Discurso do Presidente da República por ocasião da Sessão de Abertura do XIII Congresso Mundial da IEA - International Economic Association

Centro Cultural de Belém
09 de Setembro de 2002


Professor Robert Sollow, Presidente da International Economic Association
Professor Simões Lopes, Bastonário da Ordem dos Economistas
Professor Jean-Paul Fitoussi, Secretário Geral da International Economic Association
Minhas Senhoras e Meus Senhores

É com grande prazer e muita honra que aproveito esta oportunidade para me dirigir ao Congresso da IEA e aos seus distintos participantes.
Portugal dá-vos cordiais boas-vindas e espero que a intensa semana de trabalho e discussões que têm pela frente constitua uma rica experiência para todos vós.

Pela minha parte, estarei muito atento aos vossos trabalhos e sei que posso contar com a competência e boa-vontade do Senhor Professor António Simões Lopes para mos relatar.

O vosso Congresso realiza-se num momento de enorme incerteza nas economias e sociedades do mundo inteiro.

Se acontecimentos recentes mostram quão complexo é o nosso Mundo e porque é que a natureza humana torna muito mais fácil para os economistas explicar acontecimentos passados do que prever ou influenciar o futuro, eles também ajudam ao processo de repensar o papel da economia e dos economistas.

Como também noutras alturas, o crescimento e a prosperidade de vastas áreas do mundo desenvolvido em anos recentes geraram uma série de mitos e oportunistas, ilusões de sucesso instantâneo e desprezo por bases adquiridas do pensamento económico.

Nos recentes acontecimentos que atingiram os mercados financeiros, o senso comum - mesmo antes do senso económico - alertou para "bolhas" e outras ilusões. Mas, se alguma lição há a tirar, é a de que os mitos desfeitos e o sequente castelo de cartas de escândalos financeiros mostram a necessidade, em nome do bem comum, de reformular e reforçar muitos mecanismos de regulação e de voltar a ter as pessoas e as necessidades humanas como alvo das políticas.

O extraordinário progresso tecnológico das últimas décadas criou enormes desafios aos responsáveis políticos no que respeita ao funcionamento dos mercados e à circulação da informação. A regulação económica tem que ser muito mais ágil e selectiva e deve levar em conta que os mercados financeiros não criam valor mas podem ter efeitos dramáticos na sua redistribuição, numa escala nunca vista antes.

A dimensão social do crescimento económico e o debate em curso sobre a sustentabilidade do desenvolvimento alertam-nos para as tarefas gigantescas de concepção de modelos de maior coesão social, e sei que estas questões também farão parte do vosso debate.

Muito haverá certamente a clarificar nas discussões acerca da globalização e da competitividade, bem para lá dos pressupostos simplistas de teses em voga segundo as quais as economias (e as sociedades) nacionais seriam, ou deveriam ser, geridas como se de companhias e empresas no mercado global se tratasse. As determinantes da produtividade - infraestruturas, educação, investigação - e as escolhas das políticas de receita e despesa públicas no contexto das funções do Estado não são realidades unidimensionais ou de eixo único e não podem ser discutidas sem as relacionar com os objectivos e preferências dos cidadãos nas sociedades democráticas.

Por outro lado, não devemos esquecer que a grande maioria da população mundial ainda sofre de níveis de vida muito baixos, com necessidades básicas de saúde, nutrição e abrigo por satisfazer. A tendência para um mundo mais integrado e globalizado não pode e não deve continuar sem esforços redobrados para atenuar o fosso entre ricos e pobres - o que, aliás, também faz sentido em termos económicos.

A Ciência Económica é hoje uma extraordinária e poderosa área do conhecimento, com recurso a métodos e instrumentos que ajudam a explicar os mecanismos de funcionamento das sociedades humanas. Mas estas são entidades muito complexas, com objectivos económicos e não-económicos e uma enorme diversidade sociológica. Reconhecer os inevitáveis compromissos que daí resultam é inerente ao pensamento dos bons economistas e pode ajudar enormemente na educação de decisores públicos, líderes políticos e cidadãos em geral.

Os temas europeus, muito naturalmente, estarão no centro de muitas das discussões do vosso Congresso. Também aqui estou certo de que avaliareis as lições da extraordinária saga do processo da integração europeia, explicando e medindo os seus efeitos e discutindo as suas complexidades e dificuldades.
A Europa é um mosaico imenso de culturas e realidades históricas e sociais que deu o enorme salto do conflito para a integração no decurso de uma geração. Isso foi possível através de um processo nem sempre linear mas em que valores civilizacionais e sociais condicionaram a economia de mercado, embora sem pôr em causa os principais ensinamentos da ciência económica.

À medida que este processo se consolida - e não me atrevo a perguntar quantos de entre vós, há cinco ou dez anos, apostariam na viabilidade do Euro… - e avança para leste, novos e formidáveis desafios confrontam governos, instituições, empresas e indivíduos. É de esperar que os economistas desempenhem a sua parte na descrição e explicação das realidades e mecanismos relevantes, assim ajudando a clarificar as escolhas políticas que cidadãos informados continuarão a ser chamados a fazer.

A terminar, sei que partilharão o vosso conhecimento e reflexão, trocando e discutindo pontos de vista com clareza e não permitindo que o vosso pensamento seja invocado em vão!

Para mim é muito claro que a Economia, como ciência humana (haverá alguma que o não seja?), não é responsável pelas falhas dos mercados ou dos governos. Mas bom pensamento económico é necessário para regular os primeiros e clarificar as inevitáveis escolhas dos segundos.