25º Aniversário do 25 de Abril


25 de Abril de 1999


Vinte e cinco anos depois, tudo parece tão simples. Banalizaram-se as imagens daqueles militares em ameno convívio com a população. As fotografias e filmes, a preto e branco, conferem um ar remoto e frágil aos instantâneos da Revolução. Os testemunhos sucessivos dos intervenientes, narram uma organização quase sem sobressaltos. Tudo isso e a distância do tempo, parecem contribuir para uma imagem de facilidade no derrube do regime.

Mas a verdade é outra. Derrubar a Ditadura exigiu determinação. Foi necessária muita coragem para arrostar com os riscos inerentes a uma revolta contra quem dispunha de um forte aparelho repressivo e do apoio de sectores das forças armadas.

Temos uma grata dívida para com esses oficiais, sargentos e praças que, desprezando os riscos, pegaram em armas para permitir aos portugueses alcançar a liberdade há tanto tempo desejada.

Honra aos militares do 25 de Abril. Em nome da República exprimo-vos o nosso reconhecimento e gratidão.

Recordo, sentido, a memória daqueles que infelizmente já não é possível ter hoje ao nosso lado. Permitam-me que por todos eles eu evoque o nome do Capitão Salgueiro Maia.

O gesto generoso do 25 de Abril põe fim a uma longa luta que opôs sucessivas gerações à Ditadura. É à luz do sacrifício das diversas oposições ao Estado Novo que o 25 de Abril se compreende. É nessa ampla tradição de determinação, de sacrifício e coragem que ele se integra.

Também hoje, essas décadas de combate parecem tão simples e remotas. E tão saradas as feridas dos que conheceram a prisão e a tortura. Tão distantes os sacrifícios daqueles que foram forçados ao exílio ou aqui sofreram perseguições. E tão longe a dor de quem viu os seus familiares morrer às mãos da polícia ou numa guerra travada contra o sentido da história.

O 25 de Abril é o gesto de toda uma geração que, das fábricas às universidades, dos campos do Alentejo aos movimentos de libertação, em seu nome e no de todos os que antes de si ousaram lutar, tornaram inviável a sustentação da Ditadura.

O 25 de Abril é um dia único e irreproduzível. O dia em que todos nos encontrámos, oriundos dos mais diversos percursos. Desde os mais velhos, vindos da antiga oposição Republicana, aos mais novos, agrupados em torno das múltiplas famílias da esquerda. É o dia da Liberdade e da esperança. Liberdade e esperança, para as quais, cada um de nós, tinha uma visão própria.

Vinte e cinco anos depois não é o balanço dessas diversas perspectivas que importa fazer. A isso se dedicará o memorialismo, com as suas visões pessoais e a História que com distância e rigor um dia se fará.

Mas há um país que se construiu com a Liberdade. Creio que a todos nós, que tivemos responsabilidades políticas, é grato olhar para trás, para estes vinte e cinco anos, e reconhecer que o balanço é muito positivo. Creio que a todos os portugueses, que tiveram de contribuir com o seu trabalho e muitos com a sua quota-parte de sacrifícios, é igualmente grato reconhecer a enorme transformação que o seu esforço tornou possível.

Com a coragem desse dia tudo pôde mudar.

Quero sublinhar, em primeiro lugar, em homenagem aos militares, que a consolidação e a evolução da democracia permitiu uma grande mudança nas Forças Armadas. Graças a um processo de reestruturação e apetrechamento progressivo, elas estão hoje mais aptas para responder às exigências do mundo contemporâneo.

É conhecida a amplitude das actuais missões desempenhadas pelas Forças Armadas em Portugal e no estrangeiro e o prestígio que granjearam no exercício dessas missões. O seu qualificado contributo é decisivo na estratégica cooperação técnico-militar com os países de expressão portuguesa. A sua capacidade operacional é essencial à consubstanciação dos compromissos internacionais assumidos por Portugal com os demais Estados e com as organizações internacionais.

O processo de reestruturação e modernização das forças armadas não está concluído. Apesar dos esforços já desenvolvidos, há ainda um longo caminho a percorrer, que faz apelo a um grande empenho, determinação e capacidade de compromisso de todos.

Os objectivos têm de ser claramente definidos. Para um país como Portugal, com recursos escassos e com um potencial estratégico limitado, é de primordial importância que tal exercício conduza à identificação das grandes prioridades que deverão orientar o esforço de modernização das Forças Armadas, essencial para a projecção internacional do nosso País.

