Encerramento do Congresso Histórico Cultural

Barcelos
24 de Outubro de 1998


Aceitei com muito gosto o convite para presidir a esta sessão de encerramento do Congresso Histórico e Cultural de Barcelos. Desta forma me associo, honrosamente, às Comemorações do 7º centenário da criação do condado de Barcelos.

Quero felicitar Barcelos e todos os barcelenses pela ocasião, e agradecer à Câmara Municipal, e em especial ao seu presidente, a simpatia do convite e do acolhimento que uma vez mais me dispensou.

Devo igualmente felicitar todos os participantes no Congresso. Pude constatar, através do programa de trabalhos, a diversidade de perspectivas e de temas, a qualificação dos comunicantes, em suma, o interesse suscitado pelo Congresso de Barcelos entre a comunidade de investigadores. permitam-me que felicite os congressistas que enriquecem esta iniciativa com o seu contributo profissional e a sua competência cientifica, dirigindo-me de forma especial ao professor António Hespanha, cuja brilhante lição acabo de ouvir.

Acredito que o tipo de Congressos Históricos, a que a passagem do 7º Centenário de Barcelos enquanto vila condal deu lugar, seja importante para preencher lacunas, actualizar e até corrigir alguns elementos em que se baseia o discurso que se alimenta da história e que é veiculado pelas instituições culturais, como os museus, as publicações, a evocação e até a preservação patrimonial.

Atrevo-me a sublinhar este aspecto, junto de um auditório como o deste Congresso. A política de preservação e valorização do património deve atender a essa permanente actualização de conhecimentos que a história possibilita, e deverá até estimulá-la.

Barcelos orgulha-se justificadamente das suas origens medievais, onde se cruzam caminhos pelos quais passou a formação de Portugal como unidade política independente. Não é orgulho passadista.

Não creio que exista contradição entre a afirmação crescente da dimensão internacional de Portugal e a valorização das suas criações mais genuínas e identitárias (porque é disso que se trata quando falamos de património). os outros, aqueles com quem partilhamos interesses e responsabilidades num mundo global, olham-nos com tanto mais curiosidade e respeito quanto mais expressiva lhes surgir a vitalidade da nossa cultura.

A nossa história apresenta momentos de abertura ao exterior, em contraste com outros em que dominou um isolacionismo mais estreito. Mas não nos iludamos: ninguém existe fechado sobre si próprio, toda a civilização implica uma certa globalização, trocas e contactos. Os nacionalismos que rejeitam ideologicamente a abertura ao exterior são os próprios a praticá-la de forma discreta ou camuflada.

Devo pois exaltar as coisas portuguesas, apoiar de forma decidida as acções de preservação, sem esquecer as novas criações, e estimular as iniciativas que mobilizem competências e meios para essa preservação e valorização.

Barcelos constituirá em muitos domínios um exemplo e um arsenal de experiência. O seu património, onde se incluem algumas das peças mais significativas da história das artes portuguesas, tem merecido um grande esforço por parte das entidades responsáveis, nomeadamente municipais.

Barcelos é também um exemplo de como a polarização de funções regionais que exerce - bem patente na realização, aliás famosa em todo o país, que é a sua feira semanal -, pode ter uma referência histórica autorizada. Cidade histórica, ostentando com orgulho as marcas patrimoniais de um passado, é também uma cidade moderna, aceitando desenvolver as funções e inserir-se na malha das relações das cidades modernas.

Minhas Senhoras e meus Senhores

A capacidade de evolução das cidades é um recurso indispensável do Portugal moderno, a que temos de prestar ainda mais atenção se quisermos continuar a modernizar e a reformar as estruturas de coordenação e ordenamento do espaço nacional.

As cidades são elementos decisivos de organização de territórios. Com as suas complementaridades e redes, não podem deixar de formar o eixo estruturante de uma grande mudança para uma nova administração e uma nova visão do conjunto do território nacional.

Uma política da cidade, se me posso exprimir assim, é uma prioridade. Será uma política integrada, certamente, para a qual confluem instâncias centrais e locais, públicas e privadas. Será também uma política onde se articulam intervenções de tipo administrativo ou urbanístico, com preocupações de eficácia no plano cultural, social e económico. E a este respeito, gostaria ainda de me referir a um outro tópico da maior importância.

A capacidade de atracção das cidades sobre a população jovem é a razão da sua vitalidade. Se queremos cidades que estruturem de forma equilibrada o território nacional, elas têm de oferecer oportunidades, e oportunidades de qualidade, aos nossos jovens. Falo da escola, evidentemente, mas falo também de todo um conjunto de equipamentos colectivos que respondam às exigências dos jovens, do desporto à cultura, da aprendizagem e das formações profissionais aos contactos com o exterior. Falo de uma atitude mais favorável à integração da juventude nos diversos níveis de participação e decisão das comunidades.

É este apelo que quero deixar em Barcelos, terra muito antiga onde todos os dias se procura compatibilizar o respeito pela história com as necessidades do futuro. É um apelo, uma preocupação dirigida à abertura às novas gerações. Quando nos dirigimos às novas gerações, em nome da solidariedade, quase nos esquecemos de acentuar que o fluxo solidário tem de correr nos dois sentidos: dos mais novos para os mais velhos e destes para os mais novos.

É dessa abertura que temos de cuidar com mais intensidade e desvelo. A sociedade portuguesa precisa do contributo dos mais novos, da sua participação a todos os níveis: na política e nas empresas, na ciência e na cultura, na criação em geral.

Minhas Senhoras e meus Senhores

Inicia-se amanhã formalmente a campanha eleitoral para o referendo sobre a regionalização. Trata-se de um referendo obrigatório, nos termos da própria Constituição.

Cabe-nos a todos, órgãos do poder político e intervenientes no debate contraditório, criar as melhores condições para uma decisão sobre a matéria.

Os cidadãos são chamados a exprimir a sua opinião através do voto. O voto, além de permitir clarificar a vontade dos portugueses, reforça a própria democracia. Votar, num referendo, constitui uma forma de afirmar uma vontade de participação, com respeito das regras que a Assembleia lhe definiu. Do comportamento do eleitorado saberemos tirar todas as consequências.

Tenho a expectativa de que o referendo constitua mais uma mobilizadora oportunidade para a democracia portuguesa.

Soubemos constituir um sistema democrático que tem assegurado a estabilidade e o equilíbrio políticos. Não se ignora que há aspectos menos sólidos da nossa democracia. É necessário proceder a adaptações que garantam não apenas a representação como a transparência da vida política. O combate ás fragilidades do sistema não pode nunca ser descurado, é um combate permanente, pela credibilização das instituições e dos partidos, e pela consolidação de uma opinião pública atenta e informada.

É neste exacto sentido que tenho apelado à participação cívica e ao diálogo institucional. Confio na democracia portuguesa, nos partidos e nos responsáveis políticos. Recuso qualquer visão apocalíptica da vida política nacional, mesmo quando, e sobretudo quando, vejo razões para propôr um novo combate às dificuldades e problemas que evidentemente existem.

Creio aliás que esse combate, pondo à prova o funcionamento e a capacidade de prevenir e de responder a novas situações, só pode revigorar as instituições e as práticas da democracia.

Estou empenhado neste combate. Vejo idêntico empenhamento em todas as instituições da democracia portuguesa. Serenamente sem desfalecimentos, mas também sem precipitações, sublinho, sem precipitações, saberemos encontrar as respostas oportunas que fortaleçam o Estado Democrático e o nexo de confiança entre os cidadãos e as instituições.