Discurso do Presidente da República por ocasião da Sessão Solene de Abertura do Ano Académico 2001/2002 do Instituto de Defesa Nacional

Lisboa
28 de Novembro de 2001


É com renovado prazer que me encontro neste Instituto de Defesa Nacional, na Sessão de Abertura de um novo Ano Lectivo, tendo a oportunidade que me é tão grata de, como Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas, me dirigir a um tão ilustre painel de especialistas em questões de Segurança e Defesa.

Quero agradecer ao Senhor Professor Luís de Magalhães a circunstância de nos ter motivado de forma tão estimulante para a temática das “Consequências para as Sociedades da Evolução da Ciência e da Tecnologia”, através da oração de sapiência que acabou de proferir.

Vivemos hoje, na sua plenitude trágica, as consequências dos ataques terroristas perpetrados a 11 de Setembro, e as imediatas ondas de choque que provocou no sistema internacional. Participamos num daqueles momentos de charneira, que nos envolve num ambiente de perturbação e de incerteza.

Os ataques terroristas contra os Estados Unidos, ao atentarem de uma forma bárbara contra os valores do Estado de direito, da democracia e da liberdade, atingiram-nos a todos e abalaram os mais sólidos fundamentos das nossas sociedades e da ordem internacional.

A pronta reacção de condenação da Comunidade Internacional, as manifestações de solidariedade para com o povo americano e a intensa cooperação multifacetada que se gerou para um combate sem fronteiras contra esta ameaça global de uma dimensão nova, de difícil caracterização tipológica e conceptual, vieram alterar as prioridades da agenda internacional.

De forma dolorosa, a Humanidade tomou consciência da dimensão emergente de redes de associações criminosas, que recorrem a meios coercivos de intimidação colectiva. É exigida uma resposta resoluta e solidária de rejeição ao terrorismo com instrumentos e meios globais, num combate de duração indeterminada.

Este é um combate colectivo, de todos nós, em nome do respeito pela vida, pelos direitos do Homem e pelos valores democráticos. Não se esgota em acções militares ou em medidas de segurança; requer uma efectiva política de cooperação internacional multifacetada que promova igualmente a solução duradoura dos conflitos e das tensões regionais que persistem em várias zonas do globo.

É um combate que se desenvolve em várias frentes e que abrange múltiplos domínios, requerendo uma intensa concertação nos diferentes fora multilaterais e no qual as Nações Unidas deverão desempenhar um papel essencial, no espírito da sua Carta fundadora e dos princípios do direito internacional.

Acresce que os Estados do Pacto do Atlântico, como Portugal, perante um caso de agressão como este, estão vinculados pelo princípio de assistência mútua, estando assim, à partida, envolvidos de uma forma particular nesta acção de legítima defesa colectiva.

Portugal empenhou-se neste combate com consciência plena da prioridade da luta contra o terrorismo internacional, dos seus deveres como membro da UE e da NATO, e dos interesses da segurança nacional.

Os nossos esforços inserem-se num quadro de articulação entre os sistemas de segurança internacionais em que estamos integrados e, paralelamente, no reforço do processo de integração europeia.

Existem agora condições acrescidas e razões imperativas para fortalecer o trabalho conjunto dos Estados membros da União Europeia nos domínios da justiça, do controlo das fronteiras e dos espaços aéreos, da concertação entre os aparelhos de segurança interna e externa.

Devemos caminhar no sentido do alargamento da União a outras democracias europeias, mas trabalhar igualmente no aprofundamento do projecto europeu, quer na procura de um modelo político mais integrado, quer no reforço de uma Política Externa, de Segurança e de Defesa Comum, permitindo que a União Europeia aja de forma concertada e se exprima de forma clara e a uma só voz. A criação de uma força militar capaz de exercer as missões de Petersberg foi, certamente, um passo decisivo neste sentido.

