Visita à Fábrica da Vista Alegre (Jornada da Inovação e da Competitividade)


04 de Fevereiro de 1997


Permitam-me, minhas senhoras e meus senhores, que aproveite esta pausa na visita que ontem iniciei a empresas e Universidades do País, para vos transmitir não só algumas das ideias-força que presidiram a esta iniciativa, como outras tantas reflexões suscitadas pelos contactos que já efectuei.
Antes porém quero manifestar o meu vivo agradecimento ao Grupo Vista Alegre que aqui nos acolheu com toda a hospitalidade e simpatia.

Como resulta da história contada no Museu da Fábrica, que acabo de visitar, a Vista Alegre é um caso sem paralelo de longevidade empresarial. sustentando uma posição singular num sector industrial para o qual contribuiu com inovação e prestígio internacional.

Não posso deixar de exprimir a minha admiração por esse extraordinário património da história da técnica e da indústria portuguesa e fazer votos para o êxito da empresa que hoje enfrenta certamente novos reptos.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Como é sabido a cerâmica industrial portuguesa é um sector dinâmico, fortemente exportador, que na última década encetou uma profunda restruturação, em boa parte induzida pelos desafios da competitividade provindos de áreas externas à União Europeia. Muitos industriais compreenderam, em face da concorrência de produtos cerâmicos oriundos do Sudoeste Asiático, que a defesa de posições nos mercados europeu e norte-americano impunha uma forte incorporação no processo cerâmico industrial não apenas de tecnologia avançada, mas também da componente inovação ao nível do design.

A cerâmica constitui um dos exemplos de sector em que à disponibilidade de matérias-primas em território português se alia uma certa especialização regional (como é o caso da região de Aveiro onde desde o século xviii pelo menos se produz cerâmica) e a existência de alguma formação assegurada pelo sistema de aprendizagem oficinal transmitida de geração em geração.

As vantagens competitivas dependem hoje porém sobretudo da qualidade dos produtos finais, tal como é assegurada pelos processos de fabrico e respectivo controlo, pelo design, tudo isto supondo o funcionamento de uma exigente formação profissional.

Uma atitude de priorização dos factores qualitativos da competitividade é indispensável para construir uma economia saudável que enfrente com êxito os desafios do próximo milénio.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

O tema geral que presidiu à organização desta semana pode sintetizar-se na fórmula Inovação e Competitividade e não será difícil perceber, pelo tipo de iniciativas já concretizadas ou previstas para os próximos dias, que pretendo, através delas, chamar a atenção para a importância crucial que a modernização e a expansão das estruturas produtivas nacionais têm na definição do nosso futuro colectivo.

Perceber-se-á, ainda, creio eu, com clareza, que também desejo transmitir, ao longo destas jornadas, outra ideia-força: a de que esse processo de desenvolvimento económico tem muito a ganhar com uma ligação forte das empresas à investigação científica e tecnológica e, portanto, à actividade realizada em centros de pesquisa e Universidades do País.

Na actual fase de integração da economia portuguesa na Europa Comunitária, está em jogo a possibilidade de reconvertermos o nosso padrão de especialização produtiva, isto é, de darmos
o salto qualitativo que atenue conhecidas vulnerabilidades e dependências económicas do País.

Ora, nesta fase um dos trunfos fundamentais que teremos de ter à nossa disposição, e impor no xadrez da concorrência internacional, diz respeito à capacidade de mobilizar conhecimentos avançados em todos os domínios do saber que, directa ou indirectamente, se relacionam com o desenvolvimento da base tecnológica e com a mudança organizacional das empresas.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Vários indicadores revelam, sem sombra para dúvidas, que, não obstante se ter verificado uma expansão significativa do nosso sistema de investigação nas duas últimas décadas, continua a ser baixo o potencial científico-tecnológico do País e, pior do que isso, permanece particularmente escasso, relativamente aos padrões já atingidos noutros países europeus, o contributo específico do sector empresarial nestedomínio.

Um dos argumentos frequentemente invocados para justificar o alheamento de muitas unidades produtivas nacionais relativamente aos desafios da inovação tecnológica e organizacional é de que uma grande parte das empresas portuguesas tem problemas cuja resolução é incompatível com investimentos, não rendibilizáveis no curto prazo, em recursos científicos e tecnológicos.

O argumento não poderá em absoluto ser contestado. A verdade porém é que, num contexto económico em mutação permanente como o que actualmente se vive, tais desafios já estão, de facto, colocados e não será fácil contorná-los.

A ideia de que é às Universidades, instituições que tradicionalmente mais se identificam com os desígnios do progresso cien tífico, que compete, em exclusivo, fazer avançar o conhecimento e buscar a inovação é a outra face da argumentação utilizada para adiar alguns impulsos de modernização fundamentais.

Ora, o que durante estes quatro dias de contacto com o nosso mundo empresarial e universitário gostaria que ficasse demonstrado é que o relacionamento entre as instituições de base da actividade económica — que são as empresas — e as instituições de base da investigação científica (que são, sobretudo, os estabelecimentos do ensino superior) é não apenas desejável, como
— face aos resultados entretanto conseguidos — absolutamente possível.

Já existem, um pouco por todo o País, experiências capazes de revelar as vantagens de uma colaboração sistemática entre os que, no terreno, enfrentam as vicissitudes e dificuldades práticas de afirmação num espaço concorrencial muito agressivo e os que, nos lugares mais protegidos da instituição universitária, têm, de facto, maior disponibilidade intelectual para equacionar problemas e propor soluções inovadoras e fundamentadas no plano científico.

Sei que tem havido dificuldades nas ligações entre estes dois mundos. Estou convencido, no entanto, de que se trata de dificuldades francamente ultrapassáveis.

Ontem em Évora, hoje em Aveiro pude verificar que há domínios onde o entrosamento já deu frutos. Aproveito, aliás, para, da mesma forma que o fiz em Évora felicitar a Universidade de Aveiro, uma jovem Universidade, pelos projectos que vem realizando em áreas de incidência positiva na modernização empresarial.