Portugal desempenha hoje um papel no concerto das nações só possível porque o 25 de Abril permitiu o fim de um ciclo marcado pelo isolamento e condenação internacional.

Foi possível, então, pôr fim à Guerra Colonial. Guerra que ceifou a vida de tantos soldados portugueses que, honrando o seu amor a Portugal, serviram uma causa errada que a Ditadura impedia que se debatesse ou pusesse em causa. Guerra que ceifou a vida de tantos irmãos nossos africanos que, com determinação, lutaram por um princípio fundamental: o do direito à autodeterminação. Hoje choramos ambos os mortos desta tragédia e lamentamos impotentes o desperdício de tantas vidas.
 
 
Senhor Presidente da Assembleia da República,

Excelências,

Nada me poderia ser mais grato neste aniversário carregado de simbolismo e emoção do que saudar em nome de Portugal a presença do Presidente Joaquim Chissano e do Senhor Presidente da Assembleia Nacional da Guiné Bissau.

Senhor Presidente da República de Moçambique,

Do alto desta tribuna não lhe pode falar o amigo que tanto o estima. Mas é com igual comoção que se lhe dirige o Presidente da República de Portugal. A sua presença aqui representa para nós, e sei que também para Vossa Excelência, muito mais do que o testemunho das excelentes relações entre Moçambique e Portugal.

A sua presença aqui, Senhor Presidente da Assembleia Nacional da Guiné-Bissau, permite-nos exprimir a nossa solidariedade e esperança no futuro democrático da Guiné-Bissau.

Ela é símbolo da consolidação de um reencontro entre Portugal e os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Reencontro em que todos nós, de um lado e do outro, pacientemente, superámos o desconhecimento e o preconceito com a redescoberta e o entendimento, ultrapassámos a relação de exploração com a complementaridade dos espaços económicos e sarámos a ferida da guerra com o abraço da fraternidade.

Quero que saiba, Senhor Presidente da República, e por isso lho exprimo hoje em nome de todos os Órgãos de Soberania, que este novo relacionamento de Portugal com África é um dos motivos de orgulho maior do balanço destes vinte e cinco anos.
 
 
 
Excelências,
 
Quando foi possível libertarmo-nos da ilusão do império reorientámos a vida colectiva nacional para a partilha e a solidariedade no espaço europeu. A adesão à Comunidade Económica Europeia é um projecto da República democrática. Alcançar esse objectivo foi um factor de estabilização da democracia. Contribuiu para a racionalização e o enquadramento de estratégias de modernização económica e social do país. Criou-se e consolidou-se o poder local democrático. Permitiu que Portugal definisse, de forma clara e consistente, uma nova política internacional.
Não teria sido possível percorrer com sucesso esse caminho se a jovem democracia portuguesa não tivesse podido dispor de um consistente apoio internacional. É em sinal de reconhecimento por todo o apoio que Portugal recebeu dos países amigos que, com redobrado gosto, dirijo uma saudação muito especial a todo o Corpo Diplomático que nos dá o prazer de connosco comemorar este 25º Aniversário da Revolução.
 
 
 
Senhor Presidente da Assembleia da República,
Excelências,
 
Confesso-vos que como português e como Presidente da República sinto orgulho no Portugal democrático. É isso que deve dar forças a todos nós - na diversidade das perspectivas que cada um defende - para continuar a lutar por um Portugal melhor.

É difícil fazer o balanço de tantas transformações. Melhorou a prestação dos serviços primários de saúde, alargou-se o leque de beneficiários dos sistemas de protecção social, intensificou-se o processo de escolarização, nomeadamente no ensino básico, criaram-se equipamentos e infra-estruturas que melhoraram as condições de vida de muitos portugueses, aprovou-se legislação laboral impeditiva de abusos e arbítrios, eliminaram-se os obstáculos mais flagrantes a uma igualdade de direitos das mulheres, descentralizaram-se muitos serviços. A vida dos portugueses melhorou significativamente.

Com a democracia refundou-se também o Estado de Direito. Consagraram-se os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Assegurou-se a independência dos tribunais. Garantiu-se a liberdade e o pluralismo político. A liberdade eleitoral ficou associada à necessária equidade nas condições de divulgação das mensagens políticas.

Mas o estado de Direito carece de aperfeiçoamento permanente, atento à evolução das sociedades, para melhor garantir a igualdade de oportunidades e a capacidade de iniciativa.

O debate acerca da reforma do sistema político, da lei eleitoral, do reforço da participação dos cidadãos e do financiamento da actividade política continua em aberto e deve merecer a nossa maior atenção.

