Inauguração da Faculdade de Engenharia da Universidade Católica Portuguesa

Sintra
06 de Julho de 2001


É com muito prazer que participo nesta cerimónia de inauguração das instalações da Faculdade de Engenharia da Universidade Católica Portuguesa.

As minhas primeiras palavras são de agradecimento à Universidade Católica pelo serviço prestado a favor do ensino superior português. Quero felicitar-vos pela capacidade de iniciativa demonstrada e, também, pela exigência colocada no vosso desenvolvimento.

Esta escola é um exemplo dessa atitude ao promover o ensino numa área importante para o país, em que começam a escassear os estudantes. Devo também salientar, como exemplo de rigor, as decisões tomadas, sempre difíceis e dolorosas, de suspensão de actividades, quando os imperativos de qualidade assim, porventura, o determinem.

A Universidade Católica Portuguesa ocupa um espaço singular no ensino superior em Portugal, pela sua história, pela sua capacidade de afirmação em áreas significativas para o progresso do país, pela exigência que tem colocado na definição e gestão do seu projecto. Considero que esse projecto deve ser valorizado nas decisões que venham a ser tomadas sobre o futuro.

Tenho afirmado com frequência a importância que atribuo ao conhecimento da realidade concreta e à avaliação do que se faz. Esses têm de ser dados a ter permanentemente em conta na decisão política.

Quero salientar a importância do trabalho realizado pela vossa instituição em várias áreas, designadamente no domínio do direito, da gestão ou ainda no desenvolvimento das pós-graduações.
É igualmente gratificante ver que a prática da cooperação com os Países Africanos de Língua Portuguesa tem dado frutos. Este é um exemplo que deve ser multiplicado pelas instituições portuguesas.


Minhas Senhoras e Meus Senhores

Quero felicitar-vos pela criação desta escola. Este passo, exigente em matéria do investimento necessário, constitui uma aposta de grande interesse, quer pela relevância deste sector para o desenvolvimento do país, quer pela originalidade e qualidade da proposta.

Trata-se de um projecto inovador, pelos seus conteúdos e pela sua organização. Uma organização pedagógica visando o desenvolvimento de capacidades, centrada no trabalho do aluno e na aprendizagem.

É tanto mais de sublinhar este objectivo quando vivemos um momento de expansão do acesso ao ensino superior, em que a massificação é encarada, geralmente, com fatalismo, como geradora de problemas. Essas atitudes de impotência e imobilismo face a novas realidades estão, em parte, na origem de elevadas taxas de insucesso e descontentamento de alunos e docentes.

É certo que essa expansão, essencial à democracia e ao desenvolvimento, trouxe novos problemas. Mas temos de acreditar que é possível enfrentar esses novos problemas, aliando a exigência e a responsabilidade necessárias à indispensável inovação. Com recurso a novas formas de organização e a novas pedagogias.

Ouvimos, por vezes, que a pedagogia deve ser uma preocupação do ensino básico ou, quando muito, do ensino secundário, mas sem sentido no ensino superior.

Não têm razão os que assim pensam. Também no ensino superior é necessário pensarmos as competências que se pretendem desenvolver, as condições de trabalho e de aprendizagem, o apoio que se dá aos alunos nas suas dificuldades.

Defendo a exigência e o trabalho, mas essa exigência não pode ser cega e não deve ignorar a evolução da população escolar de um ponto de vista social e cultural. Não podemos negar que muitas das dificuldades dos estudantes provêm de problemas não resolvidos em etapas anteriores, mas cruzar os braços como se o insucesso e o abandono fossem uma consequência inevitável é um erro.

É verdade que há problemas do ensino superior que são consequências das falhas do secundário. Por outro lado, a evolução das características sociais e culturais da população escolar trouxe problemas que implicam mudanças e novas soluções. Mas, em cada nível de ensino, há que encontrar soluções novas para os problemas, permitindo a integração escolar e a eficácia na aprendizagem.

