Discurso do Presidente da República por ocasião da Homenagem ao Professor Manuel Gomes Guerreiro

Faro
04 de Dezembro de 2001


Sinto-me honrado em me poder associar à homenagem que hoje se presta ao Professor Manuel Gomes Guerreiro.

Como é sabido, conheci pessoalmente o Prof. Guerreiro, por quem nutria uma grande admiração. Lembro-me de lhe pedir colaboração, que obtive prontamente, em duas iniciativas da minha presidência: uma jornada sobre o Guadiana, no quadro de uma visita ao Algarve, e uma jornada sobre a Fileira Florestal. Em ambos os casos, o Prof. Gomes Guerreiro prestou um testemunho de saber e de experiências notáveis.
Conhecedor como poucos da problemática dos ecossistemas, cuja sustentabilidade tanto o preocupava, o Professor Guerreiro era igualmente um homem do Algarve, acompanhando de perto a evolução dos seus delicados equilíbrios. Nas duas últimas décadas da sua vida, o Prof. Guerreiro dedicou-se de forma intensa aos problemas ambientais, tendo sido Secretário de Estado do Ambiente nos primeiros Governos Constitucionais.

Também no que diz respeito ao conhecimento da floresta, apresentava o Prof. Guerreiro um curriculum notabilíssimo. Discípulo do Prof. Vieira Natividade, foi pioneiro na discussão pública dos problemas ambientais no mundo rural, sobretudo os decorrentes da intensificação da agricultura e da redução das áreas florestais.

Quero, igualmente, sublinhar aqui, na Universidade de que foi primeiro Reitor, o papel destacado do Prof. Guerreiro como construtor de Universidades. Construtor não apenas no sentido de criador de um saber rigoroso, actualizado e que se projecta na sociedade, mas também no sentido literal de criador de instituições universitárias.

O professor Manuel Gomes Guerreiro defendeu uma visão humanista relativamente ao papel da escola e à necessidade desta assumir, desde as primeiras idades e em todos os níveis de ensino, a democracia, o “respeito pelos bens e riqueza da terra”, “a tecnologia e a economia ao serviço do Homem”. Insistia também nesta mensagem que a escola devia transmitir: “a beleza natural poderá ser, se quisermos, um bem, talvez o único, de duração verdadeiramente ilimitada”.

Nesta perspectiva, preconizou para o ensino superior no Algarve a necessidade de atribuir a maior importância ao Homem, ao Ambiente e aos Recursos, como base de bem-estar e desenvolvimento.

Manuel Gomes Guerreiro foi pioneiro no modo de encarar a organização do ensino superior, defendendo a instalação integrada dos ensinos universitário e politécnico. Considerou necessária e enriquecedora para a região a articulação das duas realidades com a diversidade dos seus contributos. Como já o disse noutros momentos, considero esta experiência de integração merecedora de melhor conhecimento e valorização.

Vivemos uma fase, em que após um importante crescimento, há que procurar os caminhos para o reforço da qualidade, para a eficácia e para a democratização. O estudo e valorização das experiências positivas, como é o caso da Universidade do Algarve, é muito importante.

O curriculum do Prof. Gomes Guerreiro no sector da educação vinha, porém, de trás. Recordo a sua actuação em Angola, nos anos 60/70, onde chegou a Vice-Reitor, na Comissão Instaladora da Universidade de Évora e, por fim, na Reitoria do Universidade do Algarve.

Ao terminar, não quero deixar sem uma referência o cidadão Manuel Gomes Guerreiro, que sempre afirmou os valores da dignidade da pessoa, da sua liberdade e autonomia. O seu percurso e o seu exemplo cívicos foram marcados pela inteireza de carácter, pela exigência para consigo e para com os outros, pela independência de juízo crítico e pela preocupação humanista.

Em sinal de reconhecimento público, atribuí ao Prof. Manuel Gomes Guerreiro a Grã Cruz da Ordem de Instrução Pública. Infelizmente, a morte impediu que o pudesse agraciar pessoalmente. Faço-o agora, a título póstumo, em homenagem à sua memória e para sublinhar que continua vivo o exemplo que nos deixou.