Conferência proferida na Universidade de Varsóvia (Visita de Estado à Polónia)

Varsóvia
15 de Setembro de 1998


Agradeço-lhe muito sinceramente, Senhor Vice-Reitor, esta oportunidade que o Reitorado da tão prestigiada Universidade de Varsóvia me oferece para me dirigir a um conjunto de especialistas e de personalidades interessadas e empenhadas no processo europeu.
É um privilégio que muito me honra, assim como o país que aqui represento.
Não esqueço também o papel determinante das Universidades como escolas essenciais de democracia, centros insubstituíveis para a disseminação de uma cultura democrática, baseada no livre confronto de ideias e de perspectivas, na tolerância e no respeito pelas opiniões dos outros valores perenes da liberdade, da tolerância e da justiça, têm de ser constantemente defendidos contra as tendências anti-democráticas, as manifestações criminosas de racismo e de xenofobia, o sectarismo e o integrismo religiosos, a violência.
Só uma constante pedagogia da liberdade, dos direitos inalianáveis da pessoa humana, do Estado de Direito, nos permitirá fazer eficazmente face a esses profetas da desgraça, garantir a paz e a segurança democráticas, reunir as condições do progresso e de um maior bem-estar para todos.
Não se trata de uma questão “académica”, se me permitem a expressão nesta sala, mas de uma questão que está no centro do tema que vos proponho, já que a paz, a democracia, o Estado de Direito, o progresso económico e social, são os fundamentos e os valores essenciais do projecto europeu a que estamos indissociavelmente ligados.
Há quase dez anos a Polónia dava o primeiro e decisivo passo que abriu as portas de uma nova Europa, nas históricas eleições de 1989.
Lembro-me bem desses dias exaltantes que vivi intensamente, como todos aqueles que pautam a sua intervenção cívica e política pelos valores da liberdade e da dignidade.
Testemunho de coragem e lucidez, o voto dos eleitores polacos, impondo o princípio da legitimidade democrática, revelou que quarenta anos de opressão não tinham conseguido cortar os profundos vínculos políticos, históricos e culturais entre as duas partes da Europa dividida.
Quase dez anos volvidos sobre esses acontecimentos históricos, creio que nos podemos todos regozijar pelos resultados obtidos nos domínios essenciais:
- apesar do drama na ex-Jugoslávia, conseguimos manter a paz e fortalecer as garantias regionais de segurança, recusando o recurso à guerra e à ameaça da guerra no relacionamento entre Estados democráticos;
- o segundo resultado foi o sucesso das transições democráticas: a generalidade dos países da Europa central e oriental encontrou as formas e os ritmos mais apropriados para completar a institucionalização de regimes democráticos pluralistas, avançar na edificação de um Estado de Direito e no desenvolvimento de uma economia aberta.
Conhecemos, por experiência própria, as dificuldades inerentes a estes profundos processos de transformação política e económica, as tantas e legítimas expectativas que lhes estão associadas, e também as inevitáveis frustrações que tantas vezes acarretam.
Mas o que é fundamental, e os países da Europa central e oriental têm-no demonstrado, no decurso de sucessivas alternâncias democráticas, é a manutenção dessa orientação estratégica.
O exemplo da Polónia é, neste sentido, eloquente.
O mérito dessa mudança pertence aos próprios - aos responsáveis, aos agentes políticos, à sociedade civil dos países da Europa central e oriental, e o significado do seu sucesso é inequívoco: pela primeira vez na História, existem condições para criar uma nova Europa unida em torno dos valores essenciais da paz, da democracia, da justiça e do progresso económico e social.
Os processos de alargamento da União Europeia e da Aliança Atlântica são os primeiros passos nesse caminho que nos conduzirá à fixação de uma nova geografia política no continente europeu, assente numa cultura comum de segurança e em modelos políticos de natureza idêntica.
A Aliança Atlântica representa um quadro indispensável de garantia da segurança e da estabilidade estratégicas para o conjunto dos seus membros. Mas a União Europeia tem um papel particularmente importante para assegurar a continuidade democrática, estimular a modernização das economias e das administrações e reforçar as condições do desenvolvimento, bem como uma capacidade única para institucionalizar a aliança do conjunto das democracias europeias.
Portugal sempre apoiou, sem hesitações, o processo de alargamento da União Europeia.
