Abertura do I Congresso da Ordem dos Arquitectos

Évora
26 de Outubro de 2000


Minhas Senhoras e Meus Senhores

Quero começar por expressar a minha satisfação pela oportunidade que tenho em presidir ao primeiro Congresso da Ordem dos Arquitectos, realizado na bela cidade de Évora - Pátrimónio da Humanidade - impregnada de história, em cada uma das suas ruas e praças. É uma das cidades em que o urbanismo e a arquitectura se traduzem num lugar único construído ao longo dos séculos e que nos cumpre preservar e tornar apto para a vida contemporânea, demonstrando capacidade de encarar o futuro sem renunciar ao passado.

A minha presença neste congresso assume um significado especial, pelo valor que atribuo ao longo percurso que a classe dos Arquitectos teve de fazer, desde o célebre 1º Congresso dos Arquitectos Portugueses, em finais dos anos quarenta, em que se procurou discutir uma actividade profissional e o lugar da arquitectura e dos arquitectos na sociedade portuguesa, subvertendo os modelos da propaganda oficial.

Ao fim dum longo processo, a Associação dos Arquitectos, transformou-se em Ordem, já no ano de 1998.

O grande passo dado representa o reconhecimento que a arquitectura e os arquitectos têm alcançado e isto é essencial para responderem aos desafios que se colocam à sociedade contemporânea, nomeadamente às questões que se põem quando se trata do espaço urbano.

As reivindicações e a reflexão sobre estas matérias são essenciais para que se chegue a conclusões que se possam traduzir em alterações qualitativas, independentes de interesses particulares ou de grupos.

Por outro lado, a temática escolhida para este 1º Congresso, HUMANIZAR A CIDADE E O TERRITÓRIO , é-me particularmente cara, pois liga-se ao tema da “Cidadania e Arquitectura”. Estas são questões nas quais me tenho envolvido, passaram a ser transversais.

Nesse sentido, o vosso Congresso terá concerteza, continuidade e aprofundamento sério, sem o qual, esta reunião perderá muito da sua justificação ou finalidade. Sei que é o que vai acontecer, pois a classe dos arquitectos sempre deu em Portugal sintomas de vitalidade e tem demonstrado uma consciência crítica e grande capacidade de inovação.

É sobretudo nas questões da função social da arquitectura que quero aproveitar este ensejo para tecer algumas considerações, à luz do momento actual, num Mundo em evolução acelerada.

Se a sociedade actual vem criando novas necessidades, novos costumes, novas formas de vivência e novos desafios ao Homem, que é o centro da criação arquitectónica - o resultado desta evolução, exige um repensar permanente da própria função da arquitectura no futuro.

A evolução dos critérios e métodos urbanísticos e as exigências da sociedade tecnológica vêm obrigando à introdução de novas funções e à alteração de características construtivas dos edifícios.

Por estes motivos, os novos desafios que se colocam à Arquitectura e à sua prática são fundamentais para uma desejada qualificação e humanização do espaço, seja ele urbano ou rural. A arquitectura é o rosto e o bilhete de identidade duma cidade, representando qualquer intervenção uma questão artística e técnica, mas igualmente uma questão ética, social e, sem dúvida, cultural.

A situação em Portugal, como aqui se pretende pôr em evidência, está nalguns aspectos, ainda longe do desejável, seja pelo panorama que o edificado nos oferece, como lá se chegou e porquê, seja pela ainda escassa, mas cada vez mais necessária, participação dos cidadãos na programação e realização das obras.

A Arquitectura e a sua prática deve e merece ser apreciada e discutida por todos, pelos arquitectos e pelos destinatários das suas obras.

É cada vez mais evidente a importância das políticas sobre os solos, as expropriações, os promotores, a especulação imobiliária e as vastas querelas sobre as áreas expectantes.
Como é afirmado, o tema deste congresso “coloca à profissão um urgente desafio, face à situação de desordem que continua a alastrar à nossa volta”. Estamos, portanto, perante uma oportunidade a não perder! A modernização e evolução de Portugal depende também da arquitectura que se faz e da melhoria da nossa paisagem urbana.

É necessário saber definir estratégias voltadas para o futuro, com a participação de todas as gerações de arquitectos, especialmente os jovens recém formados, apostar na diversificação e especialização das áreas da actividade arquitectónica e no alargamento do contributo que os arquitectos podem dar numa sociedade moderna, que não se restringe à arquitectura propriamente dita. Basta lembrar toda a nova temática social nas periferias e na gestão e produção de novos conteúdos programáticos.

Matérias como o Planeamento, o Ordenamento do Território, o Restauro, o Urbanismo, o Ensino, a Direcção de Obras, a Construção, ou mesmo a Economia, precisam do contributo dos arquitectos, da mesma forma que os arquitectos necessitam para, qualificar o seu trabalho, de atender ao contributo de especialistas.

O poder local é um dos intervenientes mais importantes na questão da arquitectura. A sua acção directa e indirecta sobre o espaço edificado é fulcral na construção do quadro físico e do futuro da sociedade. A articulação entre as autarquias e os arquitectos deve ser feita na lógica de um desenvolvimento e de uma requalificação urbana mais humanizada.

Um poder local forte, assente em programas eleitorais claros com as apostas dos candidatos e dos partidos, sobre as matérias que dizem respeito ao ambiente, ao urbanismo, à arquitectura, em suma, á paisagem urbana, evitará as soluções casuísticas, em PDMs, em planos regionais de primeira e segunda gerações.

É necessário garantir o direito à arquitectura para todos os cidadãos, como forma de promoção da qualidade de vida, mas é igualmente imperioso que os cidadãos, as suas organizações e órgãos representativos se tornem interlocutores válidos, com um papel verdadeiramente insubstituível e determinante no resultado dos projectos e obras, sejam elas de construção nova, ou de simples beneficiação ou restauro. Desta maneira estaremos a fazer uma pedagogia, de duplo sentido.

A qualidade do resultado final depende substancialmente também do papel dos interlocutores dos arquitectos e potencia a capacidade técnica e artística do arquitecto, para que a obra cumpra eficazmente a sua função.

É por isso indispensável alargar a discussão da arquitectura e da sua humanização, promover o debate público sobre o que queremos e sobre a preparação do quadro físico do nosso futuro.

Precisamos de ter presente, como disse, a colaboração de disciplinas como o Urbanismo, o Planeamento, a Sociologia, a Engenharia, as Artes Plásticas, a Psicologia, a Matemática e até a Filosofia, de modo a assegurar o equilíbrio entre o Homem, o seu meio e a Natureza.

Sabemos que a valorização e a promoção da qualidade da arquitectura estará certamente no equilíbrio da resposta a todas as questões de interdisciplinaridade que se lhe colocam.

O 1º Congresso da Ordem dos Arquitectos será mais uma oportunidade para um novo início - um novo Começar, como diria Almada Negreiros.

Termino saudando vivamente os órgãos directivos da Ordem dos Arquitectos, na pessoa da sua Presidente, a Arq. Olga Quintanilha. Felicito o Senhor Presidente da Câmara de Évora, que ao associar-se a esta iniciativa deu um sinal e um precioso contributo da sua cidade, onde a arquitectura representa um dos principais tesouros.

A todos os congressistas que participam activamente neste 1º Congresso desejo bom trabalho, na certeza de que este será histórico para a Ordem dos Arquitectos. Muito obrigado por me terem associado a este dia. Tenho aprendido sempre com muitos de vós ao longa da vida e estou seguro que assim continuará a ser.