Mensagem de Ano Novo 2004

Palácio de Belém
01 de Janeiro de 2004


Portugueses,

O ano de 2003 foi um ano muito difícil para o Mundo e para Portugal. Muitos portugueses viram as suas condições de vida piorar e o desemprego afectou, infelizmente, muitas famílias. Todos esses a quem o presente frustrou as expectativas de um quotidiano livre de incertezas e angústias, capaz de proporcionar aos seus filhos mais e melhores oportunidades de vida, olham com inquietação para o ano de 2004.

Um pouco por todo o lado, ouve-se dizer que o futuro mais próximo se afigura pouco risonho. Consolidou-se a percepção de que Portugal se encontra a atravessar uma crise difícil. Não podemos ignorar as dificuldades que o país atravessa. Mas devemos analisá-las com serenidade e rigor.

Nos últimos trinta anos atravessámos já momentos muito difíceis. Tempos que constituíram desafios sérios. Crises que até exigiram, para as ultrapassar, o forte apoio da comunidade internacional e das suas instituições financeiras.

Foi com esse apoio que o trabalho e o sacrifício dos portugueses nos permitiu construir as bases de uma sociedade mais moderna e de uma economia mais desenvolvida. É um país muito diferente aquele que hoje enfrenta um momento mais difícil. Não é sabermos isso que, por si só, minora as dificuldades concretas e quotidianas de muitos portugueses. Mas essa diferença é decisiva para melhor enfrentar as circunstâncias adversas e para mais rapidamente as podermos ultrapassar, encontrando soluções para os nossos problemas.

Nunca gostei de cultivar nem o pessimismo fatalista, nem o falso optimismo. É baseado num conhecimento profundo do país, das suas potencialidades, mas também das suas vulnerabilidades, que vos dou testemunho da minha confiança na capacidade de que dispomos para ultrapassar esta conjuntura, na qual, como é sabido, pesa uma delicada e complexa situação internacional.

Sei que somos capazes de criar novas dinâmicas de crescimento económico, de gerar um desenvolvimento mais sustentado e de fazer crescer o emprego. Nada disso se fará, naturalmente, sem uma visão estratégica para o futuro de Portugal, sem políticas claras e atempadas, sem o empenho, o trabalho e o sacrifício de todos. As dificuldades não podem nunca servir-nos de desculpa para não fazermos o que há a fazer. Devem antes servir-nos de estímulo para fazer mais e para fazer melhor.

É tempo de transformar a esperança em realidade. Os Portugueses que sofrem a adversidade de um quotidiano difícil não querem apenas a nossa compreensão para com as suas dificuldades, exigem políticas activas que encontrem soluções sustentadas para os problemas que o país enfrenta. O ano de 2004 pode ser, tem de ser, o momento de viragem por que os portugueses anseiam.

Neste dia, quero dizer aos portugueses que estou atento e que continuarei a fazer tudo para que a esperança substitua o desânimo; a confiança tome o lugar do medo do futuro; e a vontade de avançar se imponha à passividade e à indiferença. Estou atento aos problemas e à urgência de os solucionar. Estou solidário com os portugueses e portuguesas mais vulneráveis às dificuldades e mais desprotegidos. A comunidade tem deveres para com eles e é neste momento que não podem ser esquecidos.

No plano externo, durante o ano que findou, o Iraque foi, mais uma vez, motivo para crispações diplomáticas, origem de uma difícil crise internacional e cenário de uma guerra, cujo fim não trouxe, no entanto, a paz e a estabilidade ao país. Agora que o ditador foi capturado, e cujo julgamento terá de ser ética, jurídica e politicamente exemplar, poder-se-ão porventura alimentar outras expectativas quanto à desejável normalização da terra iraquiana e a uma rápida transferência da soberania para o seu povo. É este o meu desejo.

O ano que passou foi também, infelizmente, continuadamente marcado pela violência e a barbárie do terrorismo, que não poupa continentes nem distingue destinatários. Importa não só combatê-lo com determinação, como procurar ir mais longe, cortando as raízes que o alimentam.

Nesta breve referência à conjuntura internacional, não poderia deixar de aludir à União Europeia e ao recente desacordo sobre o projecto de Tratado Constitucional. Mais do que lamentar uma situação que naturalmente prejudicou os desejáveis avanços e não contribuiu para afirmar uma salutar imagem de unidade; mais do que entrar num nocivo jogo de recriminações, caber-nos-à, antes, proceder ao sereno exame dos motivos do insucesso e preparar caminhos de melhor entendimento e confiança. O projecto europeu, em que Portugal empenhadamente participa, bem merece este esforço, pois dele todos retiramos garantias de paz e prosperidade.

Uma última palavra para o flagelo da Sida. Esta epidemia, que infelizmente também nos afecta com gravidade, vem dizimando povos e países, hipotecando o futuro, mormente na África Austral. Trata-se de um problema que, ao exigir uma mobilização mais efectiva à escala mundial, não permite alheamentos, indecisões ou hesitações políticas.

Caros concidadãos,

Os meus melhores votos para o ano de 2004 dirigem-se também a todas as Comunidades Portuguesas espalhadas pelo mundo, onde milhões de compatriotas nossos, apesar de viverem distantes do seu país, nunca o esquecem e mantêm com ele uma relação de fidelidade e de afecto que se transmite de geração em geração.

Devemos orgulhar-nos desses portugueses, tal como eles se orgulham de Portugal. Muitos partiram para procurar noutros países as oportunidades de vida que aqui não lhes sorriram. Outros, hoje já muitíssimos, nasceram nos países de acolhimento, alguns nunca vieram a Portugal, mas, apesar disso, desejam e sabem manter uma ligação com o país de origem, o que constitui um elemento distintivo da Nação portuguesa.

É por conhecermos as dificuldades que os nossos compatriotas experimentaram quando emigraram e por apreciarmos o apoio que lhes foi prestado nos países de acolhimento que temos o dever moral de tratar os estrangeiros que vivem no nosso país, respeitando as nossas leis e criando riqueza com o seu trabalho, do mesmo modo que gostamos que tratem os portugueses emigrados.

Ainda recentemente, a realização do I Congresso sobre a Imigração em Portugal constituiu uma oportunidade muito útil para conhecermos melhor a actual situação neste domínio e os problemas existentes, prevenindo fenómenos de marginalização, desconfiança e mesmo intolerância.

Temos o dever de olhar para os imigrantes que estão entre nós como pessoas que nos ajudam e merecem o nosso respeito e o respeito dos seus direitos. É preciso que os ajudemos a integrar. A todos eles desejo um Bom Ano de 2004.

Não quero deixar de dirigir, igualmente e com especial intenção, uma palavra particular a todos aqueles que se encontram no estrangeiro, desempenhando funções militares ou de segurança ao serviço de Portugal, integrados em missões multinacionais. Longe das suas famílias, por vezes em circunstâncias bem duras e difíceis, como acontece no Iraque, esses homens e mulheres representam Portugal e são um elemento activo da sua política externa.

Devemos expressar-lhes a nossa solidariedade e homenagear a sua dedicação. Quero também testemunhar às suas famílias o nosso reconhecimento pelo sacrifício que igualmente se lhes exige.

A Portugal e a todos os portugueses, mas muito em particular àqueles que enfrentam hoje sérias adversidades, desejo um melhor Ano de 2004, com mais confiança em nós próprios e mais esperança no futuro.

Para todos, Feliz ano Novo!