Sempre defendemos o alargamento em todas as instâncias da União, por coerência e solidariedade, porque reconhecemos, pela nossa própria experiência, a importância decisiva que esse processo acarretará em termos de consolidação democrática e de modernização económica das novas democracias europeias, porque o consideramos um passo essencial para garantir a paz e a estabilidade no continente.
Tudo isto me parece de uma clareza linear.
A questão que se me afigura mais complexa, neste momento de encruzilhada em que a Europa joga, de algum modo, o seu futuro, é saber que União Europeia pretendemos.
Tenho para mim que queremos uma União que preserve a sua natureza essencial de associação de Estados soberanos, vinculados por interesses comuns, uma comunidade de iguais assente na solidariedade e na coesão, na perspectiva de uma convergência efectiva das suas economias.
Queremos uma União cujas fronteiras coincidam com as fronteiras da democracia na Europa, uma União com instituições mais fortes e uma maior participação dos cidadãos na construção europeia, uma comunidade de direito e de direitos.
Queremos uma União aberta ao exterior, com condições efectivas de acção internacional, que assuma a vocação universalista dos europeus, atenta ao agravamento dos desequilíbrios e desigualdades, intransigente na defesa dos primado do direito internacional e dos direitos fundamentais da pessoa humana.
Com estes objectivos em vista, queria propor-vos três temas de reflexão sobre o que considero como dimensões essenciais do projecto europeu, indispensáveis, quanto a mim, para garantir a adesão dos cidadãos e o continuado sucesso da construção europeia:
1. A Europa tem de ser um espaço de progresso económico e social crescente, tendendo para uma convergência real das economias e do nível de vida das regiões que a compõem.
2. A Europa tem de ser um espaço de paz e de segurança, gerador de estabilidade nas regiões que lhe estão adjacentes.
3. A Europa tem de aprofundar constantemente o seu processo integrador, sob pena de perder o seu sentido último.
Pegando no primeiro tema - o progresso económico e social - creio que nos devemos todos regozijar com o facto de a União ter cumprido com rigor o calendário da União Económica e Monetária e garantido a participação da maior parte dos seus Estados-membros na criação da moeda única, instrumento indispensável de competição económica internacional.
No entanto, a moeda única não poderá circunscrever-se a esta função; a integração económica e monetária não pode ser um processo cego, dirigido exclusivamente pelos mecanismos de mercado; a moeda única tem de ser uma alavanca de progresso, de progresso económico e social, de progresso político da Europa.
A construção europeia exige não apenas consumidores, mas sobretudo cidadãos.
Uma questão é a convergência nominal das economias europeias, outra é a sua convergência real.
Existem conhecidas diferenças entre os níveis de prosperidade dos actuais Estados-membros e fortes assimetrias de desenvolvimento dentro da maioria destes, a que se acrescentam problemas de exclusão e de marginalização sérios na totalidade desses mesmo Estados.
Existem diferenças significativas entre sistemas educativos e de formação profissional, entre sistemas de emprego, entre níveis de informação e de participação dos trabalhadores nas decisões empresariais, entre graus e modalidades de protecção social.
É também evidente que o modelo social europeu está a atravessar uma crise de mutação, atingindo todos os Estados da União Europeia, embora, naturalmente, em fases diferentes. Esta crise, que é europeia, exige estratégias de reforma nacionais, sem dúvida, mas, sobretudo, respostas conjuntas.
Se a diferença entre as opções nacionais em matéria de protecção social e de regulação do mercado de trabalho se acentuarem, não só será impossível responder a este desafio, como teremos introduzido um factor adicional de tensão entre os Estados-membros, ou seja, dentro da própria União.
Dispomos de uma ocasião única para completar o processo de unificação monetária com o desenvolvimento de uma política económica coordenada, convergente, capaz de transformar a moeda única numa alavanca de modernização económica e social da Europa.
A União Económica e Monetária tem de se construir de forma estável e tranquila, tem de ser compatibilizada constantemente com a realidade social, constituir um verdadeiro factor de progresso, garantindo que os benefícios decorrentes da moeda única venham a ser partilhados, de forma equitativa, por todos os Estados-membros.
Para que isto aconteça, será essencial reforçar o princípio da coesão, preservá-lo no centro das políticas comunitárias, por forma a permitir a aproximação dos níveis de vida entre as diversas regiões da Europa, corrigindo as assimetrias, garantindo o progresso constante e harmonioso do espaço europeu no seu conjunto.
