Discurso do Presidente da República por ocasião da Abertura do Seminário "Avaliação e Acreditação"

Lisboa
30 de Novembro de 2001


É com muito prazer que participo nesta iniciativa do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior. Com a minha presença aqui quero afirmar, uma vez mais, a importância que atribuo à criação de uma cultura de avaliação no sector da educação

A prioridade com que tenho encarado este sector tem-me levado a contactar de perto as instituições de diferentes níveis de ensino e a conhecer melhor a sua evolução.

Nunca será excessivo reafirmar esta prioridade, nem tão pouco lembrar que, apesar dos importantes progressos realizados, só com o esforço de todos ultrapassaremos os problemas que persistem em todo o sistema educativo e, em especial, nos primeiros anos de escolaridade, em que se estruturam as bases decisivas para as aprendizagens futuras. Permitam-me, pois, que neste seminário dedicado ao ensino superior, vos transmita também a minha preocupação com a escola básica, em que é urgente melhorar a qualidade e a capacidade de integração educativa.

Minhas Senhoras e Meus Senhores

Nestes últimos anos, participei em numerosas iniciativas levadas a cabo por instituições de ensino superior, ouvi os seus problemas e as suas propostas. Em debates com os professores e com os alunos dos ensinos universitário e politécnico, público e privado, tenho conhecido a complexidade crescente deste sector, no que diz respeito ao funcionamento institucional e às formações desenvolvidas.

Estamos hoje face a um sistema que sofreu nos últimos anos profundas mudanças, que cresceu de forma vertiginosa, que se diversificou e do qual muito se espera. O acesso ao ensino democratizou-se, há novos públicos que o frequentam, a formação avançada dos docentes progrediu de modo muito significativo e foram realizados importantes investimentos, em edifícios e em equipamentos. Também a Acção Social Escolar sofreu uma evolução importante, sendo necessário, contudo, melhorar o apoio aos estudantes nas suas diferentes componentes.

Temos a obrigação de mostrar ao país estes importantes passos já dados. Acredito, e tenho-o afirmado, que nunca é excessivo o investimento que se faz nas pessoas e no conhecimento. Não haverá democracia nem desenvolvimento sem esse investimento. Mas é importante contrariar a ideia de que essa é, só por si, a condição suficiente para promover a qualidade.

É necessário que o crescimento e o aumento de recursos seja acompanhado de estratégias para melhorar a qualidade, o que obriga a transformações profundas do funcionamento das instituições e da sua ligação com a sociedade, dos processos de organização do ensino, da pedagogia, das condições para o desenvolvimento da investigação científica, da relevância das formações.

O esforço realizado pelo nosso país, bem como os desafios colocados hoje a todo o ensino superior requerem maior qualidade e novas respostas que não podem esperar.

As mudanças recentes exigem que se conheçam bem as instituições que temos, o que implica estudá-las e avaliá-las. Só assim poderemos melhorar o ensino e adaptá-lo às exigências dos novos tempos.

Tenho defendido a importância e a urgência de desenvolver uma cultura de avaliação, base fundamental para uma gestão rigorosa e para o desenvolvimento da inovação.

É, contudo, essencial que desta avaliação sejam retiradas consequências e que ela se constitua como um elemento de aperfeiçoamento do funcionamento das escolas.

A avaliação deve servir, a meu ver, para corrigir situações problemáticas, mas deve servir igualmente para identificar inovações e boas práticas.

A avaliação é essencial à decisão política, à correcção do sistema e à melhoria dos cursos. Não podemos ficar paralisados em torno das nossas dificuldades e devemos valorizar o que de positivo fazemos. Só assim ganharemos confiança na nossa capacidade de resolver problemas e de evoluir.

Quero partilhar convosco quatro desafios relacionados, de algum modo, com o tema do vosso seminário:

O primeiro desafio diz respeito à divulgação dos dados obtidos pelo sistema de avaliação do ensino superior.