Não podemos porém esquecer, neste esforço de unificação das democracias europeias, os Estados que permaneceram fora das estruturas integradoras da União Europeia e da NATO, e cujo contributo é indispensável para a estabilidade do nosso continente e para a consolidação de uma Europa de paz e geradora de paz.

Ainda recentemente, aquando das minhas conversas com o Presidente Putin em Moscovo, pude constatar a importância que as autoridades russas atribuem a um maior e mais confiante aprofundamento das relações entre o seu País e aquelas estruturas.

É de facto importante que ultrapassemos os conceitos e as reservas herdadas de uma época anterior, que saibamos reforçar a confiança mútua e que não dêmos azo a sentimentos de exclusão com consequências sempre nefastas para a estabilidade e a segurança internacionais que pretendemos reforçar. A Rússia, tal como a Ucrânia, são países europeus de parte inteira, e como tal têm que ser encarados e aceites pelos restantes europeus.

Neste sentido, a nossa próxima presidência da OSCE – única organização de segurança colectiva que é simultaneamente pan-europeia e transatlântica – revestir-se-á de uma particular importância em termos da prossecução dos trabalhos para definir a Plataforma para uma Segurança Cooperativa que permita multiplicar as sinergias entre organizações, evitar redundâncias e sobreposições de iniciativas, e reforçar a segurança do nosso Continente.

Empenhado no alargamento e aprofundamento da União Europeia, no reforço da NATO e na vitalização da OSCE, Portugal não esgota, porém, na Europa, o âmbito da sua afirmação internacional.

A assunção clara da nossa vocação universalista, o estreitamento das nossas relações com outros países e outros espaços, o reforço da cooperação com os nossos parceiros da CPLP, constituem objectivos que não apenas valem por si próprios como valorizam a nossa posição no seio da UE.

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

É com esta envolvente estratégica internacional que pretendo agora partilhar convosco, de forma renovada, quatro reflexões:

-A primeira diz respeito ao nosso edifício legislativo em matéria de Defesa Nacional.

-A segunda, à necessidade de revisão do nosso Conceito Estratégico.

-A terceira, ao conteúdo das competências do Comandante Supremo das Forças Armadas.

-A última reflexão tem como objecto a procura necessária de um consenso político, tão alargado quanto possível, sobre as grandes questões de Defesa Nacional.

No que toca à primeira reflexão, considero que a Assembleia da República assume uma importância fundamental no debate sobre o nosso papel no plano internacional e na definição da legislação no domínio da segurança interna e da reestruturação das Forças Armadas, como repetidamente tenho referido.

A Defesa Nacional constitui-se como a actividade do Estado destinada a preencher um dos seus fins essenciais, que é o da Segurança, sendo as Forças Armadas um corpo especial destinado a assegurar a componente militar.


Entendo por isso, que qualquer alteração registada nos conceitos e nos grandes referenciais estratégicos que comandam a política de segurança e defesa conduz, necessariamente, a alterações no Direito da Defesa Nacional e das Forças Armadas.

Os dezoito anos decorridos desde a última reforma constitucional e legal em matéria de Defesa e Forças Armadas são, por si só, razão necessária e suficiente para rever o âmbito e o objecto da Defesa Nacional, ultrapassados os condicionalismos conjunturais e face aos novos tipos de desafios, internos e externos, com que o Estado de Direito se vê confrontado e de que se citam:

-o incremento de novas e diversas formas de criminalidade internacional e de terrorismo;

-a necessidade de resgate de cidadãos nacionais e dos seus bens que se encontrem em risco, no quadro da emergência de conflitos armados nos Estados onde se encontrem.

Nesta linha, urge dotar a República Portuguesa com os adequados instrumentos legislativos, contemplando as lacunas entretanto identificadas, de que se destacam de forma inquestionável as relacionadas com situações de crise; para tal será desejável, como sempre afirmei, que a sua aprovação assente num consenso nacional abrangente e duradouro, sobre as orientações e os objectivos estratégicos da política de defesa.