A UEM exigirá, assim, meios, e meios importantes, nomeadamente orçamentais.
É esta uma questão central que se discute presentemente no quadro da chamada “Agenda 2000”, na sua vertente de perspectivas financeiras a vigorarem entre 2000 e 2006.
Tendo em conta a indisponibilidade da maioria dos Estados-membros para aumentar o actual tecto de recursos próprios da União, surgem interrogações legítimas sobre se existirão condições para a concretização de um espaço alargado de articulação político-económica entre um conjunto tão heterogéneo de países e que seja susceptível de garantir, simultâneamente, o aprofundamento de um corpo de políticas comuns que mantenha esses Estados num curso de integração tendencialmente convergente.
Gostaria, relativamente a esta questão, que ficasse claro que as negociações sobre a “Agenda 2000”, nas quais Portugal tem vindo a lutar por uma revisão que garanta a sua maior equidade, terão de ficar concluídas até ao final de 1999, não tendo, assim, a menor influência no calendário do processo de alargamento.
A contabilidade não é tudo, e não substitui, obviamente, uma visão e um desígnio político.
Mas mesmo numa perspectiva puramente contabilística, se se fizerem seriamente as contas da política regional suportada pelos fundos estruturais, verificar-se-á que aqueles fluxos financeiros não são unívocos, e que os financiamentos aos países menos desenvolvidos beneficiam também as economias europeias mais prósperas
Não tenhamos ilusões.
Se a Europa não for capaz de ser solidária, se não trabalhar constantemente para permitir a convergência, pelo menos tendencial, das economias que a compõem, será o próprio processo de integração que estará em causa, e, muito provavelmente, a própria União.
O desígnio político tem de continuar a existir, baseado na solidariedade, no progresso e na paz.
O desejo de paz, a garantia da paz, as condições da segurança europeia permitem-me passar para o segundo tema que vos proponho.
Garantir a paz entre os Estados da Europa, num quadro de consolidação das democracias, constituiu, sem dúvida, a primeira razão de ser do projecto europeu.
Tornar impensável a guerra foi, e continuará a ser, para todos nós, o propósito constante.
Vivemos mais de quarenta anos num quadro de paz armada, numa Europa dividida, sujeita a uma lógica bipolar que nos foi, em grande medida, imposta.
Esse quadro alterou-se profundamente.
Transformaram-se radicalmente os equilíbrios estratégicos e os termos de referência das relações internacionais.
De um dia para o outro surgiu uma grande vaga de esperança na paz enfim conseguida pelo milagre do reencontro da “outra” Europa com a democracia.
No entanto, o trágico conflito na ex-Jugoslávia cedo nos obrigou a tomar consciência de outras ameaças, assim como das limitações de um sistema de segurança baseado em premissas que tinham deixado de ser pertinentes.
Acordámos subitamente para a ressurgência de velhos problemas de fronteiras, de minorias e de refugiados, para a força crescente de tendências nacionalistas violentas e de movimentos separatistas, para a multiplicação de factores de tensão e de conflito na nossa própria casa.
Fomos apanhados desprevenidos e com estruturas e mecanismos largamente impreparados para responder a estas novas situações.
Aprendemos certamente com estas trágicas experiências, mas teremos tirado delas todas as consequências, em termos de comportamentos futuros ?
Para assegurar a paz e a segurança no nosso continente, a Europa tem de assumir responsabilidades acrescidas na defesa dos seus interesses comuns, reforçando a paz e a estabilidade internacionais, antecipando riscos e agindo preventivamente.
A Aliança Atlântica soube adaptar a sua filosofia, a sua doutrina e as suas estruturas ao novo mapa da Europa e aos novos equilíbrios surgidos do final da guerra fria; continua a desempenhar um papel decisivo como garante da estabilidade regional e pode confirmar a sua posição indispensável na arquitectura de segurança europeia; conseguiu articular eficazmente um processo de alargamento gradual às democracias da Europa central com a conclusão de acordos bilaterais com a Rússia e com a Ucrânia e a criação do Conselho de Parceria Euro-Atlântico
Mas é indispensável desenvolver a Identidade Europeia de Defesa e de Segurança, que constitui um factor indispensável e acrescido de estabilidade, de reforço da cooperação europeia, de institucionalização dos novos equilíbrios da nossa relação com os nossos aliados norte-americanos e canadianos.
