Jantar em honra do Presidente do México, Ernesto Zedilho

Palácio Nacional da Ajuda
19 de Outubro de 1998


É com o maior prazer que, em nome do Povo português e em meu nome pessoal, apresento a Vossa Excelência os mais sinceros e calorosos votos de boas vindas; votos estes que naturalmente faço extensivos a sua excelentíssima Esposa, assim como às individualidades que o acompanham nesta sua visita de Estado a Portugal.
Quero exprimir também a minha profunda satisfação pela oportunidade de, na pessoa de Vossa Excelência, acolher entre nós o estadista que está a impulsionar no seu país um processo de reformas políticas e de cariz jurídico-administrativo, tendo como objectivo o reforço da democracia e o pleno funcionamento das suas instituições.
O seu compromisso, assumido em 1994, de pugnar pela descentralização e pela transparência democrática é fruto de uma visão humanista e republicana da política, assim como da determinação em facultar ao Povo mexicano o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e mais equitativa. As alterações introduzidas tanto na Constituição como nas leis eleitorais são bem comprovativas da filosofia de vida e do espírito democrático que anima o Presidente Ernesto Zedillo; espírito esse que, traduzindo-se no natural exercício do Poder em conformidade com a vontade expressa pela maioria, não perde de vista o respeito pelas minorias e a defesa dos seus legítimos anseios e direitos.
Senhor Presidente
As nossas duas Nações comungam dos mesmos ideais de Paz e de Progresso, de Liberdade e Democracia. Irmanados no seio da Comunidade Ibero-americana a que nos orgulhamos pertencer, México e Portugal dão um importante contributo para o desenvolvimento das relações entre os países que integram aquela Comunidade e para a sua cada vez maior projecção internacional.
Partilhamos ademais a perspectiva de que a Comunidade Ibero -americana, com base na identidade cultural que lhe é própria, está vocacionada para continuar a abrir caminhos conducentes a uma cooperação frutuosa nos planos político e económico, procurando envolver o interesse e empenho de todos os cidadãos em acções que tenham reflexos directos sobre a sociedade civil dos seus respectivos países.
A VIII Cimeira Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo, que ontem encerrámos na cidade do Porto, saldou-se num êxito por todos reconhecido. Com efeito, num ambiente fraterno e solidário, em que prevaleceu sempre um diálogo vivo, franco e aberto, chegámos a uma notável convergência de pontos de vista e de linhas de orientação sobre o tão importante tema que ali nos reuniu, " Os Desafios da Globalização e a Integração Regional ".
A Declaração do Porto constitui uma mensagem de esperança e de solidariedade, assim como de confiança no futuro e na nossa capacidade conjunta para fazer face a um desafio que a presente crise económica e financeira tornou incontornável. A Declaração Sobre a Situação Financeira Internacional que lhe é anexa - em cuja elaboração, aliás, México e Portugal tiveram um papel tão importante - evidencia de forma clara a nossa determinação e empenho na defesa das condições indispensáveis para permitir o crescente desenvolvimento económico e social dos nossos Povos, sublinhando a solidariedade essencial que deve nortear a abordagem e a resolução deste problema, de que a América Latina está a sofrer tão fortemente os efeitos.
A carta que, com base nessa Declaração, eu próprio e o Senhor Primeiro-Ministro de Portugal fomos mandatados para enviar aos dirigentes dos Países com maior capacidade de intervenção na economia mundial, assim como à União Europeia e aos organismos financeiros internacionais, designadamente ao FMI e ao Banco Mundial, constitui um passo concreto e operativo da maior importância, quer para a acrescida identidade e projecção internacional da Comunidade Ibero-americana, como também na procura efectiva de uma urgente solução para a crise económica e financeira que vivemos.
Senhor Presidente
Escusado será dizer que Portugal - protagonista activo no processo de construção europeia - continuará a advogar com veemência o incremento das relações de cooperação entre a Europa e a América Latina - assim como com outros continentes e regiões - numa postura que lhe advém da sua história de país europeu pioneiro das descobertas e da abertura ao Mundo. Por outro lado, a complementaridade dos processos de globalização e os de integração regional deverá ser cada vez mais assumida por todos nós.
A Cimeira da União Europeia / América Latina e Caraíbas, a ter lugar no Rio de Janeiro em Junho do próximo ano, irá constituir - estou certo - uma excelente oportunidade para um ainda maior estreitamento das relações de cooperação política, económica e cultural entre nós. A Europa e a América Latina - no conjunto dos seus Estados e espaços regionais - têm um papel insubstituível a desempenhar na procura dos caminhos que contribuam para atenuar os desequilíbrios e as desigualdades que subsistem em cada um dos nossos países e no mundo global em que vivemos.
