Discurso de SEXA PR por ocasião da Sessão de Abertura do VI Foro Iberoamerica

Hotel Tivoli, Lisboa
03 de Novembro de 2005


Senhores Co-Presidentes do Foro IberoAmerica,
Minhas Senhoras meus Senhores,

Começo por agradecer o convite que me foi endereçado para estar na sessão de abertura deste VI Foro IberoAmérica. Queria felicitar os organizadores pelo número e, sobretudo, pela qualidade dos participantes neste encontro que são, por si só, nos sectores da política, da cultura, da economia, uma garantia de sucesso.

Tive ocasião de participar, há pouco mais de quinze dias, na XV Cimeira Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, realizada em Salamanca. Fiz, na altura, uma intervenção em que combinei aspectos de balanço deste 15 anos do processo ibero-americano com aspectos relativos ao futuro. Gostaria aqui de vos referir os principais aspectos que mencionei nessa intervenção.

A América Latina e a Península Ibérica caminharam de forma desencontrada durante muitas décadas. No pós II Guerra Mundial, os países da América Latina participaram activamente, enquanto nações democráticas, no processo de criação da ONU. Em Espanha e Portugal viviam-se tempo de ditadura.

Quando mais tarde, nos anos 70, se começaram a respirar ares de liberdade e democracia na Península Ibérica, estava a maioria dos países do outro lado do Atlântico submetida a regimes autoritários. Só no início dos anos 90, beneficiámos em conjunto da democracia, podendo aspirar, mais facilmente, a projectos conjuntos. Nasceu, por essa altura, e foi lançado o conceito/processo ibero-americano.

Nestes 15 anos percorreu-se um longo caminho. Estive em 9 das 15 Cimeiras Ibero-Americanas (“feito” só ultrapassado pelo Rei de Espanha..!) e por isso estou numa posição privilegiada para avaliar a evolução e a estruturação deste espaço político.

A conferência ibero-americana tem duas especificidades que lhe conferem uma natureza e uma identidade muito particulares: i) a bi-regionalidade transatlântica (combina América Latina e Europa); ii) e o facto de somar as componentes hispânica e lusófona.

E são estas duas características que fazem do espaço ibero-americano aquilo que ele é e aquilo que ele tem de específico e de distintivo. Não podemos, nem devemos perder, em qualquer circunstância ou estádio de desenvolvimento desta comunidade, este aspecto de vista. O caminho no sentido da unidade, que podemos e devemos aprofundar e consolidar, deve ser feito no respeito pela diversidade, quer cultural – esta comunidade seria outra coisa sem o Brasil e sem Portugal - , quer no plano do apoio e da promoção aos diferentes processos de integração regional. A nossa acção deverá ser sempre orientada por estes princípios.

Minhas Senhoras e meus senhores,

Fui actor e testemunha dos laços de amizade política e pessoal que as reuniões anuais de Chefes de Estado e de Governo proporcionam. A capacidade de potenciar a solidariedade política em todo um espaço e as oportunidades económicas e de afirmação cultural foram e são elementos chave, que foram contagiando as nossas sociedades civis, como é bem evidente neste Foro.

O processo foi ganhando corpo e maturidade, tendo atingido, na Cimeira de Salamanca, a idade adulta com a chegada da institucionalização, quer formal, através da criação de uma Secretária-Geral, quer, mais informal, através de um conjunto de eventos cívicos, económico-empresariais e culturais organizados em torno da Cimeira, assegurando a sua ligação à sociedade civil e dando dimensão real à ideia de comunidade ibero-americana.

Chegados a este ponto, é minha convicção que a ideia da comunidade ibero-americana foi já absorvida pela sociedade civil, designadamente pelo agentes económicos, culturais e académicos e que, no plano político-institucional, dispõe finalmente das ferramentas para poder dar um salto qualitativo.

Permitam-me aqui um aparte de quem, não sendo decisor na altura em que foi tomada a decisão política de Portugal participar nesta comunidade, sempre acreditou nas virtualidade e potencialidades deste processo, quer em geral, quer especificamente para Portugal, desde que saibamos ser activos e mesmos agressivos, se necessário. Em suma, competitivos.

Creio que no presente ciclo de globalização, que é policêntrico e multidimensional, a comunidade ibero-americana pode constituir um pólo de intercâmbios não só com produção de resultados entre os seus membros, mas também com irradiação para o exterior.

Deixava aqui três propostas ou três áreas nas quais, na minha opinião, esta comunidade, este novo espaço, deve apostar e pode ter um papel.

Em primeiro lugar, a vertente económico-empresarial. Creio que, por um lado, os bons resultados macro-económicos registados globalmente na América-Latina nos últimos anos, resultantes do processo de reestruturação económica iniciado nos anos 90: redução do défice público, controlo da inflação, boas taxas de crescimentos do PIB e início dos processos de integração regional. É facto que este crescimento económico não foi acompanhado de uma redução substantiva da pobreza e de uma correcção das desigualdade sociais.

E, por outro lado, o crescimento e desenvolvimento de Portugal e Espanha, bem como a sua pertença à União Europeia permitem aqui - pese embora o razoável plano de ligação económica já atingido entre o conjunto dos nossos países - maior ambição. Bastaria referir, a título de exemplo, que Espanha exporta mais para Portugal do que para o conjunto da América Latina. Devem, por isso, ser aproveitadas as sinergias criadas no plano político para explorar o enorme potencial existente e aprofundar as parceria económicas.

Em segundo lugar, os planos cultural, académico e científico. Pela força das culturas e das duas línguas desta comunidade, parece-me que deverão ser analisadas e exploradas, de forma mais agressiva, as questões relacionadas com a difusão internacional das nossas culturas e das nossas línguas. Não podemos esquecer que o espanhol e o português são, respectivamente, a segunda e a terceira língua europeia mais faladas no mundo. Esse é um património extraordinário. A cooperação universitária que resultará da eventual criação de um Espaço Ibero-Americano do Conhecimento (referido em Salamanca), parece-me igualmente uma área de grande potencial. Temos de valorizar os aspectos relacionados com a cooperação científica, inter-universitária e a inovação. Vivemos numa época em que a ciência e o conhecimento são a chave do progresso económico.

Em terceiro lugar, a vertente política. A comunidade ibero-americana não dispõe dos instrumentos resultantes de um elevado grau de integração, como é o caso da União Europeia e tem, por isso, naturais limitações. No entanto, pode assumir um papel mais visível e activo na cena internacional. Pode aprofundar os seus mecanismos de concertação política e ambicionar o estatuto de actor, nas áreas em isso seja possível e compatível com outras alianças pré-existentes, no sistema internacional. A recente experiência de coordenação e liderança no processo de estabilização do Haiti foi disso uma prova evidente. A comunidade poderá pois afirmar-se como interlocutor junto da ONU, num claro exemplo do multilateralismo do século XXI.

Termino com um palavra de confiança no futuro deste espaço, que contribuiu já, em muito, para o reforço das relações de Portugal com a América-Latina e com uma saudação ao promotores desta interessante iniciativa, desejando a todos sucesso nos trabalhos dos próximos dias.