Comemorações do 30º Aniversário da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional

Costa da Caparica
30 de Setembro de 2000


Senhor Secretário Geral da CGTP-IN,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Resolvi aceitar o convite para participar nesta festa de aniversário porque a CGTP merece o meu respeito e a minha esperança.

O respeito que nutro pela CGTP tem várias razões de ser.

Em primeiro lugar, pelo papel desempenhado pelos sindicalistas que, a partir das direcções desses quatro sindicatos que ousaram defrontar a ditadura, foram organizando o debate e a acção em favor dos direitos dos trabalhadores.

Trata-se, aliás, de uma parte da nossa história recente que, não sendo património de ninguém, é preciso não deixar esquecer, não tanto porque ela constitui - para mim como para tantos que aqui estão - motivo de orgulho, mas sobretudo porque é preciso dar às gerações mais jovens, que já não conheceram a ditadura, a possibilidade de compreender o valor que têm a liberdade, a democracia e a participação na construção do nosso futuro colectivo.

Em segundo lugar, porque os sindicatos oferecem quotidianamente à nossa vida colectiva um contributo inestimável, que consiste em dar expressão à insatisfação de grandes grupos de trabalhadores, contribuindo para que a questão da desigualdade económica tenha a importância política que lhe pertence.

Mesmo quando não se está de acordo com alguns pontos de vista sindicais – é por vezes o caso - ou quando se discorda do modo ou da oportunidade com que alguns protestos se exprimem, o apego aos valores democráticos e também a verdade exigem que se reconheça que, sem a presença activa dos sindicatos, a vida política portuguesa seria mais pobre e, com grande probabilidade, algumas decisões seriam mais injustas para os trabalhadores.

A terceira razão deriva do papel fundamental e insubstituível que o sindicalismo pode ter no desenvolvimento da cidadania e na modernização da sociedade portuguesa.

Pertenço ao grupo daqueles para quem os futuros desejáveis não podem ser construídos sobre a derrota sistemática das reivindicações dos trabalhadores.

Quero reafirmar, uma vez mais que, no meu entender, há muito a mudar no mundo trabalho.

Mas, depois de duas décadas de flexibilização das relações de trabalho – coisa de que se fala pouco -, julgo que é indispensável traçar algumas fronteiras que não podem ser transpostas, seja onde for, sem que se tire ao trabalho a dignidade e a decência que ele tem e deve ter.

Refiro-me, evidentemente, a essa batalha fundamental dos nossos dias que vem sendo travada pela OIT, pelas organizações sindicais internacionais e por muitos dirigentes políticos e que consiste em confrontar as reivindicações do mundo económico com os quatro pilares fundamentais dos direitos do trabalho.

São eles, como se sabe: a liberdade sindical e o efectivo direito à negociação colectiva; a eliminação do trabalho forçado; a erradicação do trabalho infantil e a eliminação da discriminação no domínio do emprego e da formação.

Tornar efectivos os direitos económicos, sociais e políticos dos cidadãos, promover um emprego com futuro e com direitos para todos, reduzir as desigualdades de oportunidades entre as mulheres e os homens que vivem e trabalham em Portugal são mais do que reivindicações sindicais.

São, a meu ver, algumas das mais importantes exigências da promoção e do desenvolvimento da cidadania e constituem, por isso mesmo, outros tantos motivos para que os democratas e progressistas assegurem ao sindicalismo a respeitabilidade a que tem direito, mesmo quando, aqui e ali, se não concorda com as suas teses ou com as suas acções.

Deixem-me terminar esta saudação ao vosso 30º aniversário com uma palavra de esperança.

A primeira razão da minha esperança reside no facto de estarmos aqui reunidos nesta data tão especial. E se aqui estamos é porque estes trinta anos deram a muitos de nós, se não mesmo a todos nós, uma noção muito vincada das responsabilidades de cada um perante as gigantescas mudanças que estão em curso.

No respeito pelos valores que dão coerência e dignidade à vida de cada um, é indispensável que se tome a sério a exigência, que é a nossa, de termos de encontrar novas formas de promover a dignidade do trabalho e a solidariedade social.

Este dia de festa não é, certamente, o momento adequado para discutir o passado ou o que, ao longo dos anos, nos uniu e nos dividiu.

Sei, por experiência própria, que não é fácil assumir a responsabilidade de estar permanentemente a chamar a atenção para os problemas que estão por resolver, a criticar as soluções que se consideram inadequadas ou a combater os egoísmos individuais ou grupais em nome do bem comum e da equidade social.

E sei também, graças ao que aprendi nos muitos anos que já levo de vida e de luta política - e não esqueço nem a luta contra a ditadura nem estes anos como Presidente da República -, que falo a um conjunto de mulheres e de homens que impuseram a si próprios o dever de se baterem pelos direitos e pelos interesses dos que aceitaram representar.

É verdade que a acção quotidiana do sindicalismo nem sempre convida à reflexão estratégica.

Mas estou convencido que se pode e deve contar com os sindicalistas e com os sindicatos portugueses para assumirem plenamente as responsabilidades, que lhes cabem e que não são transferíveis. Trata-se de usar inteiramente essa escassa margem de liberdade que permite conjugar melhor a eficiência económica, de que não podemos prescindir, com a dignidade do trabalho e a solidariedade social, que não devemos nem queremos sacrificar.

Sei que se pode e se deve contar com os sindicatos nessa tarefa – difícil e exigente entre todas – que é a construção dum Portugal capaz de erradicar o trabalho infantil, de reduzir drasticamente o trabalho ilegal, de melhorar a qualidade do emprego, de enfrentar as velhas e as novas fracturas sociais com políticas capazes de limitar as desigualdades económicas e sociais sem travar o crescimento económico.

E sabê-lo constitui, para mim, apesar das dificuldades de tal caminho, uma das causas da esperança e da confiança que mantenho no presente e no futuro de Portugal.