Discurso de SEXA o PR por ocasião das iniciativas programadas no âmbito do programa "Ambiente e Desenvolvimento Sustentável"

Alcochete
27 de Janeiro de 2004


No ano em que celebramos trinta anos sobre a restauração das liberdades democráticas em Portugal, considero essencial levar os Portugueses a reflectir sobre os grandes desafios que afectam a comunidade nacional.

Mais do que nunca, a vida pública nacional necessita de se voltar para o que é fundamental para o conjunto do país, em vez de se deixar enredar no acessório, ou de ser vítima do empolamento e da distorção que impedem a consideração das coisas, sobretudo das mais graves, na sua justa e ponderada medida.

O tema do "Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável" é, na perspectiva do Presidente da República, um verdadeiro ponto de encontro para o debate necessário que os Portugueses têm de travar sobre o seu futuro colectivo.

Se é verdade, como já foi dito por um grande pensador, que uma nação é uma comunidade de destino, não é menos verdade que só haverá destino comum se houver capacidade de o desenhar, visão dos meios indispensáveis para o atingir, e vontade determinada para superar as dificuldades que sempre surgem no caminho da sua realização.
Por esse motivo central, identificaria, apenas, duas razões principais para justificar as numerosas iniciativas que ao longo de 2004 estarão associadas a esta reflexão sobre o desenvolvimento sustentável.

Em primeiro lugar, quando falamos de desenvolvimento sustentável queremos significar uma visão ampla e solidária do Portugal moderno. Uma solidariedade que tem numa concepção alargada de território a sua base de apoio. Num território que não esquece as nossas regiões autónomas da Madeira e dos Açores, que inclui a vastidão, riqueza e beleza do nosso mar territorial e da nossa Zona Económica Exclusiva.

Pretendemos uma consideração do território que olhe de frente para os problemas da agricultura e das florestas, que reconheça a necessidade de estudar e proteger a nossa diversidade biológica, conservando a nossa fauna e flora, bem como os nossos rios e a variedade das nossas paisagens, como tão bem as soube descrever o grande geógrafo e português que foi Orlando Ribeiro.

Essa solidariedade só será efectiva quando implicar uma visão de Portugal tanto no espaço como no tempo. Tal perspectiva, envolve, por um lado, o combate ao subdesenvolvimento, à exclusão, ao abandono a que tantos lugares e tantos portugueses se encontram expostos, mas também, a inteligência generosa de olharmos para os compatriotas que ainda não nasceram, os nossos filhos e o nossos netos.

Num mundo com tantas identidades fracturadas ou fictícias, os Portugueses sabem quem são e de onde vieram, mas o nosso natural orgulho pelos quase nove séculos de história não nos deve convidar ao repouso, mas sim ao esforço de nos mantermos sempre à altura de uma tradição que nos enobrece.

A solidariedade que se encontra associada aos valores do ambiente e do desenvolvimento sustentável implica, assim, um adequado ordenamento do território, abrindo caminho para uma boa distribuição das actividades económicas, das vilas e cidades, que nos permita o correcto uso dos recursos naturais, do solo, da água, do ar, de uma forma racional, sensata, duradoura, numa perspectiva de equidade social e regional, não esquecendo o nosso dever de deixar às gerações futuras um Portugal de que, também elas, se possam orgulhar.

Mas, para isso, é preciso mudar velhos hábitos e vencer preconceitos.

É preciso pensar no longo prazo. É preciso reconhecer o papel da ciência e do conhecimento na ponderação das grandes opções públicas e privadas. É indispensável repensar a coordenação das diferentes políticas públicas. É preciso desenvolver uma cultura cívica do diálogo e da cooperação, vencendo a nossa tradicional propensão para a quezília mesquinha e paralisante.

A segunda razão que me leva a chamar a atenção para o papel fundamental que deve ser conferido ao ambiente e ao desenvolvimento sustentável deriva do nosso lugar no mundo. Dos riscos e das possibilidades associadas a esse lugar.

Sabemos crescentemente que a nossa civilização apresenta um verso e um reverso na sua face técnica e científica. Os instrumentos do progresso podem ser também factores de risco. Só a mobilização da comunidade internacional numa nova agenda comum, que faça da sustentabilidade um eixo aglutinador, poderá enfrentar riscos de grande magnitude, como é o caso das alterações climáticas.

