Discurso do Presidente da República por ocasião do 120º Aniversário da Associação de Jardins-Escola João de Deus

Lisboa
15 de Maio de 2002


É com o maior prazer que me associo a esta Sessão Solene comemorativa do centésimo vigésimo aniversário da Associação de Jardins-Escola João de Deus.

Com a minha presença nesta cerimónia, bem como com a visita que farei daqui a pouco ao primeiro Jardim-Escola João de Deus criado em Lisboa, quero homenagear a iniciativa dos homens e mulheres que nesta associação, ao longo da sua existência, defenderam ideias e deram corpo a numerosos projectos com os quais a história da educação em Portugal ficou mais rica.

Quero manifestar o meu reconhecimento pelo assinalável contributo da vossa Associação para a democratização da educação em Portugal. Contributo que foi marcante desde a sua criação, em 1882, e ao longo da sua história. É de assinalar o papel da Associação das Escolas pelo Método João de Deus, para combater o analfabetismo, cujo nível atingia, nesse momento, quase 80% da população portuguesa. A alfabetização de mais de vinte e oito mil adultos e crianças foi exemplar. Numa atitude inovadora, o acesso à educação era assumido pelos seus prestigiados fundadores como meio para a dignificação dos portugueses. O empenhamento cívico e a coerência com que traduziram em actos o pensamento político e pedagógico constituem uma lição.

Quero, em segundo lugar, homenagear o pioneirismo desta Associação na promoção da educação da infância. As iniciativas desenvolvidas desde 1911, neste domínio, foram da maior relevância.

Permitam-me que afirme nesta casa dedicada desde as primeiras décadas do século XX, à infância e, em particular, à educação pré-escolar, a importância que atribuo a este nível de ensino para o desenvolvimento das potencialidades de todas as crianças. Considero, por isso, essencial que se prossigam os esforços necessários para o alargamento do acesso e para o aperfeiçoamento da educação pré-escolar no nosso país.

Todos sabemos que a infância é uma idade decisiva. A educação promovida pelas escolas, ou a ausência dela, a acção da família, a socialização efectuada nos espaços informais definem muito do que será o futuro das crianças e o seu desenvolvimento. Considero que a educação pré-escolar é essencial para desenvolver a capacidade de pensar e para a aprendizagem da cidadania, designadamente através da vivência das regras de vida em comum, da partilha dos espaços, do conhecimento e para a aceitação das diferenças.

Mas a escola por si só não pode resolver grande parte dos problemas que se colocam hoje ao desenvolvimento das crianças. É, por isso, necessário que a educação desenvolvida na escola desempenhe uma acção complementar da família. A par da importância da escola é preciso, a meu ver, sublinhar o papel relevante dos pais e das famílias, dos amigos e dos espaços informais na educação das crianças.

A acção dos pais e a sua colaboração com a escola são insubstituíveis. Tenho defendido a necessidade de favorecer uma maior presença das mães e dos pais junto dos seus filhos, e a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar com políticas de apoio às famílias, com acções concertadas sobre a qualidade de vida, a organização das cidades e da vida social.

Minhas Senhoras e Meus Senhores

A defesa das condições para a aplicação dos Direitos das Crianças em Portugal, e no mundo, é uma das minhas prioridades.

Na intervenção que proferi a semana passada na Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre a Criança apelei para a necessidade de construção de um mundo em que o direito de ser criança e jovem constitua uma realidade universal sem quaisquer distinções nem discriminações. Para que tal aconteça há, todavia, ainda um longo caminho a percorrer. Se bem que a Convenção dos Direitos da Criança constitua um ponto de viragem e um marco fundador da história da criança, enquanto sujeito de direitos próprios, há ainda que definir uma agenda internacional, exigente e prioritária a favor da criança.

Ao terminar esta intervenção, quero associar-me à merecida homenagem que hoje prestam ao ilustre poeta João de Deus, autor de vasta obra literária e pedagógica, designadamente da célebre Cartilha, que deu origem a um método de aprendizagem, de grande difusão e mérito. A sua obra, associada à sua coerência política, tornaram-no a maior referência pedagógica do século XIX.

Quero também saudar, na pessoa do Doutor António de Deus Ponces de Carvalho, a ilustre família de pedagogos, que desde o final do século XIX, contribuem para melhorar a educação em Portugal, com empenhamento cívico, propostas políticas, projectos e acções.

Desejo-vos as maiores felicidades para o futuro.