Mensagem de Ano Novo

01 de Janeiro 2000



Ao longo de mais de cinco séculos, Portugal descobriu e colonizou vastos territórios espalhados por vários continentes.

Com o 25 de Abril, Portugal reconhece, apesar de tardiamente, o direito dos povos à autodeterminação, juntando-se, assim, ao grande movimento civilizacional do pós segunda Guerra Mundial que conduziu ao fim dos Impérios Coloniais.

Esse processo só agora se concluiu com a cerimónia de transferência de poderes em Macau e o histórico referendo em Timor Leste, Portugal renova-se como litoral do ocidente europeu e mergulha no Atlântico através dos Açores e da Madeira.

Encerramos um capítulo da nossa história que durou mais de metade do milénio que, por um consenso já feito mesmo que discutível, agora vai terminar.

Dessa história ficou um património riquíssimo, com uma forma própria de estar no Mundo, de ser capaz de compreender a sua diversidade cultural e de conviver com todos os povos, como bem atestam as inúmeras Comunidades Portuguesas, das quais temos fundadas razões para nos orgulhar.

A par disso, que por si só encerra já uma importante dimensão civilizacional que nos projecta no Mundo, Portugal fecha este ciclo da sua história como parte integrante de duas importantíssimas Comunidades de países: a União Europeia e a Comunidade de Países de Língua Portuguesa.

Portugal soube reencontrar o seu lugar na Europa. Mas soube também manter e desenvolver a sua ligação histórica com África, agora num plano de igualdade entre Estados soberanos e independentes.

Somos hoje uma Nação prestigiada pela dimensão da sua história, pela riqueza do seu povo, mas também pela forma eficaz com que temos sido capazes de assumir as nossas responsabilidades na Comunidade Internacional.

Símbolo disso mesmo é assumirmos agora a Presidência da União Europeia, quando tanto nela se joga na promoção do factor social e no próprio desenho das suas actuais fronteiras.

Importa, por isso, que o nosso desenvolvimento tenha condições de sustentação que nos permitam encarar reveses e circunstâncias conjunturais. Só assim, Portugal pode continuar o seu caminho de progresso e ultrapassar os problemas que subsistem e as desigualdades, quer territoriais quer sociais, que importa corrigir.

No plano nacional é importante vivificar o debate sobre as opções que se nos colocam e garantir que as decisões de que depende o nosso futuro são tomadas a tempo e partilhadas pelos portugueses. A evolução das sociedades contemporâneas impõe esse debate permanente e uma grande exigência e rigor na gestão das opções e na aplicação dos recursos.

No plano pessoal, os portugueses devem também saber olhar para o seu futuro. Infelizmente, as sociedades caracterizam-se hoje pela incerteza e pela precariedade. Criou-se uma cultura, quase uma ideologia, do consumo. A fronteira entre essencial e o sumptuário parece cada vez mais ténue.

Mas temos hoje condições de aceder à informação necessária que permita fazer as escolhas mais correctas para o país ou para as nossas vidas pessoais. O que é importante é que essas opções assentem em critérios claros e em princípios sólidos capazes de assegurar um desenvolvimento sustentado para Portugal e uma vida equilibrada para os portugueses.

Faço votos para que este simbólico ano 2000 traga aos portugueses - onde quer que se encontrem - toda a felicidade possível. O País tem excelentes condições para continuar a prosperar e com isso melhorar a situação de muitos daqueles que ainda vivem com grandes carências. É possível, que este ano traga para todos mais equidade e justiça social, mais solidariedade. E, se é possível, então é desejável e é necessário.

Faço votos de felicidade, progresso e paz para todos os povos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Permito-me três palavras em particular: uma, para as Forças Armadas portuguesas que, no país e no estrangeiro, afirmam o estatuto e a imagem de Portugal no mundo. Outra para o povo de Timor Leste ao qual em breve transmitirei pessoalmente a esperança - que sei ser a de todos os portugueses - de uma recuperação tão rápida quanto possível da imensa destruição causada no país durante os dramáticos acontecimentos que se seguiram ao referendo; finalmente outra, para o povo angolano, a quem faço votos que este ano represente o regresso da paz e, com ela, o desenvolvimento, o progresso e a possibilidade de, enfim, olhar o futuro sem medo.


Aos portugueses, a todos os portugueses, os meus sinceros votos de um Bom Ano.


Jorge Sampaio