Recordo que a Revisão constitucional de 1997 deu o devido relevo à participação portuguesa nas missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faz parte. Importa, agora, dar a correcta importância ao enquadramento jurídico e ao papel que deve caber aos diferentes órgãos de soberania, clarificando papéis e responsabilidades nestas matérias.

Como tenho repetido em inúmeras ocasiões, entendo serem suficientes e adequados os poderes que a Constituição atribui ao Presidente da República.

Penso que não há necessidade de proceder, nessa matéria, a quaisquer alterações. No entanto, considero questionável a forma como o legislador ordinário concretizou ou preencheu o estatuto constitucional do Presidente da República, no que se refere às competências que, no domínio da Defesa Nacional e das Forças Armadas, devem consubstanciar as suas funções de Comandante Supremo.

É conhecida a reserva de contenção utilizada na altura da aprovação da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas. Esta atitude, já discutível e controversa em 1982, é hoje claramente problematizada, quer pelas necessidades de funcionamento equilibrado do sistema de governo, quer pelas expectativas que a população portuguesa e os vários agentes políticos dirigem à intervenção do Presidente da República.

Essas expectativas e responsabilização são justificadas, são compatíveis com a natureza do nosso sistema de governo, mas não encontram, por ora, qualquer correspondência na forma como a lei ordinária configura o estatuto do Presidente da República enquanto Comandante Supremo das Forças Armadas.


Esta dissonância é particularmente evidente num domínio que tende, hoje, a assumir um protagonismo político decisivo na política de defesa. Trata-se da participação de contingentes militares portugueses nas operações humanitárias e de paz, no quadro dos compromissos internacionais do Estado português e dos casos de incidentes que impliquem o emprego das Forças Armadas, sem que ocorra ou se justifique prévia declaração de guerra.

Nas situações extremas e, por isso mesmo, de ocorrência mais remota, como são as situações de guerra declarada, a lei dá ao Comandante Supremo da Forças Armadas o direito de assumir a direcção superior da condução da guerra em conjunto com o Governo. Surpreendentemente, porém, no que se refere às missões de paz e humanitárias, de ocorrência muito mais provável, o silêncio da lei quanto às competências do Presidente da República, seja no momento da decisão seja quanto ao seu acompanhamento, é total, sendo natural que as responsabilidades dessa decisão política incumbissem, também aí, conjuntamente ao Governo e ao Presidente da República.


Outra importante decisão constituinte foi a de conferir uma representatividade mais alargada à composição do Conselho Superior de Defesa Nacional. Sublinho de novo a necessidade de uma reflexão sobre a natureza, composição e funções de um órgão que completa quase duas décadas de funcionamento. Há que torná-lo cada vez mais uma instância de consulta e de preparação aprofundada, quando se trate das vertentes mais significativas da organização e planeamento estratégico da Defesa Nacional e esteja em causa a preparação de decisões complexas ou de iniciativas a enviar ao poder legislativo, e aliviando-o, paralelamente, das suas competências meramente administrativas e que não têm lugar num órgão de consulta verdadeira.

A minha segunda reflexão refere-se à necessidade de Portugal assumir, enquanto Nação, o objectivo colectivo de revisão do seu próprio Conceito Estratégico Nacional, estabelecendo as suas prioridades e os seus objectivos.

O Conceito Estratégico Nacional é traduzido nas Grandes Opções e também, no Conceito Estratégico de Defesa Nacional e na consequente reavaliação do Conceito Estratégico Militar.

Uma observação atenta dos contextos estratégico, político e social, nos quais estamos inseridos, revela-nos mudanças inquestionáveis e que incentivam uma cuidada reflexão sobre as concepções de Segurança, interna e externa, e Defesa Nacional.