Há sempre novas questões a discutir. Vinte cinco anos depois temos de novo perante nós a necessidade de procurar com coragem a construção dos consensos sem os quais estas reformas são inviáveis.

Sem elas, talvez não seja possível dar resposta aos sinais de distanciamento na relação entre o cidadão e o sistema de representação. Estes são evidentes, por exemplo, nas taxas de abstenção eleitoral ou na ausência de voluntários em número suficiente para as operações de escrutínio e fiscalização eleitoral que ainda há dez anos atrás mobilizavam milhares de militantes partidários.

A entrada de Portugal no grupo de países fundadores da Moeda Única, é igualmente um marco maior da democracia portuguesa, só possível à custa de rigor na governação. É alicerçados nessa realização e no que ela significa de capacidade nacional, mas também no que ela nos impõe como continuidade, urgência e rigor no esforço de reformas que importa olhar para o futuro.

Portugal continua a enfrentar problemas muito sérios. Problemas com que convivemos há décadas e são de difícil solução. Problemas que todos os partidos que tiveram responsabilidades de governo já procuraram minoror.

No momento em que se fazem esforços, aliás de grande mérito, para responder aos desafios da sociedade da informação, persiste o analfabetismo literal e funcional e o abandono escolar precoce.

O serviço nacional de saúde, que tanto sucesso alcançou, não responde ainda com eficácia às necessidades das populações; as assimetrias regionais de desenvolvimento continuam a penalizar zonas do país; o desemprego de longa duração e as dificuldades no acesso ao primeiro emprego persistem; a justiça é lenta e ainda inacessível aos mais desfavorecidos, a burocracia sem sentido resiste e tolhe os movimentos de quem tem iniciativa, o sistema fiscal continua a não ser uma arma eficaz na criação de mais equidade social, a toxicodependência mina o quotidiano de muitas famílias, os elevados níveis de pobreza existentes no país estão longe da erradicação.

É indispensável prosseguir com determinação os esforços encetados por todos os governos, ganhando ânimo com os resultados entretanto já alcançados. A previsível evolução da conjuntura europeia aconselha a que se encarem com coragem - que aqui é expressão de rigor, exigência e previsão - novos passos no sentido da modernização do país. Há um sentido de urgência que a todos deve interpelar, que temos de interiorizar. Só assim se contornam as pressões dos calendários eleitorais e os impasses nos consensos quando estes comprometem o momento em que é imperioso decidir.
 
 
 
Senhor Presidente da Assembleia da República,
Excelências,
 
A Europa vive um momento difícil.

São conhecidas as causas da operação da NATO. É impossível aceitar a brutalidade inqualificável das forças militares e policiais sérvias contra os albaneses. Tão grosseiras violações dos direitos humanos são intoleráveis. Não há impunidade possível para actos desta natureza. É importante que o presidente Milosevic compreenda isso. É importante que se compenetre da determinação da Comunidade Internacional.

À violência tem de se responder necessariamente com a força. Mas a utilização da força só tem sentido se for prosseguida com objectivos militares claros e objectivos políticos claros. Por isso, é necessário desenvolver, paralelamente às operações militares da NATO, um esforço político e diplomático para resolver os problemas que estão na base da presente crise.

É indispensável procurar com determinação uma solução política. É necessário reunir os esforços de todos; da União Europeia, da Aliança Atlântica, da Rússia, dos restantes membros da OSCE, e das Nações Unidas e do seu Secretário-Geral que têm uma responsabilidade central em termos de garantir a paz e a segurança internacionais.

É bom que o Presidente Milosevic realize bem que este é o único caminho que pode seguir. E que o deve fazer depressa, activamente e de boa fé. Que deve dar, em tempo útil, sinais inequívocos à Comunidade Internacional. Só assim se poderá alcançar uma solução política para o problema.

Para permitir essa solução é necessário pôr fim à presente fase desta crise, tendo por base os termos clara e convergentemente definidos pela NATO, pela União Europeia e pelo Secretário-Geral das Nações Unidas.

Entretanto, a situação humanitária é uma catástrofe que se agrava dia a dia. O número de vítimas inocentes aumenta. Cresce a preocupação quanto aos efeitos desestabilizadores da crise em outros países da região, nomeadamente na Macedónia, na Bósnia e no Montenegro. A Europa vive um dos momentos mais dramáticos e difíceis do pós-guerra.

Por muito criativas que sejam as novas expressões que definem hoje os conflitos, a Guerra é o que é. A Guerra é o que sempre foi. A Guerra é uma coisa horrível.

