A Egas Moniz

Estarreja (Por ocasião do 50º Aniversário de atribubição do Prémio Nobel)
27 de Outubro de 1999


Quero agradecer as evocações de Egas Moniz e da sua obra que aqui pudemos ouvir e que somada àquela que a partir de agora podemos ler, da autoria do Prof. Lobo Antunes, permitem às actuais gerações conhecer melhor a personalidade multifacetada de um notável intelectual e cientista
Agradeço igualmente à Câmara Municipal de Estarreja esta oportuna iniciativa de lembrar um dos grandes portugueses deste século, Egas Monioz, no momento em que passam 50 anos sobre a atribuição de um dos mais prestigiados galardões internacionais, o Prémio Nobel.
Associando-me a esta homenagem, gostaria de referir três dos aspectos que conferem a esta comemoração um especial significado.
Em primeiro lugar, este primeiro Nobel – e hoje podemos felizmente dizer este nosso primeiro Nobel, que foi durante quase cinco décadas o único – distingiu uma figura da Medicina, o que é indicador do desenvolvimento que esta disciplina tinha atingido em Portugal e da recuperação que em dominios tão sensíveis como era o da fisiologia do sistema nervoso esse desenvolvimento tinha logrado no exterior. Do grupo de médicos que foram alunos ou trabalharam com Egas Moniz fazem parte nomes notabilissimos da Medicina com João Lobo Antunes, Barahona Fernandes, Almeida Lima, etc.
Em segundo lugar, o Nobel foi atribuído a um investigador científico, a um homem de ciência que deixou um legado de probidade e de convicção sobre o papel crucial da ciência e do espirito cientifico na modernização das sociedades.
Finalmente, vale a pena insistir que a uma curiosidade insaciável, que o levou a interessar-se pelas mais diversas áreas da criatividade humana, Egas Moniz aliava um gosto pela vida política, que aliás o levou a desempenhar funções do maior relevo, como deputado (tanto na Monarquia, como durante a República), Ministro e representante do Governo na Conferência de Paz constituída a seguir à Primeira Guerra.
A sua formação liberal e independência de cidadão nunca se conciliaram com a Didatura de Salazar e o salazarismo e por isso o nosso primeiro Nobel não obteve do regime de então o reconhecimento e a gratidão merecidas.
Ainda bem que a democracia o pode fazer. E atrevo-me por isso a sugerir que o Governo, através dos ministérios competentes, estabeleça neste cinquentenário um programa de divulgação entre os jovens da obra de Egas Moniz e sobretudo da sua defesa e promoção do espirito cientifico.
Esse constituiria creio um belo ensejo para perpetuar a memória do nosso primeiro Nobel e prestar atributo à actualidade do seu magistério.
Podemos imaginar a determinação e exigência que foram necessárias a investigadores da estripe de um Egas Moniz para vencer o isolamento do país e das suas instituições culturais, a falta de visão e o miserabilismo das suas classes dirigentes.
Hoje que Portugal reencontrou um caminho de relacionamento aberto e de cooperação com outros povos e que definiu uma nova prioridade para a ciência, o exemplo pioneiro de Egas Moniz tem direito a fazer parte do nosso património mais honroso.