Saliento algumas importantes mudanças, das quais é preciso extrair ensinamentos:

-a alteração profunda no cenário estratégico europeu;

-a consolidação de um conceito mais amplo de segurança, parte integrante da política externa nacional, e que transcende a área tradicional de defesa;

-a alteração nos conceitos e nas estruturas da OTAN, onde se incluem os conceitos de interoperabilidade, forças conjuntas e combinadas e a iniciativa de capacidades de defesa;

-o desenvolvimento da Iniciativa Europeia de Segurança e Defesa e a criação de uma capacidade operacional própria;

-a profissionalização das Forças Armadas;

-a diminuição sustentada da probabilidade de adopção de medidas de reacção a uma guerra generalizada, em particular no que se refere a uma mobilização geral de recursos.

Compete-nos concretizar as tarefas nacionais que referi, pelo que são necessários adequados e rigorosos processos de decisão.

São exigíveis, também, num quadro político e estratégico em que a natureza dos conflitos se alterou, uma melhor percepção dos riscos e ameaças potenciais, e resposta claras às seguintes questões:

-Que missões cometer às Forças Armadas?

-Quais os reflexos na estrutura do sistema de forças e do dispositivo?

Se, por um lado, a importância das acções indirectas, nomeadamente no âmbito cultural, social, político, económico e psicológico é crescente e sobrepõe-se, por vezes, ao uso directo e imediato dos meios militares, por outro estamos obrigados a reflectir sobre a natureza e caracterização das guerras, onde as restrições ao emprego de meios tácticos nucleares e das armas químicas e biológicas, parecem não ter evitado o acesso a estes meios por certos países e por grupos terroristas, que se tornaram num risco acrescido para a estabilidade internacional dos Estados.


Por isso, entendo que as nossas Forças Armadas não deverão ser a resultante de um exercício simples de redução do Sistema de Forças existente, mas antes um novo Sistema de Forças, feito e construído a pensar nas missões em função das novas ameaças, com a dimensão humana e as capacidades operacionais adequadas ao cumprimento das finalidades constantes da Constituição e da Lei.

A profissionalização das Forças Armadas, matéria de importância central, está associada à redução de efectivos militares, mas também à modernização do material e equipamento e a uma preparação realista que dê resposta às exigências dos conflitos, tendo presente a real natureza das ameaças.

Há que atender ao facto do papel das Forças Armadas não se dever confinar a uma lógica da defesa convencional, embora mantendo um dispositivo capaz de assegurar a defesa da integridade do território nacional, missão prioritária das Forças Armadas.


Entendo que as Forças Armadas, para poderem assumir novos desafios e novas missões de garantia da segurança colectiva no quadro das Alianças em que nos inserimos e de sustentação da projecção externa do Estado, têm que se reformular profundamente, de acordo com um processo gradual mas firme nos seus objectivos

Uma vertente crucial deste processo é o estabelecimento e a consolidação de uma verdadeira e nova doutrina de acção conjunta das Forças Armadas, com projecção no sistema de ensino e de formação dos militares, na programação anual de exercícios operacionais, no aumento das capacidades operacionais conjuntas. As leis de programação militar são o instrumento resultante de um planeamento estratégico que terão que traduzir essa nova e exigente realidade.

É esta a minha convicção: as Forças Armadas de Portugal, possuem, como valor mais relevante, a qualidade dos seus militares.


São exigíveis, no entanto, melhorias nas características militares, tecnológicas e operacionais que as tornam disponíveis e eficazes para o cumprimento das missões, de acordo com um novo modelo de Forças Armadas de excelência, e capazes de uma efectiva interoperabilidade com os nossos Aliados. São melhorias que devem acompanhar os conceitos que enformarão a nova estrutura da NATO, resultante dos critérios do novo Conceito Estratégico e da Iniciativa de Capacidades de Defesa, tendo em atenção uma cuidada análise em aspectos de administração e preparação das forças.

Quando me refiro a uma nova doutrina de acção conjunta das Forças Armadas estou a apontar o caminho incontornável que conduz ao desenvolvimento sustentado de capacidades militares assentes em forças estruturadas com base na integração equilibrada entre forças terrestres, navais e aéreas, caracterizadas pela eficácia e pela complementaridade, evitando duplicações e excesso de recursos.