Estes primeiros anos de funcionamento foram também anos de aprendizagem, em que se realizaram grandes esforços de aperfeiçoamento.

É necessário que esses esforços sejam melhor conhecidos e mais valorizados.

Deixo-vos, por isso, o apelo para que os resultados dos processos de avaliação sejam divulgados de forma mais simples e de acesso mais fácil.

O segundo desafio diz respeito à qualidade da dimensão profissional das formações superiores. São hoje exigidos, às instituições de ensino superior, novos conteúdos e práticas de formação.

Considero tema urgente de estudo o papel das escolas de ensino superior na formação de profissionais e a estruturação das formações práticas, designadamente junto de instituições e organizações onde serão mais tarde exercidas as profissões. De uma boa articulação entre esta dimensão e a formação teórica, bem como da cooperação entre as diferentes instituições envolvidas, resultará a formação de profissionais mais competentes.

Não se trata de subestimar a formação teórica, cultural ou cívica, que considero dever das instituições promoverem, mas sim de repensar a formação dos alunos, assegurando o desenvolvimento de atitudes e competências importantes ao exercício profissional. Trata-se, igualmente, de pensar com exigência, mas também com inovação, o acompanhamento e a formação dos profissionais no início e ao longo das suas carreiras.

Gostaria de vos deixar, também aqui, um apelo para que se estabeleçam os necessários mecanismos de concertação e regulação entre instituições de ensino, sistemas de avaliação e ordens profissionais. Aqui reside um urgente incontornável desafio.

O terceiro desafio diz respeito à necessidade de reflectir sobre as alterações decorrentes da criação de um espaço de ensino superior europeu na sequência da Declaração de Bolonha.

Para que o ensino superior português progrida em qualidade, ao longo do processo de adesão à Declaração de Bolonha, é necessário e urgente uma reflexão e debate profundos sobre as alterações a introduzir, sem abdicar de exigência, mas com capacidade para colocar de lado preconceitos muitas vezes inúteis.

A comparabilidade das formações para a qual se pretende evoluir, não deverá significar uniformidade nem diminuição da qualidade. Pelo contrário. As mudanças a introduzir deverão ter em conta o conhecimento dos sistemas de ensino superior e da sua diversidade. Constituirão, a meu ver, um estímulo à mobilidade de alunos e profissionais que, por sua vez, é um meio de enriquecimento cultural e também de fomento do diálogo e de compreensão internacional.

O quarto desafio diz respeito ao desenvolvimento da capacidade de reconhecimento pelas instituições de formação, de competências profissionais e habilitações adquiridas em diferentes fases da vida.

A educação ao longo da vida é uma exigência do nosso tempo, essencial em Portugal para colmatar o défice de quadros qualificados. É necessária a sua estruturação com coerência e profundas transformações ao nível dos métodos pedagógicos, dos ritmos do ensino e com recurso a novos meios, incluindo o ensino à distância.

O desenvolvimento de competências das instituições no domínio da creditação e da valorização dos saberes adquiridos em contextos, formais ou não formais, constitui um dos caminhos mais difíceis, mas decisivo para a construção de uma sociedade de conhecimento e de aprendizagem ao longo da vida.

Este é, porventura, o maior desafio com que se debaterá a escola do futuro.

Minhas Senhoras e Meus Senhores

O Seminário que tem hoje lugar vai, seguramente, contribuir para melhorar o conhecimento sobre a diversidade dos problemas em causa neste debate, inovador no nosso país, e para clarificar a especificidade dos papéis desempenhados, bem como as competências das entidades que concorrem para a aprovação dos cursos, sua avaliação e acreditação.

Considero que esse conhecimento pode impulsionar mudanças pertinentes e criar novos desafios ao ensino superior. Felicito, por isso, o senhor Professor Adriano Moreira pela iniciativa em boa hora tomada pelo Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior.

Desejo-vos as maiores felicidades para o vosso trabalho.