VIII Cimeira Ibero-America - Discurso de Abertura VIII Cimeira Ibero-Americana 

Discurso de Abertura
 
 
 

Desejo-vos calorosamente as boas-vindas a Portugal, na certeza de que este nosso encontro constituirá uma nova e importante oportunidade para reafirmarmos a solidariedade que nos une, projectando-a de uma forma mais eficaz na cena internacional.

É para nós uma grande honra acolhermos a VIIIª Cimeira Ibero-Americana e creio que existe uma legítima expectativa quanto aos nossos trabalhos, tendo em conta a relevância particular do tema que vamos discutir.

Quando propus, na Ilha Margarita, em nome de Portugal, o tema da cimeira que aqui nos reúne, fi-lo na certeza de que a nossa discussão teria um ponto de partida muito actual; mas não podia naturalmente prever que ela estivesse, de uma forma tão brutal, na ordem do dia de hoje, por via da situação de grande instabilidade financeira que vivemos à escala mundial e das crises preocupantes que afectam várias regiões do Globo.

Não creio necessário descrever uma realidade que a todos afecta, embora, naturalmente, com consequências variáveis consoante os países.

Nos tempos que vivemos, a turbulência gerada numa zona facilmente se propaga a todo o mundo, ampliando, muitas vezes, os seus efeitos neste processo de transmissão.

Mas temos necessariamente de ter uma visão positiva e construtiva do nosso tempo. A época em que vivemos é caracterizada pela mundialização dos desafios e dos problemas, mas deverá sê-lo também das oportunidades e das soluções.

A construção do mundo global tem de ser norteada, cada vez mais, por formas solidárias de relacionamento entre os Estados, estruturando a sua interdependência.

E o processo de globalização tem evidentemente de respeitar os valores comuns que defendemos da democracia, do desenvolvimento sustentado, da coesão social e da solidariedade.

É uma responsabilidade política que não podemos enjeitar.

São necessárias respostas novas, audazes e imaginativas.

Reconhecer a realidade de um mundo global em construção não significa, porém, aceitar de forma passiva todos os seus efeitos, ou pactuar com a pressão que estes exercem sobre as nossas sociedades, constituindo tantas vezes um factor de agravamento de desigualdades e de alargamento da exclusão social.

Permitam-me que o repita: temos de assumir a globalização como fenómeno do nosso tempo, mas ao mesmo tempo actuar de forma a que ela não ponha em causa os valores da democracia, da solidariedade e de coesão social em que firmemente acreditamos.

No contexto em que vivemos parece-me indispensável valorizar três aspectos, que são, para mim essenciais no quadro de uma ``actuação positiva'' face à globalização.

Em primeiro lugar, é preciso estabelecer regras mínimas de conduta no que respeita aos grandes fluxos mundiais relacionados com a actividade económica e financeira.

Em segundo lugar, é preciso avançar no reforço e aprofundamento dos processos de integração, assim como na cooperação acrescida entre os diferentes espaços regionais.

Por último, parece-me fundamental acentuar o papel que cabe às organizações ligadas ao auxílio ao desenvolvimento e ao acompanhamento do sistema monetário internacional.

São estes alguns dos tópicos que proponho para a nossa discussão, face aos desafios não apenas económicos, mas também políticos, que a globalização convoca.

As nossas sociedades querem colher os benefícios que o mundo global lhes promete.

Querem maior progresso económico, maior segurança, equidade e justiça social; pedem-nos respostas conjuntas para problemas comuns, como a droga, o terrorismo, a criminalidade internacional.

O nosso dever é impedir que essas aspirações legítimas não se tornem em quimeras cada dia mais longínquas.

É este o desafio essencial que se nos coloca.

Referi, como primeiro tópico , a necessidade de estabelecimento de regras de conduta a nível dos grandes fluxos mundiais relacionados com a actividade económica e financeira.