O caminho não passa nem pelo facilitismo, nem pelo regresso ao passado, tentação ainda presente em muitos discursos. Há que procurar novas respostas, avaliá-las depois com rigor, e há que preparar as instituições para as novas realidades que vivemos hoje.

As soluções serão naturalmente diversificadas, mas passam pela adopção de alguns dos princípios que esta escola assumiu: a preocupação com o desenvolvimento de competências e com a formação cultural e cívica; o ensino activo e experimental; a exigência de trabalho e de responsabilização; a aprendizagem centrada no aluno; o atendimento personalizado.

Permitam-me que, na última parte da minha intervenção, partilhe convosco algumas preocupações sobre o futuro do ensino superior, sector que tenho acompanhado muito de perto.

Duas reflexões devem, a meu ver, estar presentes:

A primeira reflexão diz respeito às consequências da expansão do ensino superior a que assistimos nos últimos anos a qual deve ser para todos nós motivo de orgulho. Graças a ela Portugal tem hoje mais oportunidades de formação para os jovens e maiores potencialidades de desenvolvimento do país. No entanto, o crescimento nem sempre se processou da forma mais adequada, deixando margem a alguns equívocos, o mais grave dos quais é a ideia muito generalizada de que o ensino superior pode criar sucessivamente novas instituições, mantendo os padrões de qualidade desejáveis. Encaram-se, por vezes, os projectos de escolas como substitutos das actividades económicas na sua missão de fixar populações e promover o desenvolvimento. Criou-se a ideia equívoca de que seria prioritário para o bem dos jovens frequentarem aulas perto da área de residência, mesmo que tal fosse conseguido sem a garantia de qualidade do ensino. Sabemos que devem ser asseguradas condições - residências, alimentação, meios de estudo - para a frequência do ensino superior, mas a existência de estudantes deslocados é inevitável. Uma escola de qualidade, demora anos a planear e a poder funcionar e exige uma certa dimensão. A formação aprofundada dos docentes e o desenvolvimento da investigação não são compatíveis com processos apressados e com uma excessiva dispersão.

A segunda reflexão diz respeito às mudanças em curso nos sistemas educativos europeus decorrentes da Declaração de Bolonha e da criação de uma Área Europeia de Ensino Superior. Estas mudanças exigem que as universidades e os institutos politécnicos procedam a adaptações do sistema de graus e que promovam a mobilidade de docentes e alunos no espaço europeu. Há, ainda, que garantir padrões de qualidade que tornem o nosso sistema de ensino superior competitivo e atractivo.

Face a estas novas realidades, há que pensar as mudanças a introduzir nas instituições. Ao terminar, retomarei três preocupações que daí decorrem.

A primeira preocupação diz respeito à necessidade de repensar o papel dos diferentes subsistemas e instituições de ensino superior e as estratégias de desenvolvimento. É preciso assegurar a diversidade da oferta e valorizar a rede actual, assim como é necessário potenciar e articular os recursos existentes.

A segunda preocupação refere-se à necessidade de aprofundar a cultura de avaliação e promover a utilização dos dados obtidos nos trabalhos de avaliação.

Essas mudanças devem poder responder aos novos desafios e, simultaneamente, assentar no conhecimento da situação existente, dos seus problemas, dos seus pontos fortes. Só assim poderemos fazer das escolas instituições de qualidade, capazes de produzir novas respostas.

Em terceiro lugar, há que repensar as instituições de ensino em função da necessidade de incentivar a educação ao longo da vida. Portugal tem um défice de qualificação dos seus quadros, designadamente daqueles que têm mais de trinta e cinco anos, o que torna necessário às instituições de ensino superior encontrar novas vias, quer no que diz respeito ao reconhecimento de competências e qualificações não formais, quer em matéria do acesso a novas formações. Este será, seguramente, um dos grandes desafios do futuro.
Estou certo de que a Universidade Católica dará o seu contributo valioso a este grande esforço de modernizar o país e de valorizar e qualificar os portugueses, pela educação, pela cultura e pela investigação científica. Não há combate mais urgente. Não há combate mais necessário.