Os Ramos das Forças Armadas terão que ver efectivadas e exercitadas as suas complementaridades, tirando partido das tecnologias postas ao seu dispor para alcançar as necessárias sinergias resultantes das acções de comando, controlo e coordenação.
Pensar de forma integrada constitui um desafio às mentalidades. Cada um dos Ramos é uma componente valiosa e determinante para as Forças Armadas e a Defesa Nacional. Só este entendimento permite continuar a manter a solidez da Instituição Militar.

Como mencionei há pouco, a minha terceira reflexão refere-se às minhas funções de Comandante Supremo das Forças Armadas.

É fulcral a definição sustentada e consensual de novos conceitos, coerentes com os desafios que o País enfrenta, e projectando um sentido de modernidade para a sociedade portuguesa.

O meu empenho em dar particular atenção substantiva à função de Comandante Supremo das Forças Armadas tem sido permanente e iniciou-se quando assumi as funções de Presidente da República.

No início do meu primeiro mandato, defini os grandes objectivos e linhas de acção a prosseguir no âmbito das competências que me são institucionalmente cometidas, em matéria de Defesa Nacional e das Forças Armadas.

Com isso, propus-me dar conteúdo a um conceito de acção através da identificação das áreas que merecem maior atenção e de uma interpretação da Lei no tocante à esfera da minha acção presidencial e, também, como Comandante Supremo das Forças Armadas.

Acompanho com a maior atenção os assuntos relativos à Defesa Nacional e à Instituição Militar, e pugno pelo reforço do prestígio, da dignificação e da coesão das Forças Armadas.

Também no domínio da política de defesa nacional tenho procurado prosseguir uma magistratura de moderação e de equilíbrio, no escrupuloso respeito pela separação de poderes e empenhado na cooperação institucional com os restantes órgãos de soberania.

Tem sido este exercício de uma magistratura activa que dá voz às necessidades de mudança, que aponta orientações e que tem como objectivo a dignificação permanente das Forças Armadas e dos que nela servem.

Assim, tenho-me empenhado em dar, no momento e tempo oportunos, os necessários impulsos para a transformação e modernização da Defesa Nacional e das Forças Armadas, em consonância com aquilo que entendo ser o exercício da magistratura presidencial.
O meu entendimento é de que ao Comandante Supremo das Forças Armadas compete enfatizar o carácter nacional da Instituição Militar e fomentar o desenvolvimento de uma mentalidade democrática sobre a defesa nacional, tornando sólida a ideia de que ela deve ser sentida e partilhada por todos os portugueses, no quadro do regime em que vivemos e no respeito pelas suas Instituições.

A existência das Forças Armadas está intimamente ligada à essência do Estado e ao conceito de soberania e de independência nacional. É a identificação da Instituição Militar com o País e com os cidadãos que fundamentam essa ligação.

Conto, naturalmente, com a solidariedade institucional dos órgãos de soberania e das diferentes estruturas de defesa e militares para o correcto acompanhamento da evolução dos assuntos relativos à defesa nacional, com relevo para a sua reestruturação e reforma, tema de grande importância e sensibilidade que exige cuidados redobrados nos métodos e nos processos.


Entendo que a evolução dos assuntos relativos à defesa nacional, nomeadamente no que respeita aos reajustamentos do seu edifício legislativo e à implementação do ciclo de planeamento estratégico de defesa nacional, bem como as mudanças estruturais e de funcionamento da Forças Armadas, são matérias de especial atenção do Presidente da República e que não posso ser alheio à definição e concretização de orientações neste domínio.

Trata-se, afinal de contas, de exercer o direito de ser informado e consultado pelo Governo, e de o aconselhar, se for caso disso, sobre a condução da política de defesa nacional e sobre a situação das Forças Armadas e dos seus elementos, através, sobretudo, de uma permanente comunicação e concertação institucional.

