Inauguração do Sintra Museu de Arte Moderna

Sintra
17 de Maio de 1997


Assinalamos um momento de particular significado na vida cultural portuguesa, como certamente sentem todos os que participam nesta abertura do Sintra Museu de Arte Moderna. Um conjunto valorosíssimo de arte contemporânea, representativo da produção internacional, está a partir de agora acessível num centro cultural do nosso país. Associando-me honrosamente a esta inauguração, quero em primeiro lugar expressar o reconhecimento devido ao coleccionador, Senhor José Berardo, e à Câmara Municipal de Sintra, depositária da colecção.
Da curiosidade que animou o Senhor José Berardo, como ele próprio explica na nota prévia que escreveu para o catálogo da sua colecção, somos devedores, pois dela resultou uma recolha que percorre alguns dos momentos cruciais da modernidade artística posterior à segunda Guerra Mundial. Mas somos também devedores da disponibilidade do Senhor José Berardo, empresário que, ao desígnio cultural de coleccionador, aliou a intenção, que desejamos perene, de proporcionar o acesso público ao património de excepcional qualidade que reuniu.
A Câmara de Sintra soube interessar o coleccionador e criar as condições para receber a colecção. Não é pequeno mérito esse, a que se soma o sentido da oportunidade posto na recuperação deste edifício e o rigor da sua adaptação técnica e urbanística. Felicito por isso vivamente a Câmara Municipal de Sintra, na pessoa da sua Presidente, a Dra. Edite Estrela, que sei pessoalmente se empenhou nesta solução feliz.
Com este Museu, Sintra enriquece a sua vocação de centro artístico e museológico e com a exposição desta colecção de arte acrescenta um novo elemento ao painel de qualificações que tinham justificado a sua inclusão na categoria de Património da Humanidade. Motivos justamente de orgulho para os sintrenses, entre os quais permitam-me que também me inclua por direito natural.
Garante o êxito do projecto a experiência e a competência comprovadas da Dra. Maria Nobre Franco, a quem desejo as maiores felicidades nas suas novas tarefas.
O Museu de Sintra promove, com esta exposição, uma novidade, salientada por alguns observadores, e que convirá reter. Apresenta-nos uma selecção de peças artísticas da nossa contemporaneidade próxima. Mais: todos os testemunhos autorizados são concordantes em sublinhar que se trata de uma selecção pertinente, qualificada e ambiciosa. Poderá assim este Museu constituir um ensejo para aprofundar qualitativamente a abertura do nosso país aos grandes temas e expressões da modernidade cultural internacional.
Os portugueses têm na sua história épocas marcadas por um intenso intercâmbio cultural - artístico e científico - com outros povos. Encontraram-se por vezes na linha da frente do diálogo civilizacional que permitiu ao mundo deslocar as fronteiras do conhecimento. Ao arrepio desta tendência, outras épocas, entre as quais algumas décadas deste século, ficaram marcadas por uma tentativa de encerrar Portugal e os portugueses em si próprios, num isolacionismo absurdo que nos afastou dos novos horizontes do saber e da criação.
A democracia permitiu reencontrar o caminho que o autoritarismo tinha condicionado fortemente, mas não lograra por completo impedir. Esse é o caminho que integra a metodologia do trabalho com os outros, a aprendizagem sem preconceitos, a curiosidade, afinal. É o caminho que valoriza igualmente o nosso próprio contributo para a construção do universo humano na sua diversidade.
Quero saudar todos os artistas, críticos, historiadores e sociólogos da arte, directores de museus, galeristas e coleccionadores que nos acompanham nesta inauguração. E distinguir com as boas vindas todos os que se deslocaram do estrangeiro.
A vossa presença também motiva estas minhas palavras de confiança nas virtualidades de um clima favorável à livre criação e circulação de projectos e linguagens culturais. Este Museu será um poderoso estímulo à consolidação desse clima.
Para muitos portugueses, a aventura da descoberta da arte contemporânea pode começar aqui, com uma proximidade de que anteriores gerações não beneficiaram. O nosso ensino artístico, necessitado de novas oportunidades, receberá um poderoso incentivo da presença desta estrutura museológica.
Estamos perante um precioso instrumento de alcance pedagógico, que é também um projecto que continua aberto e é possuidor de um invulgar dinamismo. De facto, a curiosidade do coleccionador não está saciada, nem o seu desejo de a satisfazer. E vai decerto receber o impulso dos inúmeros visitantes e estudiosos portugueses e não portugueses.
O Sintra Museu de Arte Moderna ficará doravante a assinalar o lugar de Portugal no roteiro das importantes colecções de arte da segunda metade do século XX e da transição para o século XXI.