Não creio que ninguém possa assistir sem um calafrio de horror à transformação em espectáculo mediático da trajectória de um míssil até que transforma riqueza, património e vidas, em miséria, destruição e morte. E se algum dia a banalização do horror nos tornar insensíveis ao drama que uma guerra representa, os valores humanistas em que assenta quer a nossa civilização quer a construção europeia estarão postos em causa.

A União Europeia em que nos reconhecemos é a que defende uma Europa que se rege por valores humanistas, a que deve condenar sempre as violações de direitos humanos, mas também a que defende que a via da prevenção dos conflitos e da diplomacia são os instrumentos essenciais para assegurar a paz, a estabilidade na Europa e a segurança internacional.

Para isso é necessário que o projecto político europeu se reforce. Sem uma Europa politicamente mais integrada, não haverá uma Política Externa e de Segurança Comum credível e eficaz, nem a Europa poderá assumir um papel mais actuante na defesa dos seus interesses próprios.

A Aliança Atlântica continua a representar um quadro indispensável para garantir a segurança e a estabilidade dos seus membros. Mas a Europa tem de assumir uma maior quota-parte de responsabilidade na sua própria defesa. Chegou a hora de os europeus disporem de uma capacidade própria e eficaz em termos de gestão de crise, para poderem agir politica e militarmente com autonomia.

Importa caminhar, com prudência e discernimento, mas com clara determinação política, na elaboração de uma política de defesa comum europeia, reforçando a nossa solidariedade política e militar e aproveitando o património que a UEO representa em si mesma.

Para além da resolução política do problema do Kosovo, julgo que se impõem medidas globais de estabilização e segurança do sudeste europeu, que passam pela consolidação de regimes democráticos, pela protecção eficaz das minorias e pelo desenvolvimento económico e social.

Os Balcãs não podem continuar a ser uma região da Europa sem perspectiva de futuro, excluída do concerto europeu, dos benefícios da paz, da segurança e do progresso.

A União Europeia tem, aqui, uma especial responsabilidade, e seria sem dúvida útil avançar com um pacto de estabilidade baseado em elementos políticos e económicos e reforçar a perspectiva de uma aproximação crescente destes países à União.

A realização de uma conferência sobre a Europa do Sudeste seria, sem dúvida, muito oportuna.

Portugal participa na força da NATO com 3 aviões F16 e 53 homens. Fazemo-lo porque o nosso país tem uma posição consistente quanto à defesa intransigente dos Direitos Humanos. Fazemo-lo porque o Estado português sustenta uma posição de responsabilidade solidária no quadro dos seus compromissos internacionais. Responsabilidade que assumimos com redobrado empenho quando as acções que delas decorrem são, em minha opinião, concordantes com os valores fundamentais que orientam o nosso ordenamento constitucional.

Todos estamos conscientes das limitações do uso da força num conflito que só por solução política pode eliminar as causas que o geraram. Todos estamos conscientes das limitações nacionais. Mas um país pequeno como Portugal tem de saber - e nós temos sabido sempre fazê-lo nos últimos 25 anos - conjugar os nossos valores com as nossas responsabilidades na condução da política externa nacional.

Só assim foi possível, no espaço de uma mesma geração, transformar Portugal de um país isolado no contexto das nações num país internacionalmente respeitado pela consistência da sua política externa.

É, aliás, a solidez da posição internacional de Portugal que nos tem assegurado as condições externas indispensáveis para obter novos resultados na resolução da questão de Timor-Leste. Como o demonstram, designadamente, as conclusões das últimas conversações de Nova York, sob a égide do Secretário-Geral das Nações Unidas.

O acordo alcançado sobre uma consulta livre e democrática representa um passo da maior importância no processo de autodeterminação de Timor-Leste. Sei que todos partilhamos a esperança de que esse acordo possa ser assinado proximamente e, sobretudo, que todas as partes se empenhem em cumprir, escrupulosa e integralmente, as suas disposições, de modo a criar as condições de paz e estabilidade no Território. Pela nossa parte, tudo faremos nesse sentido.

Os portugueses têm um afecto muito especial por Timor. Acompanham com angústia os momentos difíceis e com expectativa os momentos de esperança.

Timor tem vivido momentos dramáticos. Perderam-se vidas humanas. Mortos que choramos como se fossem nossos. Quiseram transformar a esperança em desespero. Angústia a que temos de devolver de novo a esperança. Nunca desistiremos de lutar pelos direitos do povo de Timor-Leste. Nunca deixaremos de o fazer, até ao limite das nossas capacidades e meios, para que os timorenses possam decidir livremente o seu destino colectivo.
 
