Discurso do Presidente da República por ocasião da Sessão de Encerramento do Seminário Económico

Moscovo
26 de Outubro de 2001


Senhores membros dos Governos russo e português
Senhores empresários

Começo por agradecer a todos - e, muito em particular, aos empresários russos - a vossa presença neste Seminário.

Nas minhas Visitas de Estado ao estrangeiro tenho sempre como objectivo promover a cooperação económica entre Portugal e o país visitado, como sucedeu neste caso e não podia ter deixado de ser, dado o muito que há para fazer nesta área - eu diria quase tudo - entre Portugal e a Rússia. Para o efeito, fiz-me acompanhar por uma delegação que inclui o Senhor Ministro da Economia, o Senhor Presidente do ICEP Portugal - Investimentos, Comércio e Turismo e um significativo número de grandes empresários portugueses de diversos sectores de actividade.

Os empresários portugueses e russos que participaram neste Seminário tiveram aqui uma oportunidade para se conhecerem melhor e para começarem a explorar, ou continuarem a aprofundar, relações que desejo possam originar, num futuro próximo, mais comércio e mais investimento entre Portugal e a Rússia.

Por razões históricas conhecidas, Portugal e a Rússia seguiram, durante grande parte do século XX, caminhos diferentes dos trilhados pela maioria dos países da Europa ocidental, mas agora perfilham ambos o modelo europeu assente na democracia pluralista, no Estado de direito e na economia de mercado, Portugal como Estado-membro e a Rússia como importante parceiro da União Europeia.

Portugal, em Abril de 1974, reconquistou a liberdade e a democracia e iniciou um processo que culminou com a sua integração plena na União Europeia em 1986. Graças ao estímulo e à ajuda comunitária e, sobretudo, ao trabalho dos portugueses - e aqui permito-me destacar o esforço dos empresários -, a economia portuguesa progrediu bastante nos últimos anos. Naturalmente, como qualquer economia, também tem fragilidades a corrigir e dificuldades a vencer, mas é hoje uma economia moderna, em rápida internacionalização e com um conjunto de empresários dinâmicos e experientes - e os que aqui estão são apenas uma pequena amostra - que lideram empresas que comparam internacionalmente bem com as melhores nos seus sectores de actividade.

A Rússia, depois do colapso da União Soviética em 1989, seguiu - e bem - uma via de abertura ao exterior e de reformas económicas e políticas, visando a transição para uma economia de mercado democrática. Nessa caminhada difícil já fez progressos muito significativos, mas ainda há bastante por fazer, designadamente nas áreas do comércio externo e do investimento estrangeiro que aqui nos interessam, para poder aproveitar bem o seu enorme potencial económico. De facto, os níveis de comércio externo e de investimento estrangeiro per capita na Rússia são menores do que noutras economias em transição e podem, certamente, ser aumentados.

Os empresários russos e portugueses que aqui estão conhecem tão bem ou melhor do que eu as potencialidades e as fraquezas da economia russa. Entre as primeiras, refiro a existência de uma população com uma grande formação de base e a riqueza em matérias primas, nomeadamente petróleo e gás natural, mas também a estabilidade política e o bom crescimento económico desde a crise de 1998, embora este ano menor do que nos anteriores, mas isso acontece um pouco por toda a parte. Entre as segundas, deixo de parte a dificuldade da língua e a dependência dos preços internacionais das matérias primas e saliento, fundamentalmente, a necessidade de apressar reformas económicas, de renovar o aparelho produtivo e de adaptar o quadro legal e institucional da Rússia às exigências da economia moderna.

Actualmente, não há mais lugar para mercados protegidos, pois o progresso económico requer a abertura e a exposição à concorrência internacional.

Uma economia moderna precisa de empresas capazes de conquistar mercados externos, de se implantarem no exterior e de estabelecerem formas de cooperação flexíveis e diversificadas com empresas estrangeiras. Porém, para que isto aconteça, são precisas regras aceitáveis e claras e correctamente aplicadas, para que haja a segurança económica indispensável ao desenvolvimento das relações económicas internacionais.

As relações políticas e económicas entre a União Europeia e a Rússia, actualmente enquadradas pelo Acordo de Parceria e Cooperação assinado em 1994 e em vigor desde 1997, registaram um grande desenvolvimento na última década. A Rússia é, presentemente, o sexto maior parceiro económico da União Europeia, representando 3,3% nas importações comunitárias e 1,9% nas exportações dos Quinze. Por sua vez, a União Europeia é o principal parceiro comercial da Rússia, com cerca de um terço das suas importações e exportações, participação que aumentará substancialmente depois do alargamento a leste da União Europeia.

