Encontro entre Empresários Portugueses e Franceses no MEDEF

Paris
12 de Abril de 2005


Senhor Presidente do MEDEF, Ernest-Antoine de Seillière
Senhor Secretário de Estado da Economia
Senhor Presidente do ICEP
Senhores empresários


Gostaria, antes de mais, de agradecer ao MEDEF, na pessoa do seu Presidente, que, aliás, terei o prazer de agraciar esta tarde, pela organização do presente encontro. Entendo, depois, expressar o meu agrado por presidir a este pequeno-almoço de trabalho que, a pretexto da visita de Estado que estou a efectuar a França, dará a oportunidade aos empresários dos nossos dois países de procederem a uma troca de impressões sobre algumas das questões que estão no âmago das nossas preocupações.

Comigo estão aqui responsáveis associativos e empresários que, em diversas capacidades, conhecem e se relacionam com a França. E a importância dos laços económicos luso-franceses imprime oportunidade acrescida a uma reflexão conjunta sobre os desafios que as nossas economias enfrentam e, naturalmente, sobre as possibilidades de maior cooperação e cruzamento de interesses.

No Conselho Europeu de Lisboa, de Março de 2000, a União Europeia definiu uma estratégia assente no conhecimento, no crescimento económico e na coesão social.

Desde então, aquilo que ficou conhecido como a "estratégia de Lisboa", com as adaptações e precisões subsequentes, tem constituído a principal referência nas discussões sobre as políticas económicas e sociais da União Europeia. Aproveito esta ocasião para relembrar o contributo, ainda hoje reconhecido, que Portugal deu na sua definição, e de que nos orgulhamos.

A ciência e a experimentação, a razão crítica e a circulação alargada de informação deram origem a uma nova fase da vida da humanidade que trouxe – e cada vez mais traz – mudanças e avanços radicais em todos os domínios. Por este motivo, o que os países têm de mais precioso reside na sua capacidade de inventar, de descobrir, de realizar e de transformar.

Aliás, e como em Portugal bem sabemos, depois do euro deixou de ser possível recorrer à desvalorização cambial para ganhar competitividade-preço e assim estimular as exportações; por outro lado, a liberalização do comércio mundial também já praticamente inviabilizou a competição em actividades de baixos salários. Consequentemente, a recuperação da economia em geral, e das exportações, em particular, tem de se fazer agora através de ganhos de competitividade assentes, fundamentalmente, na produtividade e na inovação.

Para melhorar o desempenho da economia e aumentar a capacidade produtiva, há que apostar fortemente em investimentos intensivos em capital e tecnologia, na qualificação dos recursos humanos, na eficiência e na regulação dos mercados e nas necessárias infra-estruturas materiais.

A discussão dos problemas económicos e financeiros da Europa tem estado demasiado centrada no Pacto de Estabilidade e Crescimento, hoje felizmente já revisto, como há muito publicamente defendi. Mas a redução dos défices orçamentais impõe-se, sobretudo, para se poder suportar melhor o previsível aumento das despesas sociais com a saúde e a segurança social decorrente do envelhecimento e do aumento da esperança de vida da população; e impõe-se ainda para que, no futuro, se possa voltar a utilizar a política orçamental para fins de estabilização macroeconómica.

Em Portugal, se a correcção do défice público é o problema financeiro mais urgente, a eliminação dos défices de produtividade e de competitividade é o principal desafio da economia, pois só assim é possível evitar o risco de empobrecimento relativo do País e retomar e manter uma boa trajectória de convergência para o nível de prosperidade dos nossos parceiros comunitários mais desenvolvidos.

Actualmente uma economia competitiva não é a que se baseia em baixos salários, mas sim a que dispõe de um sistema produtivo moderno, inovador e tecnologicamente avançado, capaz de produzir bens e serviços de qualidade e bem valorizados nos mercados internacionais.

E, embora os Estados tenham um papel importante na criação dos ambientes propícios, nada substitui nem dispensa a visão, a capacidade de organização e a liderança dos empresários.

No espaço de poucas décadas, assistimos a uma enorme diversificação e aceleração das interconexões entre espaços nacionais, com vastíssimas consequências económicas, sociais, institucionais e culturais.

A pressão competitiva atinge quase todos os mercados de bens e serviços, e a deslocalização de actividades ocorre cada vez com maior frequência. Mas se é indiscutível que isto origina a necessidade de flexibilizar as gamas de produtos e dos processos tecnológicos e de criar redes empresariais ágeis, daí decorre a necessidade de reinventar os direitos sociais e de os articular com as exigências de mais profissionalismo e com uma visão global dos processos produtivos, no quadro de modelos organizacionais e de gestão mais abertos e participados, de forma a minimizar os custos das transformações.

Numa sociedade em que a empresa desempenha um papel fundamental como criadora de riqueza, como geradora de iniciativas, como impulsionadora da investigação e do desenvolvimento, como fonte de emprego (que é condição de dignidade para a maior parte da população activa), aquela não pode alhear-se da realidade social que, na prática, tão decisivamente condiciona.

Esta intervenção deve resultar do entendimento de que a responsabilidade social constitui hoje um pilar da estratégia e da organização das empresas e uma componente imprescindível da qualidade e da excelência empresariais, da gestão de recursos humanos, da comunicação, da imagem e do marketing. Foi este o entendimento perfilhado por algumas das principais empresas mundiais, laborando com base num sistema “tridimensional” de resultados de natureza financeira, de natureza ambiental e de natureza social. Algumas empresas portuguesas prosseguem já este caminho que, estou certo, dentro de poucos anos será indiscutível e irrecusável.

Muito haverá, aliás, certamente, a clarificar nas discussões acerca da globalização e da competitividade, bem para lá dos pressupostos simplistas de teses em voga segundo as quais as economias (e as sociedades) nacionais seriam, ou deveriam ser, geridas como se de companhias e empresas no mercado global se tratasse. As determinantes da produtividade – infra-estruturas, educação, investigação - e as escolhas das políticas de receita e despesa públicas, no quadro das funções do Estado, não são realidades unidimensionais ou de eixo único e não podem ser discutidas sem as relacionar com os objectivos e preferências dos cidadãos nas sociedades democráticas.

Dito isto, deixem que coloque em cima da mesa três questões para ajudar ao debate:

• Em primeiro lugar, a questão do alargamento da União e em que medida ele permite um reforço das condições de êxito para a Estratégia de Lisboa e a manutenção do "acquis communautaire".

• Depois, como é que os responsáveis empresariais encaram o impacto das transformações globais em curso, incluindo a emergência da China e da Índia, nas deslocalizações industriais, e destas na modernização da economia europeia, sem perder de vista os seus equilíbrios sociais.

• E, finalmente, de que forma é que se podem incrementar os laços económicos entre os nossos dois países, levando em conta a longa tradição de conhecimento mútuo, a qualidade e adaptabilidade da mão-de-obra portuguesa mais qualificada e a existência de áreas onde está por explorar o potencial existente.

Agradeço a vossa paciência e serei, a partir de agora, um ouvinte interessado - e, se necessário, participante! - no vosso debate.