Discurso do Presidente da República por ocasião da deslocação a Municípios do Médio Tejo

Sardoal
20 de Fevereiro de 2002


Minhas Senhoras e Meus Senhores:


Desde que exerço o cargo de Presidente da República, tenho procurado atrair a atenção da opinião pública, dos responsáveis políticos e dos agentes económicos para os problemas do desenvolvimento regional e local.

Foi nessa perspectiva que promovi em Junho de 1997 um conjunto de iniciativas, a que chamei Jornada do Interior, onde as assimetrias de desenvolvimento no território português foram objecto de reflexão especial.

Através de contactos directos com as populações, técnicos, autarcas e outros responsáveis políticos, foi possível, nessa altura, obter um panorama das principais dificuldades que se colocam a extensas regiões do País. Dificuldades em matéria de atracção de investimentos, de diversificação dos tecidos produtivos locais e regionais, de criação de emprego capaz de fixar as populações mais jovens, de aproveitamento de recursos naturais, ambientais e paisagísticos, de defesa e promoção do património arquitectónico e cultural, etc..

O livro Perspectivas de desenvolvimento do interior, cuja edição promovi na sequência da iniciativa em causa, regista o essencial do diagnóstico e das propostas de intervenção que então foram suscitadas.

Os últimos anos vieram introduzir algumas mudanças no perfil de desenvolvimento regional do País.

Assim, e tal como há cinco anos já se vislumbrava, assistiu-se entre nós a um reforço significativo da importância demográfica e económica de centros urbanos de pequena e média dimensão, com consequências positivas, nomeadamente a da atenuação de fluxos migratórios dirigidos para a orla litoral do Continente. Os Resultados Preliminares do Censo de 2001 dão indicações claras neste sentido.

Esta mudança não é certamente indiferente às orientações políticas traçadas por sucessivos governos, nem ao modo como foram utilizadas as verbas dos Quadros Comunitários de Apoio. Mas ela é também o resultado do amadurecimento das orientações de gestão autárquica no sentido de uma aproximação às reais necessidades das populações e da sua qualidade de vida.

É altura de fazermos um balanço sobre as políticas de desenvolvimento regional e local dos últimos anos. As visitas ao terreno que agora efectuo num conjunto de Municípios do Médio Tejo e Centro procuram dar um contributo para essa avaliação.

Importa, no essencial, saber se tais políticas (ou quais delas) conseguiram atingir o objectivo de correcção de assimetrias que prosseguiam.

Cabe averiguar, além disso, se o âmbito municipal se tem revelado como o mais adequado a pôr em prática políticas de desenvolvimento regional capazes de contribuir para a coesão económica e social do território.

É necessário interrogarmo-nos sobre o papel que têm tido e podem ter as Associações Intermunicipais e as Comissões de Coordenação Regional nesta matéria. Haverá modelos de descentralização capazes de, na ausência de Regiões Administrativas, conferir maior coerência às políticas de desenvolvimento regional?

É preciso saber, por outro lado, como têm reagido os agentes económicos às medidas e intenções governamentais de incentivar a fixação de quadros nas regiões desfavorecidas, de conceder benefícios fiscais às empresas, de discriminar positivamente as regiões pobres em sede de PIDDAC, de apoiar regiões agro-rurais em declínio.

Ter-se-á reforçado o dinamismo empresarial dessas regiões?

Não haverá, por outro lado, o risco de o crescimento demográfico dos centros de pequena e média dimensão ter como reverso a desertificação e desvitalização económica dos espaços rurais circundantes? E se tal acontecer, não será verdade que o esforço da administração central e local em matéria de criação de equipamentos sociais e culturais acabará por perder parte da sua utilidade potencial?

Quando se analisa o País com base num conjunto de indicadores não estritamente económicos, por forma a incluir, nomeadamente, os que se referem a escolarização, esperança de vida e condições sanitárias básicas, constata-se que as assimetrias entre as grandes regiões do País surgem relativamente atenuadas. Mas se a análise descer ao nível concelhio, logo se verifica que muito há ainda a fazer para colmatar as desigualdades que persistem.

Julgo que esta deslocação a alguns concelhos situados numa região restrita do território nacional pode ser expressiva deste tipo de assimetrias. A poucos quilómetros de distância, podemos encontrar equipamentos sociais de qualidade e escassez de equipamentos ou de técnicos capazes de os pôr a funcionar; grande dinamismo empresarial e ausência desse dinamismo por falta de infraestruturas adequadas; incentivos à fixação de populações jovens e factores que estimulam a sua saída das regiões de origem.


Minhas Senhoras e Meus Senhores:

Decidi começar esta iniciativa dedicada ao desenvolvimento regional e local com uma visita à Escola de Ensino Básico e Secundário que recebeu hoje o nome "Dr.ª Maria Judite Andrade". É uma forma de afirmar, na sequência do que sempre tenho feito ao longo dos meus mandatos, que considero a educação como o sector mais decisivo para o futuro do País e para a afirmação dos portugueses

A democracia e a integração de Portugal na Europa criaram as condições para se investir neste sector e fazer dele uma prioridade.

Governos, professores, autarcas, famílias têm realizado consideráveis esforços que permitiram uma significativa expansão do acesso a todos os níveis de ensino, com especial destaque, nos últimos anos, para o pré-escolar e o superior. É um progresso com que nos devemos regozijar.

O esforço que ainda temos de realizar continua a exigir, entretanto, a definição de metas e caminhos precisos, bem como um investimento persistente em recursos e formação, para que o País se possa afirmar no plano cultural e económico, enriquecendo ao mesmo tempo a vivência democrática dos seus cidadãos.

Tenho apelado a uma veemente responsabilização social nesta matéria.

Estou especialmente preocupado com os índices de insucesso e abandono escolar, que põem em causa o efectivo cumprimento da escolaridade obrigatória e impedem o alargamento da frequência no secundário e formação profissional.

Também me parece indispensável generalizar mecanismos de avaliação da qualidade do ensino e racionalizar a gestão dos recursos disponíveis. É necessário, por outro lado, não deixar de encarar medidas essenciais à estabilidade do corpo docente das escolas, à avaliação do mérito e a um melhor aproveitamento das competências dos professores.

Reconheço que, face aos problemas reais, muitas soluções têm sido criadas, muitas energias têm sido mobilizadas no dia-a-dia das escolas, muitas parcerias bem sucedidas têm sido estabelecidas.

Saliento, entre o que vamos poder conhecer melhor nos próximos dias, as mudanças em curso na rede de estabelecimentos de ensino, visando quebrar o isolamento e diminuir as desigualdades que continuam a penalizar as crianças dos meios rurais. Mas não menos importante será poder ver de perto experiências inovadoras de apoio ao estudo, formação profissional, educação de adultos e um centro de validação e certificação de competências.

Como sempre, procurarei que esta descida ao terreno onde se faz a vida concreta dos portugueses concretos seja um pretexto para identificarmos dificuldades e bloqueamentos ao desenvolvimento, mas também, e acima de tudo, motivo para admirarmos e incentivarmos as iniciativas que se vão gizando no sentido de fazer de Portugal um espaço economicamente mais homogéneo e socialmente mais coeso – em suma, um espaço mais capaz de proporcionar igualdade de oportunidades aos cidadãos que o habitam.