Isto é válido tanto no que diz respeito ao comércio mundial que, para ser livre tem de ser justo, como no que respeita aos fluxos financeiros que devem assentar em bases sólidas para desincentivar a especulação aventureira que faz perigar o equilíbrio de todas as economias. Neste sentido, a excessiva volatilidade dos capitais a curto prazo constitui, hoje, um elemento altamente desestabilizador.

São igualmente necessárias regras para combater eficazmente os processo de branqueamento de capitais, relacionados com o crime organizado.

É necessário reforçar a solidez e a transparência do sistema financeiro internacional, fazer com que a liberalização internacional dos movimentos de capitais se processe de uma forma ordenada, respeitando os regulamentos internacionais, adoptando regras de prudência e aplicando ``códigos de conduta'' claros que reforcem a previsibilidade das actuações.

É também indispensável promover uma melhor coordenação dos sectores público e privado, associando este último à resolução das dificuldades com que nos defrontamos, no quadro de soluções mutuamente acordadas.

Em segundo lugar, o reforço e aprofundamento dos processos de integração, a par de uma maior cooperação entre os espaços regionais, parecem-se indispensáveis.

Os processos da globalização e da integração regional são compatíveis e têm que se apoiar mutuamente, potenciando as condições do desenvolvimento económico e social das nossas sociedades. Os exemplos existentes demonstram-no claramente, na União Europeia, no Mercosul, na Comunidade Andina, na NAFTA, ou no Mercado Comum Centro-Americano.

A minha perspectiva parte, naturalmente, do balanço extraordinariamente positivo da nossa própria experiência no processo de construção europeia, que acarretou profundas transformações em todo o país, afectando, pela positiva, o tecido económico e social, assim como as próprias mentalidades.

Habituámo-nos a viver numa Comunidade dotada com um conjunto de regras consubstanciadas quer nos Tratados, quer na própria prática. Aprendemos a saber medir o alcance político de decisões tomadas com os olhos postos no futuro, mesmo quando supõem sacrifícios e dificuldades no presente. Alargámos com os nosso parceiros a nossa cooperação às mais diversas áreas e reforçámos o sentimento de pertença a um todo solidário e de participação num projecto político ambicioso.

É certo que, apesar de todos os progressos alcançados, a construção europeia não é naturalmente uma obra acabada.

Continua a ser preciso um esforço quotidiano para levar, cada vez mais, a União Europeia até aos cidadãos, comungando das suas preocupações maiores, indo ao encontro das suas dúvidas, das suas incertezas, das suas angústias.

Para tal, temos que caminhar para uma Europa política, prosseguindo o caminho lógico que nos levou, primeiro, à união económica e agora, à monetária.

Se me permiti aqui evocar e deter-me na integração europeia e na experiência que dela tem o meu país é por me parecer que nos fornecem importantes referências para a discussão que aqui nos ocupa.

Ambas nos ajudam a perceber que só tem possibilidades de sucesso um espaço regional integrado, coeso, solidário, assente num corpo de regras e com objectivos claros e ambiciosos, que tenha o cidadão no centro das suas preocupações. E que mesmo assim sendo, a sua construção e aprofundamento têm de ser constantes.

O meu terceiro e último tópico diz respeito ao papel que deve continuar a caber às organizações vocacionadas para apoiarem o desenvolvimento.

Esse papel não tem sido isento de críticas, algumas vezes justificadas.

Mas o que não oferece dúvidas é que essas organizações são indispensáveis para garantir as condições de um desenvolvimento económico e social sustentado à escala mundial e que devem ser dotadas dos meios e das doutrinas de actuação adequados aos tempos actuais.

Parece-me necessário garantir um nível elevado de ajuda pública ao desenvolvimento, por forma a evitar as consequências negativas da volatilidade dos capitais privados e para permitir que os países mais pobres reunam as condições necessárias ao desenvolvimento do investimento privado.

