Jantar de Homenagem ao Prémio Nobel da Paz 96 - D. Ximenes Belo

Palácio Nacional de Queluz
21 de Maio de 1997


É para mim uma honra e um privilégio receber Vossa Excelência Reverendíssima, para prestar ao Bispo de Dili a homenagem que lhe é devida por Portugal e pelos Portugueses.
Todos os Portugueses conhecem o Bispo D. Carlos Ximenes Belo. A sua coragem e o seu heroísmo, expressos na voz clara do pastor de Dili, que se levanta sozinha contra a opressão e a violência, tornaram-no, desde há muito, o símbolo da liberdade e da paz para todos nós.
Figura exemplar da Igreja Católica, D. Ximenes Belo dá-nos, todos os dias, uma lição de fé e de tolerância. Chefe espiritual de uma comunidade mártir, o exemplo da sua força tranquila desenvolveu a cada um dos Timorenses o sentimento profundo da dignidade individual e a determinação de lutar pelos seus legítimos direitos, constantemente violados por um regime de ocupação brutal.
Incansável na defesa do seu povo, o Bispo de Dili é uma referência da consciência universal, uma referência obrigatória para todos os que lutam pela liberdade, pela democracia e pelos direitos do Homem. Em boa hora, o Comité Nobel da Paz quis consagrar o reconhecimento internacional desse estatuto, com a atribuição do Prémio Nobel da Paz: não podia ter feito uma melhor escolha.
A atribuição do Prémio Nobel da Paz a duas insignes personalidades timorenses, feita em nome da paz e do respeito pelo direito de autodeterminação, representa uma viragem decisiva na história de Timor-Leste. É, sem dúvida, um marco de esperança na longa e trágica luta de uma pequena comunidade, sem outra defesa perante a usurpação indonésia além da sua vontade indómita de resistir.
Desde logo, para todos os Timorenses, o Prémio Nobel significa o fim de um terrível isolamento. A questão de Timor-Leste passou a ser uma causa internacional, e essa mudança é irreversível. A opinião pública internacional, os parlamentos democráticos, as organizações de solidariedade não-governamentais tomaram nas suas mãos a causa timorense.
A questão de Timor-Leste deixou de ser um problema remoto e ignorado, para estar presente, em permanência, na agenda internacional. O interesse crescente dos principais meios de comunicação pela situação em Timor, a condenação da Indonésia na resolução da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, o empenho do novo Secretário-Geral das Nações Unidas na procura de uma resolução justa, pacifica e democrática da questão timorense são apenas os exemplos mais recentes da mudança.
Mais tarde ou mais cedo, o regime autoritário indonésio terá de tirar as consequências políticas da viragem internacional. Nesse sentido, a resposta indonésia à atribuição do Prémio Nobel de Paz, com a recrudescência da violência e das perseguições em Timor-Leste, de que Vossa Excelência Reverendíssima é testemunha quotidiana, parece-me ser, sobretudo, um sinal de fraqueza e de impotência perante a vontade dos Timorenses para afirmar a sua identidade própria e conquistar a sua liberdade.
Senhor Bispo de Dili
As minhas palavras de pouco valem perante o sofrimento da comunidade-mártir de Timor-Leste, que tenho sempre presente.
Quero reiterar-lhe, solenemente, o compromisso de Portugal e dos Portugueses de tudo fazer para garantir o exercício livre e democrático do direito inalienável de auto-determinação, que a comunidade internacional reconhece ao povo de Timor-Leste, e para defender, em todas as instâncias, a pacificação do Território e os direitos dos Timorenses.
Nesse sentido, continuamos prontos para colaborar com o Secretário-Geral das Nações Unidas, com lealdade e firmeza, e para apoiar os seus renovados esforços para institucionalizar o diálogo intra-timorense, onde a participação de Vossa Excelência Reverendíssima e a sua autoridade única será decisiva para consolidar um processo que considero indispensável para a reconciliação, a paz e a democracia em Timor-Leste.
Por último, creio ser pertinente referir a necessidade de multiplicar os actos concretos de solidariedade dos Portugueses e da comunidade internacional em relação a Timor-Leste e, designadamente, para com a Igreja timorense.
Em Portugal, a causa timorense é uma causa nacional, que despertou os sentimentos mais generosos e o espirito de solidariedade da juventude: as suas iniciativas e o seu apoio são preciosos para os Timorenses, tal como a sua confiança num futuro de liberdade, paz e de democracia para Timor-Leste que, estou certo, todos nós saberemos partilhar.
Peço a todos que me acompanhem num brinde ao Senhor Bispo de Dili, D. Carlos Ximenes Belo, Nobel da Paz, a quem exprimo o meu profundo reconhecimento e desejo os maiores sucessos pessoais.