Homenagem ao Cardeal D. António Ribeiro

Celorico de Basto
18 de Maio de 2001



Excelências,

Eminência,

Excelências Reverendíssimas,

Minhas Senhoras e Meus Senhores, Caros Celoricenses,

A minha presença neste acto representa a homenagem do País a uma grande figura da Igreja Católica portuguesa que deixou uma marca perdurável na nossa história recente e constitui ainda um tributo pessoal à memória de uma personalidade que apreciei e a quem me ligaram laços de convivência e mesmo de estima.

Em S. Clemente, Celorico de Basto, nasceu o Cardeal D. António Ribeiro. Podemos e devemos renovar, hoje, aqui, a evocação que ele não se cansava de fazer da sua terra e das suas gentes, reiterando por essa forma a ligação, que manteve intacta, às raízes.

Ao longo de uma vida dedicada à Igreja, D. António foi um padre e um bispo aberto ao Mundo e ao tempo, atento aos sinais de mudança e às esperanças.

O seu interesse pelos temas da comunicação social é um claro exemplo dessa abertura. Alguns de nós ainda se lembram do que, nos longínquos anos de 50 e 60, representou de novidade a sua presença jovem nos écrans da RTP, falando de temas da actualidade e propondo-se dialogar com as pessoas.

Elevado à dignidade episcopal pelo Papa Paulo VI, num período intensamente marcado pelo sopro renovador do Concílio Vaticano II, D. António Ribeiro seria mais tarde escolhido para Bispo de Lisboa. Essa foi, como sabemos, naquele ano de 1971, uma grande e pesada responsabilidade.

Coube a D. António Ribeiro ser o Patriarca da Transição. Nos anos finais da ditadura, deu provas de uma independência de espírito e de atitude, que foi reconhecida e louvada. Nos anos agitados da Revolução, mostrou uma grande sabedoria. Como já foi dito, ele conseguiu ser um homem sereno no meio das tempestades. Foi capaz de conciliar firmeza e equilíbrio, coragem e prudência. Nunca respondeu ao extremismo com radicalismo. Foi paciente, eficaz e consequente.

D. António Ribeiro soube depois acompanhar as transformações do Estado e da sociedade portuguesa, revelando uma notável inteligência das situações. Ao proceder como procedeu, deu um valioso contributo para que não surgisse uma questão religiosa na nova República. Esse é um bem que ficou a fazer parte do código genético do regime democrático e que será preservado.

A assunção plena da laicidade do Estado e da clara distinção de domínios que, aliás, a Igreja hoje também reclama, não só não é incompatível, como é mesmo a condição natural, da existência de uma relação estável, correcta e tranquila entre o Estado e a Igreja Católica. Essa também é uma lição que devemos a D. António Ribeiro.

Seja-me permitido, neste momento, lembrar, num tom mais pessoal, a figura que homenageamos. Como Presidente da Câmara de Lisboa, tive relações assíduas com o Patriarca de Lisboa. Creio poder dizer com verdade que havia entre nós uma corrente de simpatia mútua e, no meu caso, de respeito por ele. Este sentimento de respeito era, aliás, partilhado por toda a vereação, independentemente dos partidos políticos.

O testemunho que vos deixo é este: reconheci sempre em D. António Ribeiro um desejo sincero de ultrapassar dificuldades e de conseguir entendimentos.

Já como Presidente da República tive ensejo de conversar com ele muitas vezes, de modo franco, sobre temas de actualidade e de interesse. Acompanhei a sua terrível doença e a coragem com que a enfrentou.

Uma certa timidez, a modéstia pessoal e uma reserva natural, acentuada pelas responsabilidades da sua missão, fizeram com que nem sempre se tivesse exacta consciência das suas grandes qualidades e do papel que desempenhou na nossa história contemporânea. Graças também ao seu contributo, foi possível construirmos uma sociedade mais pluralista, mais tolerante, mais moderna. Uma sociedade em que as divergências não se transformam em anátemas.

Agradeço o convite que me dirigiram para estar hoje convosco e felicito os organizadores desta iniciativa. Saúdo o Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa, o Senhor Arcebispo Primaz de Braga e os outros dignitários religiosos presentes. Saúdo também os Senhores Presidentes da Câmara e da Assembleia Municipal de Celorico de Basto. Estou certo de que este tributo prestado, na sua terra natal, será uma boa ocasião para se conhecer e avaliar melhor a personalidade, a vida, a acção e a obra de D. António Ribeiro.