O Banco Mundial e outras instituições financeiras internacionais vocacionadas para o apoio ao desenvolvimento têm de assumir o seu papel sem hesitações, contribuindo para a concretização de estratégias coerentes de desenvolvimento económico, de luta contra a pobreza e a exclusão, e que tenham em conta os efeitos sociais negativos da instabilidade financeira.

Senhores Chefes de Estado e de Governo,

Meus Amigos,

Como referi, o desafio que se nos coloca reside fundamentalmente na necessidade de assumir a globalização como um fenómeno do nosso tempo, actuando por forma a que ele constitua efectivamente um elemento poderoso do desenvolvimento económico e social, de consolidação democrática, de estabilidade internacional e de paz.

Aproveitar as economias de maior dimensão e aumentar a produtividade pelo efeito da concorrência aparece como mais possível a nível de espaços regionalmente integrados, tal como estes surgem como respostas indispensáveis às incertezas e fragilidades causadas pela mundialização a nível nacional.

Vivemos em sociedades de economia de mercado em que a esfera política tem de conservar a sua autonomia e o seu papel, e não em sociedades de mercado em que este se sobreponha às exigências da democracia.

Os Estados conservam funções relevantes na preparação de infraestruturas essenciais ao crescimento, nas políticas educativas e de formação, no estímulo à investigação e à inovação tecnológica, na gestão do direitos sociais.

Existem exigências de segurança e de coesão a nível das sociedades, a que os Estados não se podem eximir.

Os Estados têm de preservar a identidade cultural dos povos que não se pode perder na uniformização geral, antes valorizando a diversidade de culturas que constitui uma riqueza da Humanidade, como é claramente demonstrado na Europa e na América Latina; têm de zelar por uma constante valorização dos direitos humanos, da cidadania e da solidariedade.

Desde o nosso último encontro na Ilha Margarita tive a oportunidade de visitar oficialmente a Ucrânia, Marrocos e a Polónia. Perguntar-me-ão qual a relevância destas minhas visitas para esta nossa reunião.

Creio que a relevância reside no facto destes países terem a clara consciência da necessidade de se integrarem em espaços mais vastos de solidariedade e de articulação política e institucional para poderem garantir não apenas as condições do seu progresso económico e social, mas também a paz e a segurança regionais e a consolidação do seus regimes democráticos num contexto de globalização económica e financeira acelerada que, se encerra grandes oportunidades de progresso, contém também ameaças claras para os países com economias mais frágeis e com estruturas e práticas democráticas menos enraizadas.

São estes os desafios que temos de vencer.

Antes de concluir gostaria de referir dois outros temas que têm sempre merecido uma atenção e um estímulo particular por parte das nossas Cimeiras Ibero-Americanas.

Reunimos este ano, em Cabo Verde, a IIª Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e é com particular agrado que vos dou conta dos progressos registados em termos da sua capacidade de actuação política e diplomática, tanto mais que tiveram lugar num contexto difícil.

Estou certo de que, à medida em que se reforcem as suas estruturas e se aprofundem os seus mecanismos de actuação, a CPLP continuará a estreitar os seus laços de cooperação com a Comunidade Ibero-Americana, contribuindo para a consolidação de uma vasto espaço de solidariedade intercontinental. A presença entre nós do Secretário Executivo da CPLP sublinha essa vontade que nos anima.

O segundo tema que quero mencionar diz respeito a Timor-Leste, e aproveito para agradecer o apoio constante da Comunidade Ibero-Americana à causa heróica deste povo mártir que há mais de vinte anos luta pelo reconhecimento dos seus direitos fundamentais.

As mudanças políticas na Indonésia criaram novas expectativas na procura de uma resolução pacífica para esta questão, com o exercício livre e democrático do direito de autodeterminação do povo timorense.

