Mensagem ao País sobre a dissolução da Assembleia da República

Palácio de Belém
28 de Dezembro de 2001


No uso dos poderes que a Constituição me confere, decidi dissolver a Assembleia da República. Ouvi os partidos com assento na Assembleia da República e ouvi o Conselho de Estado.

Dessas consultas não resultou qualquer facto contrário à minha convicção de que a actual Assembleia da República é insusceptível de gerar um novo Governo, seja qual for a respectiva base política e parlamentar.

Esta convicção esteve presente na avaliação das soluções possíveis para a situação originada pela demissão apresentada pelo Senhor Primeiro Ministro, na sequência das eleições do passado dia 16 de Dezembro.

As eleições municipais, dada a sua natureza e finalidades específicas, não devem, em regra, ter uma directa tradução política no plano nacional. Não é desejável, no contexto do nosso regime constitucional, que uma dissolução da Assembleia da República possa ser determinada por eleições administrativas locais.

Contudo, o fundamento invocado pelo Senhor Primeiro Ministro para a sua demissão e a leitura praticamente unanime que, no plano nacional, foi dada às eleições municipais de 16 de Dezembro criaram uma situação politicamente nova. Tal leitura e respectivas consequências não devem ser ignoradas pelo Presidente da República. O interesse nacional, critério supremo de decisão a que está vinculado, determinou que, neste caso, ponderasse o recurso a eleições antecipadas.

Por isso, dou voz ao eleitorado para que manifeste a sua vontade.

A unanimidade dos partidos parlamentares relativamente à vantagem da dissolução da Assembleia da República ? por mim verificada ? não pode fazer-nos esquecer que todas as dissoluções têm custos e que esta não foge à regra. A dissolução interrompe a estabilidade do funcionamento da Assembleia ? e a concomitante estabilidade governativa ? de que beneficiávamos há quase quinze anos.

Mas, como sempre disse, a estabilidade é um meio, não constitui um fim em si mesma. Está fora de dúvida que a vantagem da dissolução da Assembleia é superior aos seus custos ? sobretudo por ter sido criado um facto que impede a própria continuidade governativa. E também porque a concretização do sufrágio universal trará às instituições uma legitimidade renovada e uma nova energia ao nosso sistema político.

Os portugueses escolherão livremente. Cabe-me garanti-lo, no quadro das minhas funções e competências enquanto primeiro responsável pelo regular funcionamento das instituições democráticas.

A necessária rapidez das decisões, por todos reconhecida, deverá evitar a precipitação. Importa assegurar que as opções dos portugueses sejam tomadas após um debate vivo e esclarecedor, como é próprio de um regime pluralista. O recurso à vontade popular impõe condições de debate sereno e responsável.

Assim, ponderadas todas as circunstâncias, marco a eleição da nova Assembleia da República para o dia 17 de Março de 2002. Em obediência à lei, o decreto de dissolução será assinado oportunamente. Até à formação de novo Executivo, o actual Governo ficará em gestão, nos termos constitucionais.

A eleição a que vamos proceder, com todos os custos que imporá aos portugueses, tem um objectivo e um só objectivo: criar condições para um bom Governo de Portugal ? para que Portugal seja governado e seja bem governado.

A manifestação da vontade popular permitirá clarificar e legitimar escolhas políticas essenciais para enfrentarmos o futuro. A República beneficiará com essa clarificação e com essa legitimação democráticas, em favor da estabilidade política indispensável para fazermos face aos desafios exigentes do contexto interno e internacional.

Seja qual for o resultado das eleições, não esquecerei este objectivo nacional.

Peço a todos os portugueses que o não esqueçam também.