Almoço oferecido aos participantes nas Reuniões Ministerias do Conselho do Atlântico Norte e do Conselho Euro-Atlântico da Parceria

Palácio Nacional de Queluz
30 de Maio de 1997


Ao desejar-vos as boas vindas, em nome de Portugal e no meu próprio, gostaria de salientar, antes de mais, o significado e a honra que representa para o meu país acolher as reuniões do Conselho do Atlântico Norte e do Conselho Euro-Atlântico de Parceria, que hoje mesmo foi institucionalizado.
Não posso deixar de sublinhar o particular alcance de que se reveste a criação deste novo forum e as possibilidades acrescidas que oferece a uma cooperação política e militar cada vez mais estreita entre todos os parceiros da área euro-atlântica.
Com a Cimeira da OSCE de Lisboa - e o importante impulso que foi então dado à revisão do Tratado sobre Forças Armadas Convencionais na Europa - iniciou-se um ciclo de importantes reuniões destinadas a definir aquilo a que chamaria uma fórmula de estabilidade e de segurança para o novo mapa político da Europa resultante do reencontro pleno de todos os seus Estados com a democracia e com os valores essenciais da nossa civilização.
Nunca, como até agora, existiram condições tão propícias para consolidar o espírito de confiança e de cooperação entre todos os países europeus e de reforçar decididamente as condições da paz e da segurança na Europa.
Mas é também necessário reconhecer que a indispensável reestruturação dos equilíbrios estratégicos se processa em condições de incerteza e de crise.
Temos como obrigação garantir às novas gerações de europeus as condições que lhes permitirão aprofundar a democracia em toda a Europa, construir sociedades mais desenvolvidas e mais justas, prevenir crises e conflitos, garantir a paz.
Hoje em Sintra, amanhã em Madrid, no Conselho Europeu de Amsterdão, na Cimeira do Conselho da Europa em Outubro, as organizações europeias e ocidentais são chamadas a concretizar essa esperança de paz, de liberdade e de progresso.
Neste sentido, que me seja permitido salientar, pelo seu alcance e significado histórico, o acordo que acaba de ser assinado em Paris entre a Organização do Tratado do Atlântico Norte e a Federação da Rússia.
Trata-se, sem dúvida, de um bom acordo, assente em princípios sólidos, que reiteram o nosso comum empenho na defesa dos valores da liberdade, do direito e da democracia pluralista, da indivisibilidade da segurança euro-atlântica e da renúncia ao recurso à força e à própria ameaça do uso da força nas relações entre a comunidade transatlântica e a Rússia.
Desde logo, o “acto fundador” que passou a reger as nossas relações, representa um marco no caminho da reconciliação entre antigos adversários, estabelecendo os princípios e os quadros institucionais apropriados para a reinserção da Rússia num espaço comum, reconhecendo os seus legítimos interesses de segurança.
Neste sentido, o acordo de Paris traduz a nossa determinação de não criar novas divisões, prejudiciais à paz e à democracia na Europa.
Por outro lado, cria as melhores condições para prosseguir o processo de alargamento da OTAN e a inclusão das novas democracias europeias na nossa comunidade de defesa colectiva.
Por último, o acordo alcançado preserva a autonomia e os pressupostos essenciais que asseguram a continuidade da Organização como o garante insubstituível da defesa colectiva dos Aliados.
Senhor Secretário-Geral
Senhores Ministros
Creio ser esta uma boa altura para reflectir sobre o longo caminho percorrido desde a fundação da Aliança Atlântica, tanto mais quando se pressente, nas opiniões públicas, algumas interrogações sobre a sua importância no momento presente.
Ironicamente, a mesma atitude era corrente quando se concluiu o Pacto do Atlântico Norte. Poucos - muito poucos - anteciparam o papel fundamental que a Aliança Atlântica viria a ter nas décadas seguintes, e ainda menos a sua excepcional duração.
Não foi por acaso, certamente, que Dean Acheson chamava a atenção para os dois temas de Gershwin tocados aquando da assinatura do Tratado de Washington: “ I’ve got plenty of nothin’ “ e “It ain’t necessarily so”. Não se tratava, de facto, do melhor augúrio para uma aliança que estava a dar o seu primeiro passo, depois de uma longa e difícil negociação.
E, todavia, a Aliança Atlântica foi bem mais além do que admitiam as previsões dos mais optimistas de entre os seus fundadores.
