Cerimónia de Entrega dos Prémios Norte-Sul

Assembleia da República
16 de Maio de 1997


É com particular emoção e com a clara noção da honra que me é cometida que procedo hoje à entrega dos prémios Norte/Sul de Lisboa.
Uma emoção causada pela personalidade ímpar dos galardoados deste ano, pelo contributo inestimável que têm dado às causas da liberdade, da democracia, dos direitos humanos e da paz, pelo seu exemplo e tenacidade na prossecução destes ideais.
Uma emoção que resulta igualmente do conhecimento pessoal que tenho dos dois homenageados de hoje, do seu comprometimento excepcional na defesa e promoção dos direitos humanos.
Em contextos tão diferentes, mas num combate convergente, a acção de Mary Robinson e Patricio Aylwin ilustram, de forma particularmente eloquente, os objectivos que inspiraram a criação do prémio Norte/Sul.
Não foi certamente fácil ser chileno nos anos terríveis que se seguiram a 1973; não foi certamente fácil manter a esperança e a coragem face à repressão impiedosa da ditadura militar, aos mortos e desaparecidos, à injustiça e à prepotência, à crueldade de um tempo que não parecia ter fim.
Patrício Aylwin soube manter a esperança e assumir a coragem, tornando-se, no momento-chave do reencontro do Chile com a liberdade e a democracia, o homem que liderou, com mão segura, uma transição política extremamente complexa e difícil, ao mesmo tempo que garantia a paz interna e lançava as bases dos caminhos da concórdia entre todos os filhos da nação chilena.
Uma concórdia que tinha necessariamente de se construir na base da verdade, pois só nela podem assentar a justiça, a tolerância e o respeito pela diversidade de opiniões que caracterizam as sociedades democráticas.
Conhecemos todos o papel determinante de Patrício Aylwin na constituição da Comissão “Verdade e Justiça”, encarregada de investigar as violações dos direitos humanos perpetradas pela ditadura, e o seu contributo pessoal para que esta difícil mas indispensável tarefa fosse levada a cabo.
Combatente da liberdade, defensor intransigente do respeito pelos direitos humanos, lutador incansável pelo restabelecimento da verdade dos factos, sem ressentimentos nem intuitos revanchistas, D. Patrício Aylwin, pela sua personalidade e pela sua dedicação às mais nobres causas da Humanidade, é merecedor de um inquestionável reconhecimento.
Merecedora de idêntico reconhecimento é a Presidente Mary Robinson, cujo empenhamento pessoal na defesa e promoção dos direitos humanos à escala mundial é de nós todos bem conhecido.
Jurista de justificado renome internacional, parlamentar de grande distinção, a sua eleição para a chefia do Estado irlandês não a coibiu de continuar a ter um envolvimento directo e particularmente activo nas iniciativas que, a nível internacional, visam promover e melhor defender os direitos inalienáveis da pessoa humana, a compreensão entre povos e culturas, o respeito pelas diferenças, um melhor bem estar para todos.
Lembro, particularmente, o seu contributo como Relatora Geral da Conferência “Human Rights at the Dawn of the 21st. Century”, organizada pelo Conselho da Europa com vista à Conferência das Nações Unidas sobre Direitos Humanos que decorreu em Viena em 1993, assim como a sua recente participação na “Pan-African Conference on Peace, Gender and Development”, que teve lugar no Ruanda.
Este empenhamento pessoal é para todos nós um exemplo e uma lembrança constante das nossas obrigações relativamente a todos aqueles que sofrem, que vêem os seus direitos espezinhados, que anseiam por justiça e por liberdade.
Dear President Mary Robinson,
May I add a personal note. It is indeed for me a great pleasure to bestow upon you this award which honours those that have contributed, in an outstanding way, to defend and further human rights.
I keep fond memories of the first time we met, in Strasbourg, where, albeit in different capacities, we both strove towards a common purpose: to see justice and the fundamental rights of the Human being prevail.
Twenty years have gone by and, in the meantime we have both been invested with responsibilities which go well beyond the challenging tasks we took up in the framework of the Commission of Human Rights.
It is often so much easier, specially in our open and democratic societies of Europe, not to look beyond our cosy walls, not to see the suffering that is so often so close at hand, to shut our eyes and ears to all those who shout for freedom, that strive against injustice, that fight for a better and more decent livelihood, that cry out against abuse and intolerance.
Your example is thus an encouragement to us all, to all those concerned with the fundamental well-being of Mankind, with respect for Human rights, with freedom, democracy and the rule of Law.
Senhor Presidente da Assembleia da República
Senhora Presidente Mary Robinson
Senhor Presidente Patrício Aylwin
Minhas Senhoras e meus Senhores
A entrega dos prémios Norte/Sul não pode ser vista com um mero acto simbólico.
Para além do significado e da importância da obra daqueles que são anualmente e justamente galardoados, é a essência desse combate fundamental pelo respeito pelos direitos fundamentais da pessoa humana que deve ser hoje, mais uma vez, salientada.
Este combate é de todos nós, já que, face à opressão e à injustiça, quando estão em jogo a liberdade e a dignidade da pessoa humana, não poderá haver nem cedência nem compromisso.