 
Senhor Presidente de Assembleia da República,

Excelências,
 
Comemoramos o dia 25 de Abril, mas sei que cada um de nós não deixa de interiormente comemorar o percurso das causas porque lutou ao longo da sua vida política e dos combates que em nome delas travou. Há um percurso pessoal que hoje cada um de nós instintivamente revisita.

O meu é já longo de quatro décadas. Feito de vitórias e de derrotas políticas. Feito de persistência, de esperanças e de incertezas. Norteado por valores e procurando sempre exercer com rigor as minhas responsabilidades públicas. Lutei desde muito novo contra a ditadura, num confronto de posições que não tinham conciliação possível. Assumi no regime democrático responsabilidades políticas muito variadas. Em confronto, ao lado, ou com o apoio de muitos dos presentes.

Sei que terei dificuldade em transmitir-vos o que significa para mim viver este dia exercendo o cargo que ocupo, procurando ser para todos uma referência suprapartidária, de isenção e rigor no exercício das minhas competências, exercendo uma magistratura de conciliação e de estímulo ao progresso constante do país, empenhando o melhor do meu esforço em desempenhar a mais nobre das funções que alguma vez me foram confiadas: a de procurar ser um referência de unidade nacional e um factor de estabilidade política.

Olhando para o futuro, acima das diversas perspectivas partidárias e até do que de mais premente pode haver na agenda política, partilho convosco algumas preocupações nacionais.

A preocupação de lutar contra a ignorância, contra o facilitismo, contra a inacção, contra a arrogância. O papel da educação numa sociedade baseada na informação e no conhecimento é decisivo.

Esta é uma sociedade de participação e quem nela não consegue participar activamente, não existe. A participação exige que se saibam falar linguagens comuns e que se seja um interlocutor válido. É nessa tarefa que a qualidade da educação é decisiva.

É preciso incutir nos mais novos a confiança nas suas próprias conjecturas, único processo que os levará a construir novos edifícios intelectuais sobre os ombros das gerações que os precederam. Urge desenvolver uma cultura científica que garanta o alargamento dos horizontes e perspectivas fundamentais para a sua compreensão. Importa despertar nos mais novos o gosto e a curiosidade de experimentar, de observar, de conjecturar.

A preocupação de incentivar uma cultura de cooperação. É preciso compreender que não há soluções reais no mundo contemporâneo que não sejam partilhadas, globais. É preciso promover uma cultura de cooperação, abandonando a ideia errada de que pensar o futuro é algo que não nos compete. Uma sociedade que abdica de definir e construir o seu próprio destino colectivo é uma sociedade que vai morrendo sem esperança.

A preocupação em promover uma cultura de tolerância. Nunca a mudança nas sociedades foi tão rápida, nem os valores do conhecimento e da capacidade intelectual tão preciosos. Por estes motivos, sabemos que as soluções não se encontram num quadro desregrado de mecanismos que desprezem, humilhem e anulem os valores e as iniciativas dos outros. É preciso que os mais novos aprendam a acolher a Alteridade e a reconhecer e aceitar o Outro, sem hesitações de qualquer espécie. Só assim se reconstrói e redefine hoje, em permanência, a identidade.

A preocupação em minorar as desigualdades sociais. A igaualdade dos cidadãos perante a lei exige que a democracia garanta a todos um mínimo de possibilidades económicas, sociais e culturais de integração e que as desigualdades - de oportunidades e de estatutos - introduzidas pelo funcionamento dos mercados sejam corrigidas, ou pelo menos compensadas.

A garantia dos direitos sociais não é um luxo que se possa guardar para épocas de desafogo e de prosperidade acentuada. Pelo contrário, a garantia de direitos sociais constitui uma condição para que a universalidade dos direitos cívicos e políticos se possa realizar.

Lutar contra a ignorância, incentivar uma atitude de cooperação, promover uma cultura de tolerância, procurar corrigir as desigualdades. Digo-o hoje como objectivos a prosseguir. Podíamos todos nós tê-lo dito, e dissemo-lo de certeza, há vinte, trinta ou quarenta anos.

Valores por que lutámos, e que continuam, como tantos outros, válidos e actuais. Valores por que lutei sempre e aos quais continuo a querer dar o meu contributo vinte e cinco anos depois do 25 de Abril.
 
Viva o 25 de Abril!

Viva Portugal!