Que papel, que competências, que funções específicas deverá assumir a UEO, num cenário de progressivo alargamento da União Europeia e da NATO ?
A OSCE e o Conselho da Europa constituem também estruturas essenciais para “organizar” a nova Europa, para criar esferas de integração diferenciadas, evitando a marginalização de Estados cuja presença e acção são indispensáveis para a estabilidade e a segurança do continente. Assumem um papel particularmente destacado em matéria de direitos humanos, na prática e na pedagogia da democracia e do Estado de Direito.
O problema das organizações que existem no espaço europeu não é o seu número, mas a necessidade de uma articulação eficaz entre elas, que evite redundâncias e sobreposições e que respeite a especificidade de cada uma.
A importância do relacionamento com a Rússia e a Ucrânia obriga a que devamos reforçar uma abordagem comum neste domínio, consolidando um clima de confiança recíproco e mecanismos de cooperação que permitam um relacionamento estável e sem tensões.
De igual modo, é indispensável que a União Europeia alargada solidifique uma abordagem comum e coerente face à instabilidade balcânica, por forma a se constituir como um elemento central para a estabilidade daquela região.
Em suma, como me dizia recentemente uma destacada figura política europeia, “ é preciso mais Europa”.
A estabilidade dos nossos vizinhos, o seu desenvolvimento económico e social, interessam-nos directamente; a sua instabilidade repercute-se na nossa própria segurança, as suas carências avolumam tensões no espaço europeu.
Isto é válido quer em relação aos nossos vizinhos do Leste, como em relação ao Sul, ao Mediterrâneo, não podendo ser o processo de Barcelona um projecto cujo conteúdo se vai esvaziando paulatinamente, ao sabor das conjunturas.
A tragédia argelina ilustra dramaticamente a necessidade de estendermos uma solidariedade efectiva a todos os nossos parceiros mediterrânicos.
Precisamos de uma doutrina eficaz de “vizinhança solidária” , bem entendida e totalmente assumida.
Precisamos também de valorizar constantemente o primado do direito internacional e a defesa dos direitos humanos, que constituem um marco fundamental na definição da identidade internacional da União Europeia e da Europa.
Precisamos manter aberta uma perspectiva europeia para os países cuja integração nas estruturas institucionais da Europa se efectuará necessariamente de uma forma mais dilatada, para garantir o rumo das reformas, para congregar a adesão dos cidadãos, para evitar frustrações e desilusões, geradoras de instabilidade e de tensão.
Permitam-se que conte uma pequena história ocorrida aquando da minha visita à Ucrânia em Abril passado, que ilustra bem o que acabo de dizer. Durante a conferência de imprensa que se seguiu às conversações entre as delegações ucraniana e portuguesa, o correspondente em Lisboa de um importante jornal londrino, que acompanhava a minha visita, perguntou ao Presidente Kuchma que mensagem gostaria de transmitir aos países da União Europeia.
O Presidente da Ucrânia respondeu, com uma dramática singeleza: “ que somos europeus ” !
O desenvolvimento da uma política externa europeia terá, pela força das coisas, um desenvolvimento lento. Daí a necessidade de um empenho persistente de todos para a fazer avançar.
Mas da prossecução deste desígnio depende a própria credibilidade do projecto europeu, um projecto que tem de garantir a paz no seu próprio espaço, mas que tem também de ser gerador de segurança e de estabilidade nas regiões que lhe são adjacentes.
O último tema que gostaria de referir tem a ver com o aprofundamento do processo de integração europeia, sobretudo tendo em conta o enorme salto qualitativo operado pela criação da moeda única e as consequências do alargamento em termos de reformas institucionais.
Trata-se de uma questão que nos interessa a todos, presentes e futuros Estados-membros da União Europeia.
É um tema que abarca o reforço da integração política da União, a reforma institucional, a legitimidade democrática das instituições, a criação de uma verdadeira opinião pública europeia, o exercício efectivo da cidadania, a valorização da tão rica diversidade cultural dos povos da Europa.
Tenho para mim claro que temos de caminhar para uma Europa política, prosseguindo o trajecto lógico que nos conduziu primeiro à integração económica e depois à monetária.