Deveremos procurar responder conjuntamente aos desafios que nos são comuns. A luta contra a pobreza e a exclusão social, o combate ao racismo e à xenofobia, ao terrorismo, à droga e ao narcotráfico são desafios que só poderemos superar através de uma efectiva cooperação entre os espaços regionais, a par de esforços convergentes no domínio do fortalecimento das instituições democráticas, da intensificação da cooperação institucional e da vivificação das iniciativas da sociedade civil.
Neste contexto, não posso deixar de saudar a feliz iniciativa do México que conduziu à Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Drogas, na qual eu próprio participei, e de que resultou a tão importante assunção da responsabilidade entre todos partilhada nesta matéria, pondo fim à artificial e maniqueísta divisão entre produtores e consumidores.
Senhor Presidente
Ainda no domínio multilateral, mas agora no âmbito das organizações internacionais sediadas em Nova Iorque e Genebra, seja-me permitido evocar a problemática de Timor-Leste e a importância que, em todas as circunstâncias, atribuímos ás questões de princípio em matéria de defesa dos direitos humanos e do direito à auto-determinação.
Os progressos registados na última ronda de negociações sobre aquele território, levadas a cabo sob a égide do Secretário-Geral das Nações Unidas, não nos podem fazer esquecer que o actual processo de transição política na Indonésia se caracteriza por uma forte componente de incerteza quanto ao seu sentido último, o que torna imprescindível, simultaneamente, uma postura de grande rigor e flexibilidade da nossa parte.
Flexibilidade na avaliação das propostas que possam contribuir para um clima de paz e estabilidade em Timor-Leste, e rigor quanto aos princípios essenciais onde terá de assentar a solução da questão timorense, solução essa necessariamente pacífica, digna e internacionalmente aceitável, e que resulte do exercício, livre e democrático, do direito do Povo timorense à auto-determinação.
Senhor Presidente
No domínio do relacionamento bilateral, apraz-me sobremaneira assinalar que as relações entre os nossos dois países atravessam um momento francamente positivo; momento em larga medida propiciado pela visita do Senhor Primeiro-Ministro de Portugal ao México, em Novembro de 1996, e agora amplamente confirmado pela presente visita de Estado de Vossa Excelência ao nosso país.
Estas visitas, aliás, constituem tão somente a expressão mais visível do efectivo estreitamento das nossas relações bilaterais, com base no aproveitamento das potencialidades das nossas economias, na afinidade das nossas culturas e no aprofundamento do diálogo construtivo entre os nossos dois países.
A par da concertação política, consagrada num Memorando de Entendimento, abrem-se hoje em dia perspectivas de uma cooperação alargada ao domínio económico, onde, de resto, gostaríamos de ver aumentado o volume das trocas comerciais, bem como o montante dos investimentos recíprocos. Importa assim continuarmos a promover e incrementar a realização de seminários e a troca de missões empresariais com vista à localização de áreas complementares e nichos de mercado que estimulem a indispensável cooperação empresarial privada.
Refira-se, neste contexto, que o investimento português no exterior superou, no ano em curso e pela primeira vez, o investimento estrangeiro em Portugal, ocupando o nosso país a quinta posição dos investimentos externos no Brasil e o sexto lugar dos investimentos dos países membros da União Europeia na América Latina, o que é também uma demonstração de que temos confiança no desenvolvimento estável da região, como nos foi salientado na Cimeira Ibero-Americana do Porto.
Abre-se assim perante nós, neste dealbar de um novo milénio, um vastíssimo campo de acção para o reforço das nossas relações bilaterais a todos os níveis, cabendo-nos saber aproveitar, com ousadia e pragmatismo, todo o imenso potencial contido no património de afectividade recíproca e de mútuas convergências e complementaridades que caracterizam o relacionamento entre o México e Portugal.
Relacionamento caloroso que se manifesta tanto ao nível institucional, como ao nível da afectividade das relações humanas. Não faltariam exemplos; mas permitam-me que aqui saliente o prestígio que usufrui entre nós Octávio Paz, nome ilustre da cultura mexicana e grande amigo de Portugal. A ele se deve muito do que foi a divulgação de Fernando Pessoa no Mundo de língua castelhana, quando o genial poeta português não desfrutava ainda a aura da justa fama internacional de que hoje é rodeado.
De igual forma, a simpatia que Vossa Excelência sempre demonstrou nutrir para com o meu país vem reforçar a minha convicção de que a presente Visita de Estado irá seguramente dar frutos no sentido de uma cada vez maior aproximação e mútuo entendimento entre o México e Portugal.
É nessa convicção - direi mesmo, é nessa certeza - que convido todos os presentes a acompanhar-me num brinde pelas felicidades pessoais do Presidente dos Estados Unidos Mexicanos e da Senhora Nilda Patrícia Zedillo, pela prosperidade da grande Nação Mexicana e pela amizade e cooperação entre os nossos dois Povos e Países.