Sessão Solene de Abertura do Colóquio sobre Vasco da Gama

Universidade da Sorbonne - França
11 de Maio de 1998


Esta Conferência Internacional, que nos reúne numa das Universidades mais antigas e prestigiadas do Mundo, conta com a participação de reputados especialistas, de várias nacionalidades, entre os quais muitos indianos, que tratarão temas muito diversos e fundamentais para que se possa ter uma visão actualizada do significado e alcance da viagem de Vasco da Gama.
Esses temas têm a ver com a história da expansão, abordada também sob a perspectiva da história económica, militar, diplomática, das instituições, mas ligam-se ainda à geografia, às artes plásticas, à música, à arqueologia, à literatura, à cartografia. A Exposição que estará patente tem o maior interesse artístico e documental.
A viagem que levou os portugueses por mar à Índia, tão prodigiosa que quase não se acreditava que pudesse ter sido realizada, como referiu Fernand Braudel, representou o apogeu de uma aventura que tinha começado antes e que chegou à actualidade. Essa viagem de há quinhentos anos constituiu um acontecimento capital da história humana e fundou a Idade Moderna. Como todos os acontecimentos de enorme importância e consequência tornou-se num símbolo e num mito que foi apreendido com sentidos diversos e mesmo contraditórios.
Esses sentidos variaram consoante as épocas, as ideologias, as concepções, os valores. É desnecessário referir que a viagem vista da Europa é diferente da visão que dela têm os que a olham da Ásia. Como é inútil dizer que tão anacrónico como olhar, na actualidade, a viagem com os olhos do passado é pensar que, no século XV, ela poderia ser entendida à luz das concepções de hoje.
Portugal assume a sua história e a sua identidade. Mas como país democrático e moderno, o seu Estado não tem, nem quer ter, uma historiografia oficial nem uma versão homologada do passado. Quem escreve a história são os historiadores e ela resulta, como sabemos, de leituras plurais que se sucedem ou coexistem, se corrigem e complementam.
Esta Conferência Internacional, para além de um alto valor científico e cultural, tem também um grande valor pedagógico. Mostra que a melhor maneira de celebrarmos um acontecimento histórico tão complexo é estudá-lo com maior profundidade e mais rigor, com exigência, abertura e liberdade total, reunindo, como aqui acontece, contributos ricos, múltiplos e diversos.
Celebrando a viagem que representou o encontro de culturas e civilizações distantes, queremos realizar essa celebração em espírito de diálogo e de ecumenismo, pois esse é o ensinamento fundamental que dela colhemos.
Ao unificar o planeta e ao levar a Europa ao Mundo e o Mundo à Europa, Portugal tornou-se universal e abriu o continente a essa dimensão, como é reconhecido por eminentes historiadores de vários países e escolas. Disso nos orgulhamos. Queremos renovar essa mensagem de universalidade. O próximo século terá de ser o século do encontro entre países e povos, continentes e civilizações, culturas e religiões. Esta é uma condição de paz e de desenvolvimento, ao serviço de todos os seres humanos. A Europa, sem etnocentrismos, terá de dar uma contribuição primordial a este combate pela universalização da solidariedade, da tolerância e do respeito pela diversidade cultural.
A esse propósito, seja-me permitido reafirmar, agora, aqui, a amizade entre Portugal e a Índia e a nossa admiração pela sua extraordinária cultura, que tanto nos enriqueceu.
Saúdo a Fundação Calouste Gulbenkian, na pessoa do seu Presidente e meu querido Amigo, Prof. Ferrer Correia, por esta iniciativa tão valiosa. Agradeço à Universidade da Sorbonne e ao seu Magnífico Reitor, por ter acolhido e apoiado a realização destas celebrações. As presenças do Presidente Jacques Chirac, na inauguração da Exposição, e do Ministro Claude Alègre, nesta sessão inaugural, são, para nós, motivo do maior reconhecimento e de muita alegria.
Para Portugal, o mar não separa: une. Os oceanos, que nos levaram e que nos trouxeram da Índia, transformados para sempre pelo encontro memorável com o Novo, são, continuam a ser, um património para o futuro. Este é o tema da Expo’98, de Lisboa, que dentro de dias, abre a todos os povos do Mundo.
A melhor maneira de lembrarmos, olhando para o futuro, a viagem de Vasco da Gama, é retermos o espírito de ousadia, de modernidade científica e de universalismo, sem o qual ela não se teria realizado.
Esta Conferência Internacional é inspirada por esse espírito. Bom trabalho! Muito obrigado.