Sessão Comemorativa do 31º Aniversário da Universidade do Minho e do Doutoramento Honoris Causa do Dr. Joaquim Alberto Chissano

Braga
17 de Fevereiro de 2005


Exmo. Senhor Reitor da Universidade do Minho,
Senhor Doutor Joaquim Alberto Chissano,
Senhor Doutor Mário Soares,
Excelência Reverendíssima,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,

É para mim um grato prazer presidir a esta cerimónia em que a Universidade do Minho celebra mais um aniversário, concedendo, ao mesmo tempo, numa feliz e oportuna iniciativa, o Doutoramento Honoris Causa a um estadista respeitado e amigo de Portugal, Joaquim Chissano.

Gostaria assim de duplamente felicitar, na pessoa do seu Reitor, os responsáveis por esta Instituição pelo excelente trabalho e importante esforço que vêm realizando em prol da educação e da investigação científica e por esta homenagem ao Dr. Joaquim Chissano, que tiveram a iniciativa de promover, coincidindo com o momento em que concluiu dezoito anos no exercício do cargo de Presidente da República de Moçambique.

Quero afirmar também quanto me é grato visitar, uma vez mais, a Universidade do Minho, Instituição que muito aprecio, pela qualidade do seu projecto, dos seus docentes, do seu ensino e da sua investigação. As universidades novas tiveram um papel decisivo para a democratização do acesso ao ensino superior e para o desenvolvimento cultural e económico mais harmonioso do país e das suas regiões. Neste contexto, o particular prestígio da Universidade do Minho fica, em meu entender, a dever-se essencialmente ao modo como soube aliar juventude institucional, solidez na construção do seu projecto e afirmação no campo do ensino, da ciência e da inovação.

Permitam-me nesta ocasião, em que esta Casa celebra trinta e um anos de idade, que transmita uma palavra de estímulo a toda a comunidade educativa. Vivemos um tempo de grande competitividade e exigência em matéria de conhecimento em que a aposta nas pessoas é imperiosa e decisiva. As Universidades têm um papel cada vez maior e mais importante a desempenhar, tornando-se necessário que saibam conciliar democratização com excelência e inovação com rigor.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Conheço Joaquim Chissano há mais de quarenta anos. Fomos contemporâneos na Universidade de Lisboa em 1960 e 1961, período particularmente difícil, mas fecundo e formativo, como é bem sabido, nos meios universitários e estudantis portugueses. Recordo-me bem dessa passagem de V. Exa. por Portugal, ainda um jovem estudante membro da “Casa dos Estudantes do Império, mas já com uma forte consciência política. Mantivemos ao longo dos anos um convívio regular, enquanto responsáveis políticos dos nossos dois países. E foi com grande prazer que assisti, há duas semanas atrás em Maputo, à cerimónia de passagem de testemunho do Presidente Joaquim Chissano para o novo Presidente da República de Moçambique Armando Guebuza. Encerrado esse capítulo da vida política de V.Exa., não podia deixar de aqui estar hoje, associando-me a esta merecida homenagem, estando certo que V. Exa. não deixará de continuar a sua acção política e, sobretudo, cívica, pondo a sua vasta experiência ao serviço de Moçambique, do continente africano e, seguramente também, das relações entre os nossos dois países.

Beneficiando deste quarenta anos de conhecimento mútuo, em que tive o privilégio de, com amizade e interesse, observar de perto a carreira de Joaquim Chissano, permitam-me que destaque sucintamente os seguintes três aspectos.

Em primeiro lugar, o seu notável percurso pessoal e as crescentes responsabilidades políticas que assumiu no seu país, numa linha desde sempre pautada pela capacidade de persuasão, por um invejável talento, competência e por uma grande determinação, qualidades essenciais num verdadeiro líder político e que lhe permitiram desempenhar, ininterruptamente ao longo dos últimos trinta anos, funções políticas do maior relevo para bem do seu povo.

