Universidade Michel de Montaigne

Bordéus
10 de Maio de 2001


Agradeço, muito reconhecido, o acolhimento caloroso que me é prestado pela vossa tão prestigiada Universidade. A medalha que me acaba de ser entregue recebo-a como uma manifestação de amizade por Portugal e uma afirmação da vontade de reforçarmos os laços que unem os povos europeus.

O ilustre nome da vossa Universidade tem, para nós, portugueses, uma ressonância muito grata. Desde logo, porque Michel de Montaigne foi um homem do seu tempo, mas, pela sua obra, é também um homem do nosso tempo. O tempo europeu de Montaigne, de Camões, de Shakespeare, de Cervantes foi, como é o nosso, um tempo entre dois tempos, um tempo de contradições, de mudanças, de perplexidades, de incertezas, de novos desafios. As obras destes grandes espíritos ecoam a mudança da imagem que os homens tinham do Mundo e de si próprios.

Depois, Montaigne foi um francês universal, de que a França legitimamente se orgulha, mas que pertence ao património europeu e de toda a humanidade.

Mas há ainda outras razões que levam a que o nome de Michel de Montaigne tenha , para os portugueses, um significado especial. O autor dos Ensaios e a sua família tiveram ligações a Portugal e aos portugueses. O grande escritor foi discípulo e admirador para toda a vida do grande humanista português André Gouveia, referindo-se-lhe nos mais altos termos. Nos Ensaios, alude a vários episódios e figuras da história portuguesa, analisando-as com o seu espírito livre e a sua visão humanista. Por outro lado, Michel de Montaigne tem merecido a atenção reiterada de estudiosos portugueses. Ainda recentemente, Eduardo Lourenço nos deu um texto magistral sobre a figura do grande pensador.

Por todas as razões, é muito grato a um português ser recebido numa Universidade que tem o nome de Montaigne. Acresce que a cultura portuguesa tem encontrado em vós um interesse que nos honra e que agradeço vivamente. Queremos continuar este diálogo entre os nossos escritores, os nossos professores, os nossos estudantes.

O reforço e o aprofundamento do projecto europeu tem de passar por um maior conhecimento dos povos e das culturas europeias. As Universidades têm dado um importante contributo a esse conhecimento. É fundamental que aumente o intercâmbio universitário e a aproximação em todas as áreas do conhecimento.

Encontramo-nos, hoje, nesta Casa de cultura, para homenagearmos um grande poeta português, Eugénio de Andrade. É, pois, sob a inspiração da poesia e sob os auspícios de Montaigne que damos testemunho da importância da cultura na construção de uma Europa mais unida e de um Mundo mais justo. Os grandes escritores são muitas vezes a voz do que perdura. São eles que nos lembram a necessidade de sermos fiéis à humanidade que existe em cada ser humano e de procurarmos um acordo mais autêntico connosco, com os outros e com o Mundo. A isso chamamos liberdade, solidariedade, responsabilidade para com o futuro. Estou certo de que estas seriam palavras caras a Montaigne.


Muito obrigado.