Semana da Educação - Jantar com Associações de Pais

Porto
19 de Janeiro de 1998


Neste dia tenho chamado a atenção para o facto de a educação ser uma das mais importantes responsabilidades sociais do nosso tempo. Visitei jardins de infância e escolas do ensino básico. Contactei com actividades associativas de formação de jovens que abandonaram a escolaridade obrigatória. Participei na assembleia constituinte de um conselho local de educação. Ao terminar com este jantar com as associações de pais, quero pôr em evidência a função educativa que lhes compete.
A ideia de escola tem vindo a transformar-se. Num passado recente, o tempo escolar começava aos 6-7 anos e, regra geral, não ia além dos 11-12 anos. Hoje, a educação tende a ser concebida ao longo de toda a vida, começando com as aprendizagens iniciais do bébé. A escola não pode constituir uma “interrupção” neste acompanhamento pelos pais dos percursos educativos dos seus filhos. O apelo à responsabilidade social não teria sentido se não contemplasse o direito de as famílias participarem na definição das políticas de educação e no governo das escolas.
Há três aspectos para os quais gostaria de chamar a vossa atenção.
Em primeiro lugar, quero referir-me ao papel dos pais na criação de ambientes sociais e familiares que valorizem a educação e a cultura. Não tenhamos ilusões. A escola não pode substituir as condições que não existem na sociedade. Nenhum esforço educativo terá êxito se não puder contar com a colaboração de comunidades que facilitem e estimulem as aprendizagens. É impossível afirmar um conjunto de intenções na escola, se elas forem diariamente postas em causa no seu exterior: seja em relação à cultura ou à violência, à ecologia ou ao racismo, aos valores morais ou às regras de vida em sociedade, ...
Em segundo lugar, permitam-me que chame a atenção para a importância da presença dos pais na escola. O vosso movimento associativo já percorreu um longo caminho. Mas há ainda muito a fazer para encontrar os modelos mais adequados à nossa tradição e às novas necessidades educativas. É útil que a intervenção dos pais não tenha como motivação única a defesa dos interesses dos seus filhos. Cada pai tem o direito – e o dever – de seguir de perto o trabalho escolar. Mas parece-me particularmente importante realçar o papel que os pais podem desempenhar na transformação das escolas em espaços de trabalho e de vivência democrática, em espaços onde dê gosto ensinar e aprender. Para tal, é necessário que assumam tarefas significativas, no quadro de uma partilha de responsabilidades pela acção educativa. As escolas portuguesas devem ser um dos lugares privilegiados de participação social e de exercício da cidadania, o que obriga a criar condições efectivas para uma maior presença dos pais.
Em terceiro lugar, gostaria de sublinhar que uma associação de pais é um grupo de cidadãos que tem uma determinada visão da escola. O seu papel não é apenas a protecção dos interesses individuais, mas sobretudo a participação na construção de uma verdadeira comunidade educativa. É nesta perspectiva que eles devem ter voz activa no governo das escolas, promovendo o valor social e cultural da educação. Estamos perante uma acção claramente política, uma vez que na busca do sentido da Escola se confrontam, inevitavelmente, diferentes projectos de sociedade.
Eis três pontos que me parecem muito importantes. Mas nunca devemos esquecer um aspecto fundamental, que é o respeito pelo processo de desenvolvimento de cada aluno. Num certo sentido, ninguém forma ninguém. Cada um forma-se a si próprio, segundo ritmos e opções pessoais. Compete-nos apoiar, estimular e acompanhar este processo. Sem pôr em causa a individualidade dos jovens, as suas escolhas e decisões.
Vivemos um tempo marcado por grandes mudanças na administração do ensino e na organização das escolas. Tradicionalmente, os pais eram chamados apenas para tomarem conhecimento do insucesso ou da indisciplina dos seus filhos. Constituíam, para todos os efeitos, um “corpo estranho” ao funcionamento do sistema. Hoje, ninguém lhes nega os seus direitos próprios e um poder de decisão em matéria educativa. São parceiros insubstituíveis, solidários no esforço de melhoria da imagem da escola e da qualidade do ensino.
Mas é bom lembrar que o êxito de qualquer dinâmica de colaboração passa pelo respeito de todos os intervenientes. A maior presença dos pais no espaço escolar deve contribuir para um reforço do prestígio, das competências e da autonomia profissional dos professores. Uma parceria eficaz implica que cada um saiba exactamente qual é a sua missão e esteja disposto a prestar contas do seu trabalho. Então, as vantagens da partilha e da cooperação tornar-se-ão evidentes. E cada parceiro aprenderá a tirar partido da acção do outro.
Não basta que cada um resolva, o melhor possível, os seus problemas. O apelo que vos faço é mais amplo. É um apelo à vossa consciência como cidadãos. Peço-vos que apoiem as comunidades locais a darem mais valor à educação e à cultura. Peço-vos que colaborem com as escolas para que cumpram melhor a sua missão. O futuro depende dos compromissos sociais que formos capazes de estabelecer em torno da formação das novas gerações. Agradeço-vos a dedicação e a energia que têm posto nesta causa. Sabem, como eu, que o nosso destino se joga todos os dias no esforço de educar as nossas crianças e os nossos jovens.