No respeito por esses princípios, Portugal continuará a trabalhar com todas as partes interessadas, sob a égide do Secretário-Geral das Nações Unidas, no sentido de encontrar fórmulas intercalares de transição que mereçam o consentimento dos Timorenses e que garantam a defesa dos seus direitos, da sua identidade e dos seus valores, pondo fim à opressão e restaurando a paz em Timor-Leste.

A solidariedade dos nossos amigos, dos nossos parceiros, de todos quantos lutam pela liberdade, pelo progresso e pelo respeito dos direitos fundamentais da pessoa humana e dos povos, continua a ser crucial para conseguir uma solução pacífica e democrática, internacionalmente reconhecida, para esta tão dramática questão.

Senhores Chefes de Estado e de Governo

Senhores Ministros

O conjunto de iniciativas que se desenrolaram à margem desta nossa Cimeira testemunham do nosso empenho em aprofundarmos, num conjunto crescente de áreas importantes para o futuro dos nossos povos, as nossas relações de amizade, de compreensão mútua, de cooperação profícua.

Permitam-me que saliente uma iniciativa que propus à vossa consideração na Ilha Margarita e que mereceu de todos vós um apoio muito encorajador: o seminário euro-iberoamericano sobre as políticas das drogas e das toxicodependências.

As conclusões deste tão útil seminário serão apensas à declaração final da Cimeira e constituem uma demonstração clara da nossa vontade comum de avançarmos num tratamento conjunto de uma questão tão delicada e de tão grande importância para o futuro das nossas sociedades e para o bem-estar e progresso dos nossos povos.

Ao reiterar-vos a todos as boas-vindas a Portugal, não posso deixar de dirigir uma palavra particular de saudação aos representantes de um conjunto tão significativo de organizações internacionais; a sua presença é para todos nós um estímulo, já que testemunha do seu empenho na procura constante das condições que permitem reforçar a paz e o desenvolvimento económico e social dos nossos povos.

Os desafios com que nos defrontamos são prementes.

Exigem-se de nós, legitimamente, soluções eficazes, portadoras de confiança e de esperança.

A especificidade de cada um dos nossos países, as experiências tão diversificadas e por isso tão enriquecedoras que se espelham na nossa Cimeira, no quadro da solidariedade fraterna que nos une, constituem um elemento fundamental para utilidade dos nossos trabalhos e para a busca de soluções para as importantíssimas questões que vamos debater.

Meus amigos,

Assistimos à globalização das nossas economias; é altura de globalizarmos também a nossa solidariedade.

MIS AMIGOS

ASISTIMOS A LA GLOBALIZACIÓN DE NUESTRAS ECONOMIAS; YA ES TIEMPO DE GLOBALIZAR TAMBIÉN NUESTRA SOLIDARIDAD.

Señores Jefes de Estado y de Gobierno

Hay un acontecimiento especial para celebrar en esta cumbre de Oporto.

Hace una hora, los Presidentes Mahuad y Fujimori han depositado en manos de los Presidentes de los paises garantes del Protocolo de Rio, - que son los Presidentes Menem, Cardoso y Frei, - y del delegado especial del Presidente Clinton, Senõr Enaudi, la autorización de los Congresos de Perú y Ecuador para que sean los garantes quienes de manera obligatoria establezcan la línea de frontera terrestre común.

Los garantes, a su vez, han anunciado hace trinta minutos que esperan entregar su pronunciamiento en plazo muy breve, de ser posible esta misma semana.

La decisión de construir juntos el futuro desarrollo de Perú y Ecuador y la de resolver una vieja y delorosa cuestión que dura ya cincuenta y seis años, son motivos para expresar la felicitation de todos los Jefes de Estado e de Gobierno de Iberoamerica a los Presidentes Mahuad y Fujimori por su formidable liderazgo y valentia e por su amor por la paz.

Esta Cumbre Iberoamericana, gracias a esta decisión, se recordará en la Historia como la Cumbre de la Paz.

Muito obrigado a todos pela vossa presença.