperação, ao criarmos a Secretaria de Cooperação Ibero-americana. Julgo tratar-se de uma solução funcional susceptível de melhorar a eficácia das acções e programas que levamos a cabo nesta área.

De igual modo quero salientar a aprovação de uma declaração sobre a situação financeira internacional, anexa à Declaração do Porto, que sublinha de uma forma particularmente oportuna, a nossa determinação na defesa das condições que permitirão o crescente desenvolvimento económico e social dos nossos povos, assim como sublinha a solidariedade essencial que deve prevalecer na abordagem e resolução dos problemas decorrentes da presente crise financeira

Por último, gostaria de voltar e referir o acordo a que chegaram esta manhã os Presidentes do Equador e do Perú, que pôs fim a um diferendo doloroso que persistia desde há cinquenta e seis anos. Trata-se efectivamente, de um acordo histórico, abrindo caminho para uma nova era de entendimento e de progresso para estes dois povos irmãos. Reitero as sinceras felicitações de todos os Chefes de Estado e de Governo aos Presidentes Fujimori e Mahuad por esta decisão corajosa e portadora de paz.

Senhores Chefes de Estado e de Governo

Senhores Ministros

Excelências

Meus Amigos

Caberá a Cuba a responsabilidade de organizar a nossa próxima Cimeira, que assim em 1999 regressa a terras americanas. É uma tarefa a que o Governo e o povo cubanos saberão corresponder com empenho e entusiasmo.

Comemora-se este ano o centenário do Tratado de Madrid. O Povo cubano sempre fez jus à sua independência, afirmando poderosamente a sua identidade, não vergando nunca perante as dificuldades, lutando pelos seus direitos e liberdades. 1998 foi assim para Cuba, tal como aconteceu em Portugal, um ano de encontro com um momento particularmente significativo da sua História.

Julgo interpretar o sentimento de todos nós ao expressar o nosso profundo respeito e admiração pelo Povo cubano. Permitam-me que lhe dirija aqui uma calorosa palavra de saudação e os votos sinceros de um futuro de paz, de liberdade e de progresso.

Quero igualmente expressar ao Presidente Fidel Castro os desejos de maior sucesso na organização da IX Cimeira Ibero-americana, nesta altura em que, em nome de Portugal, lhe passo o testemunho e lhe peço que nos fale do tema que então iremos abordar.

Muito Obrigado