Sessão Solene na Câmara Municipal de Berlim (Visita de Estado à Alemanha)

Berlim
22 de Junho de 1998


Desejo agradecer-lhe, antes de mais, Senhor Burgomestre, esta tão calorosa recepção que tanto honra Portugal e os portugueses.
Regozijo-me por me encontrar novamente nesta grande cidade, sempre hospitaleira, sempre surpreendente pela sua pujança criativa e pelo seu dinamismo humano e cultural.
Berlim evoca em mim recordações muito pessoais. A primeira visita ao estrangeiro que efectuei com minha Mulher, trouxe-nos justamente a Berlim, onde tivemos o privilégio de escutar as nove sinfonias de Beethoven, executadas pela Orquestra Filarmónica sob a batuta de Karajan Escassos meses volvidos, era derrubada a ditadura em Piortugal e os portugueses reencontravam-se com a liberdade e com a democracia que durante quase meio século lhes tinham sido negadas.
Atravessar a pé a Porta de Brandeburgo, como o fiz há pouco na companhia de Vossa Excelência, constituirá para mim uma outra recordação inolvidável.
Ex-libris desta grande metrópole, esse monumento testemunha dos momentos felizes e menos felizes da vida de Berlim.
Marca emblemática, por tanto tempo, de uma cidade dividida por uma lógica inaceitável, a Porta de Brandeburgo ressurge hoje como símbolo de uma cidade que se prepara para assumir a tarefa de ser a capital da Alemanha unida em paz e em liberdade.
Os projectos em torno da “Alexanderplatz”, que terei a grata oportunidade de ver esta tarde, assim como o conjunto dos empreendimentos urbanísticos que estão a ser levados a cabo, constituem um exemplo das formas de conciliar as exigências da administração pública, do sector privado e da população em geral, integrando escritórios, habitações, zonas de lazer e espaços culturais.
Admiramos a forma como estão a readaptar a vossa cidade às novas exigências, integrando o seu património histórico e artístico, modernizando as infraestruturas, recuperando as zonas mais antigas, protegendo o ambiente, humanizando os espaços urbanos, visando, em suma, melhorar o quotidiano dos seus habitantes.
Conheço, pelas funções que anteriormente exerci, quão exaltante é tal tarefa.
Berlim nunca deixou de ser uma capital de cultura na Europa deste século e um grande centro da modernidade artística. Atestam-no, hoje as três salas de ópera, os inúmeros teatros, as centenas de museus e de galerias de arte, e, naturalmente, as suas orquestras, paradigmas de qualidade musical. Atestam-no também anualmente o Festival de Berlim e o grande festival cinematográfico, que gozam de um justificado prestígio internacional.
No campo da investigação, dos conhecimentos humanísticos, das letras, das ciências exactas, as suas universidades disfrutam de um justificado prestígio e tornaram-se um pólo de irradiação do saber europeu, atraindo estudantes de todos os cantos do continente.
Personalidades marcantes das artes e das letras portuguesas aqui viveram e trabalharam, ou aqui iniciaram as suas carreiras. Um notável exemplo foi Carolina Michaellis de Vasconcelos, cidadã alemã, tradutora de português nesta mesma Câmara de Berlim, que se fixou em Portugal onde se tornou, porventura, a maior autoridade em filologia portuguesa do seu tempo.
Em Berlim viveu, durante mais de trinta anos, Vianna da Mota; pianista, compositor, pedagogo, divulgador incansável das obras de poetas e compositores alemães, a sua obra espelha bem a riqueza de uma simbiose entre as nossas culturas. Também Mário Eloy, um dos nossos grandes pintores deste século, se estabeleceu durante alguns anos em Berlim, aqui trabalhando e aqui expondo, tal como acontecera antes com Amadeu de Sousa Cardoso.
Mas muitos outros portugueses, artistas, escritores, cientistas e investigadores passaram por Berlim, atraídos pela sua extraordinária riqueza cultural e pela sua pujança criativa.
Senhor Burgomestre-Governador,
Como Vossa Excelência escreveu num texto que tive o prazer de ler, “Berlim é o laboratório da unidade alemã”.
Pelo que já me foi dado ver, pelo que verei esta tarde, estou certo de que a vossa experiência constituirá um exemplo bem sucedido em termos urbanos e humanos, e um contributo inestimável para consolidar a Europa, toda a Europa, como um espaço de democracia, de progresso, de paz e de solidariedade.
Desejo a Vossa Excelência e ao Senado desta nobre cidade as maiores venturas nesta vossa ingente tarefa.