Discurso do Presidente da República por Ocasião do Acto Público de Constituição do Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável

Lisboa
02 de Outubro de 2001


A modernização do país depende fortemente da percepção de que o papel social das instituições se alterou significativamente. A capacidade de adaptação à mudança é uma condição decisiva da modernização. Ninguém pode ignorar esta realidade. Nem o sistema político, nem as instituições.

As transformações por que passam as sociedades modernas são cada vez mais rápidas. Por este motivo, a inovação é crucial para o nosso País. A manutenção de processos ou formas de organização caducos e a recusa em experimentar e avaliar novos procedimentos paga-se muito caro nos dias de hoje.

Numa altura em que já há quem teorize sobre a passagem da ênfase na produtividade humana para a produtividade dos recursos, a problemática do desenvolvimento, dos seus modelos, da sua sustentabilidade e, deste modo, da sua responsabilidade social, intra e inter-geracional, é de enorme importância.

Que um conjunto de empresas de dimensão relevante e com actividades que criam riqueza a partir da exploração de recursos, finitos ou renováveis, se questionem sobre os modelos subjacentes a essas actividades é, em si mesmo, um facto relevante que me cumpre assinalar.

E tanto assim é quanto, infelizmente, não podemos dizer que, em Portugal, estejamos habituados a que, abertamente, se questionem os paradigmas em que assentam os nossos modelos de crescimento. Menos ainda que se questione o nosso tipo de desenvolvimento, sobretudo por parte daqueles que, por serem actores importantes nas actividades produtivas, têm, por isso mesmo, uma responsabilidade objectiva inquestionável.

As preocupações com a maximização dos resultados de curto prazo e a generalizada dificuldade em reflectir-se nos efeitos de mais longo prazo, muitos deles cumulativos e dificilmente reversíveis, de muitas actividades produtivas, obrigam-nos a pensar numa mudança de rumo. Mudança que permita, enquanto é tempo, preservar bens que são públicos, internalizando custos e por aí também obrigando a questionar aqueles modelos.

Enquanto noutros países a exploração eficiente dos recursos e o seu não desperdício já são prática usual e mesmo “obrigatória” e há sinais de uma revolução na produtividade dos recursos, entre nós há ainda um longo caminho a percorrer.

E não poderá pedir-se ao Estado que seja apenas ou sobretudo ele a corrigir o percurso. Se é verdade que, tantas vezes, as práticas burocráticas e rígidas da administração pública geram sinais errados ou são desmotivadoras da acção dos agentes privados, não devemos perder de vista que estamos perante desafios de ordem cultural, mas também económicos, a que esses agentes terão que responder, trabalhando em horizontes temporais alargados.

Estas preocupações com a sustentabilidade, em que o desenvolvimento são e continuado da economia de mercado é indissociável da responsabilidade social dos seus agentes, vão muito para além de noções hoje em voga, como a eco-eficiência, preocupada com melhorias incrementais no uso dos recursos e nos impactos ambientais.

O que está em causa, creio, é um repensar da estrutura e sinalização dos sistemas produtivos, que permita não apenas poupar recursos, mas sobretudo procurar novos produtos, melhores processos, outras dimensões ou escalas, novos materiais, melhores localizações. Em suma, modelos diferentes.

A compatibilização de objectivos económicos e ecológicos, bem como a introdução da alteração climática como factor condicionante de qualquer estratégia de longo prazo, obrigam a repensar e articular as políticas económicas, sociais e ambientais de uma forma integrada, mais do que forçá-las a sucessivos compromissos.

A reflexão que este forum se propõe é difícil, terá que ser séria e nunca estará acabada. Os resultados a que vá chegando serão sem dúvida de extrema valia para um processo que terá que se alargar e que, em diferentes instâncias, terá de envolver todos os agentes económicos e sociais. Sabemos que esse processo é também indispensável à formulação das estratégias e políticas públicas.

Quero felicitar-vos, mais uma vez, pela iniciativa e pelo que ela também testemunha de responsabilização social. Tenham a certeza de que estarei, seguramente, entre os mais atentos seguidores da vossa reflexão.