Tal foi possível não apenas pela capacidade constante e efectiva que demonstrou, durante quarenta anos, para fazer face à ameaça que justificara a sua criação, garantindo a liberdade dos Estados da Europa Ocidental; mas também porque as décadas de cooperação política e militar efectiva serviram igualmente para institucionalizar uma comunidade de segurança transatlântica, assente numa herança civilizacional comum e na partilha dos valores da liberdade, da democracia e do direito, bem como numa afinidade crescente dos regimes políticos e dos modelos económicos.
Por esta via, a Aliança tornou-se sinónimo de segurança regional e parte integrante das políticas de defesa de todos os seus Estados membros.
E foi também por esta via que, uma vez desaparecida a União Soviética, reunificada a Alemanha e consolidadas as novas democracias europeias, uma nova Aliança se encontrava pronta para exercer o seu papel decisivo na reestruturação dos equilíbrios europeus.
Mas não podemos esquecer que o triunfo da democracia pluralista na Europa não foi linear nem que a segurança europeia pode ser considerada como um dado adquirido.
O regresso da guerra e as trágicas consequências da dissolução da antiga Jugoslávia - perante as quais nos revelámos, em larga medida, impreparados - constituem avisos sérios, tal como devemos ponderar os riscos e as ameaças decorrentes da persistência de tensões no nosso continente.
Permitam-me que recorde as mulheres e os homens da nossa Aliança que, juntamente com militares da Rússia, dos nossos parceiros de cooperação, de países da margem sul do Mediterrâneo, se encontram na Bósnia-Herzegovina para garantir a paz e a segurança, o respeito pelos direitos humanos e pelas minorias, a reconstrução económica e a reabilitação social.
A todos, sem excepção, presto aqui uma sentida homenagem e expresso o nosso sincero reconhecimento.
Permitam-me igualmente que faça um apelo solene, em nome de todos os nossos Estados, a que os responsáveis políticos das repúblicas oriundas da ex-Jugoslávia - alguns dos quais me honram hoje com a sua presença - se empenhem decididamente para que prevaleça o diálogo e a tolerância entre todos os povos da região, para que se calem definitivamente as armas, para que vença finalmente a paz, a estabilidade, a democracia e o progresso nesta tão martirizada parcela da Europa.
Estou certo que o seu empenho será correspondido pela Comunidade Internacional, como o atestam a determinação e os esforços do seu Alto Representante, assim como o comprometimento directo da União Europeia e da Aliança Atlântica.
Senhores Ministros,
Excelências,
Os passos seguintes estão claramente traçados. Em Julho, em Madrid, terá início a primeira fase do alargamento da Aliança Atlântica, será concluído o acordo entre a OTAN e a Ucrânia, que reputo da maior importância para a estabilidade política da Europa, e ficará completa a reforma das estruturas internas.
Por outro lado, espero que a Conferência Inter-Governamental possa dar um contributo importante para a definição das relações entre a União Europeia e a União da Europa Ocidental, que se avance rapidamente no sentido de dar corpo à Identidade Europeia de Defesa e de Segurança, para consolidar as relações entre as principais instituições multilaterais e euro-atlânticas.
Estou certo que todos os Aliados europeus têm uma consciência clara das suas responsabilidades acrescidas na segurança regional e, por outro lado, que os Estados Unidos valorizam a importância de uma maior autonomia dos seus Aliados na resposta a situações de crise, designadamente nas fronteiras da Europa, sem prejuízo da indispensável coesão da OTAN.
Enfim, o termo da Conferência Inter-Governamental marcará o início do processo de alargamento da União Europeia ao conjunto das democracias europeias, indispensável para realizar o velho ideal da unidade da Europa. E, logo a seguir, a passagem à terceira fase da União Económica e Monetária dará, com a moeda única, um impulso decisivo ao processo de integração europeia.
Os próximos meses vão pôr à prova a capacidade de orientação dos responsáveis políticos e a qualidade das instituições europeias e euro-atlânticas. Pela minha parte estou confiante.
Portugal, país fundador da Aliança Atlântica, membro da União Europeia e da União da Europa Ocidental, está profundamente empenhado na definição do quadro de segurança do post-guerra fria e na consolidação da nova Organização do Tratado do Atlântico Norte.
Continuaremos, como até aqui, a dar a nossa colaboração activa para a prossecução deste desígnio.
Um século de guerra e de destruições, que pôs em causa a própria sobrevivência da Europa, ensinou-nos a reconhecer o valor da paz, da estabilidade e da democracia.
Essa memória, inscrita na fundação da Aliança Atlântica e da União Europeia, continua a ser a linha certa que traça o bom caminho nas encruzilhadas do nosso futuro comum.
Peço a todos que me acompanhem num brinde pela prosperidade de todos os povos aqui representados, pela Aliança Atlântica e pela Parceria Euro-Atlântica.