Nesse sentido, tanto a União Europeia como as Nações Unidas estão empenhadas em levar a cabo estratégias nacionais e regionais que promovam os amplos objectivos do desenvolvimento sustentável. Já em 2005 essas estratégias deverão estar em marcha. O nosso país não pode ficar indiferente a esse repto e a essa obrigação.

Assim, ao longo deste ano, terei ocasião de me deslocar no País, visitando e discutindo a nossa realidade e as nossas percepções em termos do ambiente e do desenvolvimento sustentável.

Hoje, no início do programa, neste belo quadro que o estuário do Tejo nos proporciona, devemos lembrar-nos do valor da água como fonte da vida. Esta é uma das questões centrais que quero trazer à reflexão dos portugueses e que nos acompanhará ao longo do ano.

Mas a vida e a sustentabilidade assumem-se sobretudo nas dimensões económica, social, ambiental, e cognitiva. As nossas instituições traduzem a resposta que formulamos em conformidade com as convicções que nos motivam a pensar o futuro.

Depois de visitar Alcochete e de me inteirar dos problemas ligados ao seu desenvolvimento urbano, passaremos pelas Salinas do Samouco evocando a importância da memória para o saudável equacionamento do presente. E, seguidamente, visitando três Laboratórios Nacionais com atribuições e competências de especial significado nas áreas do ambiente e da sustentabilidade, nomeadamente o IPIMAR/INIAP, o Instituto do Ambiente e o INETI, quero chamar a atenção de todos para a absoluta necessidade de estimular uma atitude científica no tratamento e na tomada de decisões sobre as grandes questões do desenvolvimento sustentável.

Estas instituições, os Laboratórios do Estado, são imprescindíveis na certificação da competência técnica e científica das nossas infra-estruturas, bem como na dos procedimentos e actividades do quotidiano. É sobre eles que repousa a legitimidade da nossa posição de parceiros credíveis na construção de uma nova Europa.

Em Fevereiro, visitarei o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e, como seu complemento, discutirei os temas da utilização racional da energia e da produção de energias renováveis. Terei também ocasião de me referir à importância crescente das relações e das parcerias entre as instituições do sistema de ensino superior e a indústria.

Em Abril, na visita dos Parques Naturais do Tejo Internacional e de São Mamede, procurarei ligar os temas da agricultura e da floresta ao seu contributo para a sustentabilidade. Naturalmente, este debate integrar-se-á na avaliação que então farei dos programas de recuperação da floresta após os devastadores incêndios do Verão passado.

Em Julho visitarei o Parque Natural da Arrábida e a Reserva Natural do Estuário do Sado. Estarão também em causa a necessidade de conseguirmos níveis sustentáveis para a qualidade do ar que respiramos, bem como de formularmos políticas adequadas para a gestão dos resíduos e para a construção em áreas protegidas.

Em Setembro deslocar-me-ei ao Parque Natural da Ria Formosa, igualmente com o propósito de promover uma reflexão sobre as implicações das alterações climáticas, bem como de ponderar a problemática do ordenamento do litoral e dos recursos marítimos nesse quadro prospectivo.

Em Outubro visitarei o Parque do Douro Internacional, estando aí em causa, naturalmente, os temas específicos da água e da biodiversidade, bem como os da gestão das bacias hidrográficas e da cooperação internacional.

Finalmente, no prazo de um ano, concluirei esta reflexão promovendo uma Conferência Internacional onde, com o auxílio de convidados e especialistas estrangeiros, possamos fazer um balanço e avaliar a esperança de nos encontrarmos no caminho certo para construir um Portugal melhor, mais capaz de criar riqueza útil, mais consistente da sua posição no mundo, mais coeso como sociedade plural e mais solidário com os outros povos.

É este o desígnio que me anima. A sustentabilidade é, sem dúvida alguma, uma das mais fundamentais, e mais prementes, questões que se põem às gerações que entraram neste novo século. A sustentabilidade é um compromisso de honra que assumimos face às gerações vindouras. É uma afirmação de confiança na capacidade criativa e na inteligência dos portugueses e de todos os seres humanos.

Há muitas décadas, o Papa Paulo VI afirmou que "o desenvolvimento é o novo nome da paz". Com igual razão poderemos hoje dizer que o respeito pelo ambiente e a concertação nacional e internacional em torno do desenvolvimento sustentável constituem o novo nome da modernidade e o novo rosto do progresso.