Com efeito, foi Primeiro-Ministro do Governo de Transição, Ministro dos Negócios Estrangeiros durante 11 anos, assumindo o cargo de Presidente da República em 1986. Neste cargo, começou por impulsionar, no final dos anos 80, as reformas políticas que viriam a preparar Moçambique para a transição para um sistema democrático e multipartidário, consagrado na Constituição moçambicana de 1990. Negociou e assinou em 1992, em Roma, com o líder da RENAMO, o Acordo Geral de Paz que permitiu estabilizar política e economicamente o país. Promoveu a reconciliação nacional e conduziu o país a eleições democráticas. Concorreu e venceu, por duas vezes, eleições presidenciais – 1994 e 1999 – cumprindo dois mandatos como Presidente democraticamente eleito. Em 2001, dois anos após ter sido reeleito, deu mais um exemplo da sua estatura política ao anunciar que não se recandidataria às eleições seguintes.

Em segundo lugar, a impressionante obra política e marca pessoal que deixou ao seu país. Em síntese, tratou-se tão só – e essa foi uma tarefa enorme - de fazer a paz, promover a reconciliação nacional e construir a democracia. Durante os 18 anos em que foi Presidente da República, Moçambique tornou-se, de facto, um exemplo para África e para o Mundo, revelando-se um caso especial de maturidade, abertura e tolerância mesmo em áreas – sempre difíceis e complexas – como a convivência e o diálogo entre religiões ou a capacidade para reconhecer e combater o problema da SIDA. O sucesso na condução de Moçambique, que a comunidade internacional legitimamente valorizou, permitiu que acumulasse prestígio internacional, sendo chamado a desempenhar diversas funções no contexto regional, que culminaram com o ainda recente exercício do cargo de Presidente da União Africana.

Em terceiro lugar, a amizade sempre manifestada para com Portugal. De forma sagaz e com grande visão, contribuiu decisivamente para proteger, aprofundar e consolidar, por vezes em condições difíceis, as relações entre Portugal e Moçambique. Decorridos 30 anos desde a independência de Moçambique, podemos fazer, sem hesitações, um balanço muito positivo do longo caminho que, lado a lado, solidariamente temos percorrido. Soubemos construir um novo capítulo nas nossas relações, enquanto Estados soberanos que livremente reconhecem a importância desse relacionamento. As relações entre os nossos dois países expandiram-se, diversificaram-se e dinamizaram-se a todos os níveis e em todas as dimensões. Atingir este estádio de relacionamento não foi fácil e gostaria de aqui publicamente reafirmar o meu reconhecimento pelo decisivo contributo que, em cada momento, foi dado pelo Presidente Chissano.

Minhas senhoras e meus senhores,

Gostaria de terminar, aproveitando esta homenagem ao percurso de um estadista dum país de língua portuguesa, com umas breves palavras sobre a língua portuguesa. A língua portuguesa é, de facto, hoje uma riqueza comum e um veículo de comunicação e cooperação entre cerca de duzentos milhões de pessoas. A língua portuguesa é hoje um poderoso instrumento e um forte factor de aproximação entre Estado e povos, devendo cada vez mais ser olhada como um bem precioso que deve ser valorizado e devidamente cuidado pelas autoridades e pelos cidadãos dos países em que ela é cimento de unidade e entendimento.

A língua portuguesa é, de facto, o fundamento e o principal instrumento da CPLP. O ponto de partida desta Comunidade não foi o mercado ou a economia, mas sim uma língua que une oito Estados. Devemos ter este facto presente e cuidar politicamente da língua, encarando-a como um instrumento de afirmação internacional dos nossos países.

As instituições de ensino superior têm, também nesta matéria, um papel decisivo a desempenhar, designadamente na formação de professores de português e na produção de materiais que contribuam para promover o ensino da língua e para divulgar a cultura dos nossos países. Defendo, nesta matéria, que o caminho mais eficaz será trabalhar à escala de CPLP, sendo de saudar a Declaração aprovada o ano passado pelo Ministros do Ensino Superior em Fortaleza, lançando as bases para um Espaço de Ensino Superior da CPLP.

Termino, felicitando, uma vez mais, os responsáveis da Universidade do Minho pelo seu 31º aniversário e saudando o Dr. Joaquim Chissano, um amigo de Portugal, desejando-lhe sucesso e felicidade pessoal.