Declaração do Presidente da República no momento do falecimento de Sua Santidade o Papa João Paulo II

Palácio de Belém
02 de Abril de 2005


O Papa João Paulo II foi uma das figuras mais marcantes da História Contemporânea, como é reconhecido universalmente, seja qual for o juízo que se faça da sua acção e do seu legado. O pontificado deste Papa coincidiu com um período de grandes transformações no Mundo e de uma crescente aceleração da História. Se nos lembrarmos do que em 1978, data da sua eleição, a URSS era dirigida por Brejnev e a Europa estava dividida, temos ideia do que mudou. Deve, aliás, dizer que a acção do Papa contribuiu para essas mudanças fundamentais.

Personalidade muito forte, pastor fiel a um catolicismo activo e mesmo militante, enraizado na experiência vivida como padre e bispo na sua Polónia natal, João Paulo II quis ir ao encontro do mundo da passagem do século XX para o século XXI, ao mesmo tempo que rejeitava muito daquilo que o caracteriza.

Aproveitando, como nunca outro seu antecessor o podia ter feito, as facilidades modernas da comunicação (viagens, televisão, etc.) foi verdadeiramente, até ao fim, um Papa de multidões e de massas. Isso não o impediu de condenar abertamente o novo materialismo causado pelo excesso da técnica, do consumo e do hedonismo. Adversário acérrimo do comunismo colectivista, também o foi do capitalismo egoísta, sem consciência humanista e sem solidariedade, e de uma concepção do lucro como o grande fim da actividade humana.

O seu pontificado ficará marcado por uma visão universalista e ecuménica; por corajosas tomadas de posição na defesa da paz, dos direitos humanos e por direitos sociais dos povos e das pessoas excluídas e humilhadas; por gestos de reconciliação e pedidos de perdão. E também por aquilo em que alguns verão um regresso a uma maior ortodoxia nos planos teológico, eclesial e moral. Umas e outras marcas reflectiram, aliás, a sua personalidade vigorosa e as suas concepções mais firmes, difundidas e reiteradas numa acção incansável, que mesmo a longa e grave doença não abrandou.

Neste momento, cumpre-me sublinhar a nossa gratidão pelos repetidos testemunhos de afecto de João Paulo II por Portugal, mormente por Fátima. Tive a honra de o receber e acompanhar da última vez que nos visitou e não esqueço as palavras de grande consideração e estima que então teve para com Portugal. Ainda há 4 meses, ao ser recebido pelo Papa no Vaticano, pude ver como a sua vontade e a sua fortaleza de ânimo se erguiam sobre as limitações da doença e do sofrimento. Também nessa ocasião, João Paulo II teve palavras de muita amizade para com o povo português. É em nome desse Povo que apresento as minhas sentidas condolências à Igreja Católica universal e, como representante do Estado, à Igreja e aos católicos portugueses.