Discurso do Presidente da República por ocasião da Sessão de Abertura do 1º Congresso Nacional dos Economistas

Porto
27 de Outubro de 2005


Exmo. Senhor Professor António Simões Lopes
Exmo. Senhor Dr. Francisco Murteira Nabo
Senhores Congressistas


Quero começar por saudar a Ordem dos Economistas, nas pessoas do seu primeiro Bastonário, e Presidente da comissão organizadora deste Congresso, Professor António Simões, e do seu actual Bastonário, Dr. Francisco Murteira Nabo, por esta realização, cuja temática tem um interesse e oportunidade claros, para os economistas, seguramente, mas também para todos aqueles que, directa ou indirectamente, se preocupam com a busca de caminhos viáveis para o nosso futuro colectivo.

Com efeito, é por demais evidente que razões internas e externas nos obrigam a questionar, seriamente, os modelos de desenvolvimento possíveis para o nosso futuro. É, certo que haverá diversas teses em confronto e que esta é uma área onde é impossível – e até indesejável! – qualquer veleidade de unanimismo. É também claro que há um conjunto de restrições objectivas e de metas instrumentais em que a busca e definição de convergências na acção se afigura possível e desejável, até para que se delimite e clarifique o terreno em que o debate de ideias (democrático, diria eu) deve ter lugar, nomeadamente no que se refere ao papel do Estado e da sua relação com os agentes económicos.

Por outro lado, é hoje claro que a nossa economia se defronta com sérios problemas de competitividade. Trata-se, como sabemos, de uma economia completamente aberta e inserida no vasto espaço europeu. Ora, neste contexto incontornável, a viabilidade de qualquer modelo de desenvolvimento passa, inevitavelmente, pela rápida melhoria da competitividade empresarial em muitos sectores e pela ultrapassagem de bloqueios organizativos. Aqui o Estado tem também um papel a desempenhar. Mas, não tenhamos ilusões: a melhoria da competitividade empresarial e a ultrapassagem dos bloqueios, depende, antes de mais, da modernização do tecido empresarial, criticamente assente em maior inovação e em recursos humanos mais qualificados.

Está muito por fazer em relação a tantas matérias fundamentais para o nosso futuro, em que urge realizar debates sérios e orientados para a acção. A verdade é que, muitas vezes, discutimos mais as consequências do que as causas, o curto prazo do que o longo prazo, trocando o estudo e a reflexão pelo sensacionalismo mediático e pela entronização de algumas ideias, feitas de meias-verdades, pouco rigorosas mas convenientes em função de flutuações políticas conjunturais e do imediatismo da informação.

Aos economistas compete muito, creio, contribuir para que a demagogia e o imediatismo não se substituam à seriedade e ao rigor, e procurar chamar a atenção para a interdependência entre muitas questões e para os pontos que lhes são comuns.

Por exemplo, a discussão sobre a necessidade de criar melhores condições para atrair mais investimento, nomeadamente estrangeiro, evidencia a urgência na qualificação dos nossos factores competitivos. E mostra também a necessidade de dotar de sentido estratégico as discussões e opções, por exemplo, em torno de infra-estruturas físicas (o que nem sempre tem acontecido!), do sistema educativo, da modernização da administração pública ou da reforma do sistema de justiça.

E é por isso que – uma vez mais o digo – a par da redução de muitos desperdícios na despesa pública, e de uma profunda modificação de hábitos da Administração, nos seus modos de actuar e de se relacionar com os cidadãos, é essencial prosseguir na busca de maior equidade e no combate à evasão fiscal. Essa preocupação de eficiência e de equidade, pessoal e espacial, estende-se a muitas outras áreas, como a saúde e as finanças locais, devendo a acção do Estado ser permanentemente orientada para a obtenção de mais eficácia na prossecução de objectivos e de maior eficiência em todas as suas funções.

É aliás por isso que o Estado concessiona actividades que, tradicionalmente, lhe competiam directamente. Mas, sobretudo quando estão em causa bens públicos, ou quase-públicos, é preciso que ele se saiba dotar de órgãos de regulação competentes, independentes e eficazes – e isso tanto vale para a saúde como para os mercados financeiros, a energia ou as telecomunicações.

Essa é uma preocupação que deve estar sempre presente nas reformas a empreender, contribuindo para melhorar a transparência e o ambiente competitivo, a todos os níveis, na nossa sociedade.

Como já noutra ocasião afirmei, só com cidadãos mais informados, com uma Administração Pública responsável e diligente, com mercados competitivos mas transparentes, e com agentes económicos cumpridores das regras e da Lei e portadores de capacidade de inovação é que podemos aspirar à superação dos problemas com que nos defrontamos.

O maior desses problemas é, claramente, o da qualidade dos nossos factores produtivos. A melhor qualificação dos portugueses, a todos os níveis, onde quer que actuem, empresários e trabalhadores, quadros e gestores, é absolutamente indispensável para acelerar os processos de inovação e a sua difusão, a nível científico, técnico e organizativo, condição essencial para a melhoria da produtividade e da competitividade do nosso tecido empresarial.

Ao longo dos meus dois mandatos como Presidente da República tenho procurado incessantemente mobilizar os portugueses para estes desafios da qualificação (incluindo a formação ao longo da vida) e da inovação, no que felizmente fui sentindo um apoio crescente que levou, aliás, à criação da COTEC, que procura ser um catalisador das energias do mundo da investigação aplicada e de algumas das maiores empresas que actuam em Portugal.

Mas, se a inovação surge como uma condição essencial para a mudança, ela tem que assentar muito mais do que até aqui numa aposta clara dos empresários portugueses, orientada para a criação de produtos e mercados, e apoiada numa clara e selectiva definição de objectivos e das entidades responsáveis, pondo todos os agentes da inovação a cooperar, sem perder de vista os espaços mais vastos, nomeadamente o europeu, em que nos inserimos.

É por isso que, para além da sensibilização das empresas para a urgência de mais investimento reprodutivo em investigação e desenvolvimento, numa estrutura empresarial assente em pequenas e médias empresas as perspectivas de mais e melhor inovação passam necessariamente pela articulação dos sistemas científico e tecnológico, empresarial e financeiro, que condicionam e viabilizam estratégias governamentais e empresariais.

Minhas Senhoras e meus Senhores:

Este vosso Congresso, pelo momento em que se realiza e pela oportunidade dos seus temas centrais, “modelo de desenvolvimento” e “competitividade empresarial”, tão interligados, constituirá, estou certo, uma oportunidade excelente para que os vossos conhecimentos e reflexão possam ser postos ao serviço do nosso futuro, na tradição de uma profissão que, em boa verdade, se começou a afirmar em período coincidente com o início da modernização da nossa economia, em meados do século passado.

E embora haja quem diga que os economistas são melhores a explicar o passado do que a prever ou a prescrever para o futuro, ouso pedir-lhes que pelo menos sejam claros na análise, para que todos possamos, cada vez mais, saber o que temos a fazer pelo País e não tanto o que esperamos que ele faça por nós!

Desejo-vos umas úteis jornadas de trabalho e repito o meu agradecimento à Ordem dos Economistas o convite que me fez para estar aqui hoje, e que me vai fazer ficar especialmente atento ao que aqui se passar.