Em nítido contraste com a situação do comércio externo, o investimento directo estrangeiro na Rússia tem registado valores muito modestos, atendendo às necessidades da economia russa e às potencialidades da economia europeia. Tal deve-se, em grande parte, a um certo clima de incerteza, prejudicial à atracção de investimento estrangeiro, à existência de poucos incentivos e até a limitações impostas pela legislação russa em alguns sectores, como por exemplo na banca e nos seguros.

Por sua vez, as relações económicas entre Portugal e a Rússia, em termos relativos, ainda são mais reduzidas do que entre esta e a União Europeia. De facto, por razões históricas, geográficas e outras, o comércio externo entre os nossos dois países é limitado e o investimento directo estrangeiro é praticamente inexistente.

Nestas circunstâncias, gostaria de lançar um duplo desafio aos empresários que aqui estão: aos empresários portugueses para tentarem penetrar e vender mais no mercado russo e aos empresários russos para preferirem e comprarem mais produtos e serviços portugueses. De facto, para além dos produtos tradicionais, como a cortiça e o calçado, que já vendemos para a Rússia e que desejamos exportar mais, há uma vasta gama de bens e serviços, alguns deles representados pelos empresários portugueses aqui presentes, onde a economia portuguesa tem uma excelente relação qualidade-preço e o mercado russo tem potencialidades importantes. São os casos, por exemplo, dos vinhos, dos materiais de construção, dos cabos, da madeira, dos moldes, do software, dos serviços financeiros e, como é evidente, do turismo. Relativamente a este último, está em negociação um acordo entre Portugal e a Rússia, visando o desenvolvimento da formação profissional, a realização de infra-estruturas e o aumento dos fluxos turísticos entre Portugal e a Rússia.

Relativamente ao investimento directo, tanto de Portugal na Rússia como da Rússia em Portugal, também espero que tenham sido detectadas oportunidades e que se realizem progressos. Seria, contudo, desejável que se concluísse o Acordo de Promoção e Protecção Mútua de Investimentos, que vem sendo discutido entre Portugal e a Rússia e sem o qual dificilmente se pode esperar grande expansão do investimento português na Rússia.

Tendo em conta a condicionante risco, uma forma de partilhar e, portanto, de reduzir os riscos seria a constituição de parcerias entre empresas portuguesas e russas, em alguns casos também com o possível envolvimento do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento, para explorar oportunidades de negócio, tanto na Rússia ou em Portugal, como em terceiros países. Seria uma forma interessante de aproveitar experiências e capacidades complementares dos empresários portugueses e russos.

Como sabem, há um crescente interesse e compreensão recíproca entre a Rússia e Portugal, nomeadamente no âmbito do Acordo de Parceria e Cooperação e da Estratégia Comum da União Europeia relativamente à Rússia, e, neste contexto, quero registar como muito positiva a Cimeira União Europeia-Rússia que teve lugar, em Bruxelas, no passado dia 3 do corrente mês, onde, entre outros aspectos, continuaram a ser dados passos para eliminar obstáculos ao comércio e ao investimento, para ajudar a preparar a adesão da Rússia à Organização Mundial de Comércio e para ir criando o futuro espaço económico europeu comum.

Antes de terminar e lembrando a introdução física da moeda única europeia no dia 1 de Janeiro de 2002, gostaria ainda de salientar que o euro já é a moeda de Portugal desde o início de 1999 e que é desejável, e mutuamente vantajoso, que as relações económicas entre os nossos países se realizem cada vez mais na moeda única europeia. A utilização do euro como moeda de facturação e de liquidação do comércio externo num mercado tão vasto como a Zona Euro e a Rússia reduz significativamente a flutuação e o risco cambial para as empresas russas.
Por esta e outras razões, nomeadamente para que a moeda única europeia vá ganhando quota de mercado relativamente ao dólar, espero e desejo que o euro também seja a moeda de escolha da Rússia nos nossas relações comerciais, económicas e financeiras.

Termino de forma semelhante à que comecei, saudando e agradecendo a presença de todos os participantes e fazendo votos para que deste encontro resulte um melhor conhecimento recíproco e um reforço da cooperação económica e comercial, contribuindo assim para o progresso dos nossos povos e para a criação de um espaço económico europeu comum mais integrado e mais próspero.