Em quarto e último lugar, parece-me, legítimo afirmar mais uma vez que as grandes questões relacionadas com a Defesa Nacional e a Instituição Militar, pelos superiores objectivos em causa - nomeadamente a defesa dos objectivos nacionais permanentes, a preservação dos interesses nacionais e o reforço do prestígio externo do País - deverão inserir-se num amplo espaço de consenso nacional e constituírem factores congregadores da vontade e determinação dos Portugueses.

A abordagem dos assuntos atinentes à Defesa Nacional e às Forças Armadas deveria assim ser feita, em permanência, com elevado sentido de Estado.

A Assembleia da República é sede da representação de todos os cidadãos portugueses e, por isso, constitui o local privilegiado para se desenvolver uma discussão nacional séria, ponderada e sempre actualizada, sobre as linhas básicas da Segurança e Defesa Nacional e Instituições por ela abrangidas.

Reafirmo a importância de obter acordos políticos alargados nesta matéria, pelo que faço votos que a Assembleia da República tenha em todo este debate um papel central e seja uma referência de serenidade, de análise e de ponderação de opções e estratégias globais, participando na elaboração e aprovação de um documento global de referência para o enquadramento das opções estratégicas nacionais e de Segurança e Defesa.


Reafirmo a minha vontade em ver concretizados novos passos para a racionalização e reestruturação das Forças Armadas que têm sido para mim preocupação permanente. A Lei de Programação Militar, instrumento para a sua modernização, configura a necessidade de uma reflexão profunda e séria das razões para o insucesso na execução de leis sucessivas, nomeadamente desde 1987, a que não são alheias responsabilidades, ao nível político e ao nível militar, nas insuficiências e vulnerabilidades que hoje existem nos equipamentos e nas infraestruturas de defesa e das Forças Armadas.

Na realidade, o esforço notável que é exigido ao País para assegurar a modernização das Forças e a criação de novas e adequadas capacidades operacionais, vertidas nas leis de programação militar, só poderá ser aceite se houver garantias firmes de que o planeamento, a programação, a obtenção e a operacionalização dos múltiplos e complexos sistemas e subsistemas, se baseia em modernos métodos de planeamento e gestão integrada e em adequadas estruturas organizacionais da Defesa Nacional e das Forças Armadas.

Os orçamentos de Defesa Nacional e Forças Armadas constituem uma matéria importante e que exige muita ponderação e rigor.

A profissionalização das Forças Armadas e a modernização do armamento e equipamento, aspectos estruturantes fundamentais, levam a que os orçamentos de defesa devam assentar sobre bases realistas e concretizadoras dos objectivos propostos.

Os aperfeiçoamentos concorrentes da gestão e da racionalização em aspectos organizativos deverão ter reflexos positivos em termos de financiamento

Este cenário exige rigor no estabelecimento dos objectivos e na sua quantificação para uma adequada previsão de necessidades, de uma forma conjugada com os interesses nacionais no seu conjunto e com as exigências de contenção da despesa pública.

Por outro lado, a satisfação dos nossos compromissos com os Aliados supõe a existência de um referencial estável e realista que evite incertezas. Desta forma, estão criadas condições para alcançar os objectivos da profissionalização das Forças Armadas, da sua modernização e apetrechamento, do aumento da cooperação internacional, da correcta utilização das disponibilidades orçamentais e do incremento da indústria de defesa.

Apesar das definições por concretizar e das restrições e carências de vária ordem, estou certo que as Forças Armadas continuarão a cumprir as suas nobres e importantes missões com a determinação e a eficiência que são seu apanágio e de acordo com os superiores interesses nacionais, fazendo juz à sua prestigiosa história.

Continuo a não ter dúvidas sobre a importância e prioridade que deve ser atribuída à reforma da Defesa Nacional e das Forças Armadas. Entendo que ao Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas compete pugnar pela defesa da Instituição Militar e tudo farei, no quadro das minhas competências, para que as mudanças estruturais e de funcionamento se façam com visão, contribuindo decisivamente para a nossa afirmação no mundo do século XXI.