Pouco se tem avançado neste domínio. Creio que existe um défice de ideias novas, de reflexões inovadoras que apontem pistas realistas para a criação de uma Europa política, mais coesa e mais solidária, capaz de fazer face, com eficácia, ao conjunto de desafios que se colocam à construção europeia.
A União Económica e Monetária, para poder vingar, exige um grau muito mais elevado de cooperação política entre os Estados que a integram, consentânea com a partilha de soberania que ela própria encerra.
A Europa não se pode consumir num debate sobre a sua organização, e parece-me indispensável esclarecer as falácias que se instalaram num debate que confunde modelos federais com “super-Estados”.
É para todos óbvio que uma expansão da União tem de conduzir a um repensar das instituições.
Temos consciência de que este debate constitui um elemento de tensão permanente dentro da União e abarca questões - e perspectivas diferentes - sobre a legitimidade e responsabilidade das instituições, o equilíbrio interinstitucional, o modo como a diferenciada realidade que são os Estados-membros se deve projectar no processo de decisão e controlo.
São questões que, para além de afectarem interesses próprios que cada Estado tem legitimamente que defender, assumem uma dimensão simbólica incontornável, que não concede, nesta fase da vida da União e no quadro em que o debate se coloca presentemente, grande espaço de manobra às instâncias nacionais.
Creio que a experiência da última Conferência Intergovernamental terá demonstrado cabalmente este problema.
Pergunto-me se o actual formato destas conferências não se encontrará já esgotado e se, face à magnitude das questões a resolver, não deveríamos avançar, com coragem, para um processo de reforma institucional muito mais profundo, que envolva obviamente todos os Governos dos Estados-membros, mas também os Parlamentos Nacionais.
Não se aproximará o momento de cortar com as tentativas de reformas gradualistas e de colocar, com franqueza, a questão do próprio formato futuro da União ?
Independentemente da metodologia e do quadro global de uma futura discussão sobre estas matérias, considero que qualquer reforma institucional deverá preservar o princípio da igualdade entre os Estados, trave-mestra do modelo original que é a União Europeia.
Qualquer reforma institucional tem igualmente de reforçar a transparência democrática e a legitimidade e responsabilidade das instituições.
Qualquer reforma institucional tem de garantir a manutenção das condições de coesão no conjunto da União.
Mas tenho para mim que qualquer reforma só será também viável se se traduzir no fortalecimento de cada um dos Estados-membros, garantindo a cada uma uma adequada representação e uma possibilidade eficaz para defender os seus interesses legítimos, justificando, assim, uma partilha colectiva totalmente assumida das respectivas soberanias.
O que me parece necessário serão, porventura, outras formas e outros modelos de representação dos Estados, que garantam que nenhum será subalternizado, que respeitem o princípio essencial da igualdade entre eles, independentemente da sua força económica ou da sua expressão populacional, que se reflectem já, de forma equilibrada, no actual processo decisório.
A experiência constitucional de outros espaços que conheceram experiências históricas de integração económica e política poderá revelar-se, nesta matéria, de alguma utilidade.
Teorias em voga há alguns meses atrás sobre “círculos concêntricos” ou “núcleos duros”, não contribuem certamente de forma útil para este debate, antes criam divisões desnecessárias e podem provocar fracturas irreversíveis.
Mais do que nunca nos últimos anos, tem de ser reafirmada claramente a natureza política e a importância estratégica da construção europeia. A Europa tem de avançar, de uma forma realista mas determinada, para uma união política.
Só assim poderemos definir com clareza o significado do projecto europeu, tão frequentemente submerso em debates irrelevantes.
A prossecução deste projecto exige a participação activa dos cidadãos, valorizando a solidariedade que a todos deve beneficiar, fazendo com que sintam a Europa como um espaço de realização pessoal.
Se assim não for, a cidadania europeia não passará de uma intenção bondosa.
Concluiria como comecei: o projecto europeu terá de sempre um projecto político, baseado em valores e em princípios, um projecto que visa garantir a paz e a estabilidade e uma maior prosperidade económica e social para os europeus.
Trata-se de um desígnio fundamental para os séculos futuros, que a todos nós respeita e no qual teremos todos de nos empenhar
Muito obrigado pela vossa atenção e estou à vossa disposição para quaisquer perguntas que me desejarem colocar.