Discurso do Presidente da República por ocasião da Apresentação Pública do Livro "Climate Change in Portugal. Scenarios, Impacts and Adaptation Measures Project"

Lisboa
24 de Junho de 2002


É com todo o prazer e empenho que participo nesta sessão. Nos últimos 15 anos a ideia de sustentabilidade do desenvolvimento tem penetrado praticamente todos os sectores da vida pública e faz parte das agendas das organizações da esfera política, das organizações e associações não-governamentais e das empresas. O seu sucesso como princípio unificador do comportamento nas suas dimensões económica, social, ecológica e da capacidade institucional contrapõe-se à dificuldade de construir e pôr em prática planos de acção efectivos focados nas diversas vertentes da sustentabilidade.

O nosso principal objectivo deve ser, pois, o de assegurar o desenvolvimento social e económico de modo equitativo, mas sem ultrapassar limiares de elevado risco potencial para o ambiente, tanto à escala global, como regional e nacional.

Um dos problemas mais gravosos e de maior complexidade neste início do século XXI é o das alterações climáticas. Proteger o sistema climático da Terra, através da redução das emissões de gases com efeito de estufa, e adoptar medidas de adaptação para minorar os efeitos adversos das alterações climáticas são desafios cruciais para os próximos cem anos.

Há essencialmente dois tipos de resposta face ao problema das alterações climáticas. A mitigação que consiste na redução das emissões de gases com efeito de estufa e a adaptação que consiste em procurar minorar os efeitos adversos das alterações climáticas. A Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas e o Protocolo de Quioto são os principais instrumentos internacionais no que respeita à mitigação.

Portugal e a União Europeia ratificaram o Protocolo de Quioto e espera-se que em breve haja novas ratificações que permitirão a entrada em vigor do Protocolo. O Protocolo de Quioto em si mesmo não resolve o problema das alterações climáticas, mas é extremamente importante porque cria um processo no âmbito das Nações Unidas que viabilizará uma estratégia internacional e efectiva de mitigação. Cumprir as metas de redução das emissões não será um processo simples ou fácil para os países que ratificaram o Protocolo de Quioto.

Em Portugal também não será simples ou fácil. Há necessidade de pôr em prática políticas, medidas e instrumentos que os mais diversos agentes sócio-económicos terão disponíveis para alcançar a estabilização das emissões até ao primeiro período de cumprimento de 2008 a 2012. Um primeiro passo nesse sentido foi a elaboração da versão 2001 do Programa Nacional para as Alterações Climáticas.

O Programa final, a submeter à Assembleia da República, deverá resultar de uma ampla e participada discussão sectorial e inter-sectorial que envolva efectivamente a administração central, as autarquias, as empresas e as organizações e associações não governamentais. O cumprimento efectivo dos compromissos assumidos por Portugal no Protocolo de Quioto exige uma discussão atempada e participada dos diferentes sectores e parceiros sociais, tendo em vista soluções de consenso, que a todos possam comprometer.

Importa encarar o Protocolo de Quioto não apenas como um condicionalismo, mas também como uma oportunidade. Efectivamente, a obrigatoriedade de reduzir as emissões irá criar, nos países que ratificaram o Protocolo, novas oportunidades de desenvolvimento e inovação tecnológica, em especial no que respeita à eficiência energética, às energias alternativas e a novas energias.

A outra vertente de resposta à problemática das alterações climáticas é a adaptação. É necessário procurar conhecer os impactos das alterações climáticas, com base em cenários climáticos futuros, de modo a poder identificar, seleccionar e pôr em prática medidas de adaptação para minorar os seus efeitos adversos. A nível mundial Portugal não é dos países que serão mais negativamente afectados pelas alterações climáticas. Contudo, a nível europeu vários estudos indicam maior vulnerabilidade no Sul do que no Norte da Europa.

O objectivo do Projecto SIAM, cujo relatório final é hoje apresentado sob forma de livro, foi proceder à primeira avaliação integrada dos impactos e medidas de adaptação às alterações climáticas em Portugal. Trata-se também da primeira avaliação integrada para um país do Sul da Europa, pelo que o trabalho realizado irá, certamente, contribuir para fortalecer a resposta dos países desta região aos desafios colocados pelas alterações climáticas.

O livro que hoje se publica é o resultado de um estudo profundamente multidisciplinar e interdisciplinar que envolveu investigadores nos vários sectores sócio-económicos e sistemas biofísicos nos quais se esperam impactos. A diversidade de formação e actividade profissional dos autores demonstra claramente a necessidade de aliar os contributos da ciência e tecnologia aos contributos das ciências sociais para enfrentar e procurar resolver a complexa problemática das mudanças globais e do desenvolvimento sustentável.

É um primeiro passo, importante, porque adverte para as consequências a médio e longo prazo das alterações climáticas no nosso país. Constitui um alerta fundamental para que encaremos seriamente a necessidade de cumprir o Protocolo de Quioto.

Quero, pois, saudar muito em particular os responsáveis pelo projecto SIAM, bem como as entidades públicas e privadas que nele participam e que o apoiam, na medida em que a rede de colaborações e perspectivas constituída é a melhor garantia de uma apreciação adequada das grandes questões com que nos vamos defrontar no futuro.