Discurso de SEXA PR por ocasião de um Debate Conjunto com o Presidente da República da Hungria, Ferenc Mádl, sobre o Futuro da Europa com Jovens Portugueses

Centro Cultural de Belém
17 de Setembro de 2002


Senhor Presidente da República da Hungria,
Meus Senhores e Minhas Senhoras,
Caros estudantes


Agradeço ao Senhor Presidente Ferenc Mádl o ter-se disponibilizado a participar neste encontro com jovens e estudantes portugueses. É também com o maior prazer que dirijo uma saudação especial aos jovens convencionalistas portugueses aqui presentes, congratulando-me antecipadamente com a sua activa participação no debate que irá ter lugar. Quero igualmente felicitar o Centro de Informação Jacques Delors pela organização de mais esta feliz iniciativa.

A realização deste encontro constitui uma ocasião privilegiada. Primeiro porque teremos a honra e o prazer de compartilhar com o Senhor Presidente Mádl a sua visão da Europa - nas vésperas da adesão da Hungria à União Europeia, é importante conhecermos as ambições, as expectativas bem como as preocupações dos nossos futuros parceiros. Depois, porque os jovens aqui presentes saberão, estou certo, transmitir-nos a sua natural confiança no futuro e dar um contributo importante para refundar a Europa.

Não podemos nem devemos esquecer que o que está em jogo é precisamente o futuro dos nossos jovens. A Europa que hoje edificarmos moldará o seu mundo de amanhã. Só com a sua participação activa, este projecto adquire pleno sentido. Por isso, acompanhei com a maior atenção e interesse os trabalhos da Convenção dos Jovens, que se reuniu em Bruxelas, em Julho último. Mas, não tinha ainda tido a possibilidade de ouvir, de viva voz, os jovens portugueses que participaram naquela iniciativa e, confesso, estou ansioso por me inteirar das suas reflexões.

Antes de ceder a palavra ao Senhor Presidente Mádl e de ouvir os jovens convencionalistas portugueses, gostaria, no entanto, de tecer algumas observações para alimentar o debate e incitar os jovens a prosseguirem as suas reflexões, encorajando-os a empenharem-se activamente na construção da Europa futura.

Deter-me-ei brevemente em dois pontos: a concepção da Europa, tal como formulada pelos jovens convencionalistas, e a questão do sentido de uma cidadania europeia jovem.

Uma visão da Europa para os próximos quinze a vinte anos

Respondendo ao repto que lhes foi lançado, os jovens convencionalistas europeus traçaram, com frontalidade, clareza e simplicidade, a matriz da Europa em que pretendem viver.

Em suma, pedem-nos mais e melhor Europa, ou seja: desejam, primeiro, uma Europa alargada e com uma vocação claramente internacionalista; em segundo lugar, reclamam uma Europa aprofundada, com políticas europeias mais desenvolvidas e abrangendo novos domínios; em terceiro lugar, defendem uma Europa baseada no princípio da igualdade, mais coesa, mais solidária e mais inclusiva, uma Europa mais democrática, transparente e eficaz, mais próxima dos cidadãos e, especialmente, dos jovens.

É necessário frisar que, com o próximo alargamento, a União dobrará um cabo histórico na via da reunificação do continente europeu. Alargada, a Europa ganhará em peso e estatura para se poder afirmar no mundo globalizado, para fazer valer os seus pontos de vista e interesses. Não poderemos falhar esta oportunidade única para reforçar a projecção externa da velha Europa. Mas deveremos igualmente fazer do alargamento uma oportunidade de renovação da dinâmica interna da integração - para reforçarmos a solidariedade e a coesão, para desenvolvermos as políticas comuns, para relançar o desenvolvimento social e económico em toda a Europa. Estes são também os desafios irrecusáveis que o alargamento representa.

Confesso que foi com grande satisfação que vi reafirmados, no texto final aprovado pela Convenção dos Jovens, os princípios e ideais que pessoalmente me guiaram na minha juventude, e que nele encontrei a expressão de uma idêntica vontade e determinação em contribuir para a construção de um mundo mais humano.

Entendo que os jovens têm um papel insubstituível a desempenhar na construção da cidadania europeia e considero particularmente encorajante e promissora a visão da Europa que os nossos convencionalistas nos apresentaram. Traduz um desígnio e traça um plano. As suas preocupações, expectativas e prioridades encontram-se claramente indicadas. Contém também algumas sugestões que merecem ser exploradas e um conjunto de propostas que poderão ser aperfeiçoadas. Mas revela fundamentalmente uma consciência aguda dos problemas hodiernos, uma percepção, a meu ver, correcta e justa da natureza da construção europeia e do papel da Europa no mundo.

Os jovens convencionalistas europeus exprimiram uma firme vontade de participar no debate em curso sobre a refundação da Europa, propõem-se cooperar na mobilização da juventude europeia para o seu próprio futuro. São propósitos que merecem todo o apoio e estímulo. Detecto no êxito desta Convenção a manifestação forte de uma cidadania europeia jovem, que julgo indispensável desenvolver e fortificar se quisermos reservar ao projecto europeu um futuro sustentável.

Uma cidadania europeia jovem

Sobre esta questão, apenas algumas considerações. A primeira, é de carácter genérico e diz respeito à necessidade de reforçar aquilo a que chamaria, o princípio da responsabilização cívica dos nossos jovens. Se não se inculcar nos jovens um sentido de solidariedade social e geracional sem fronteiras, dificilmente se poderá lutar contra todo um conjunto emergente de desigualdades e de riscos de um tipo novo a que os jovens estão mais particularmente expostos. Penso na insegurança, na precaridade, mas também nas pandemias, na toxicodependência e em todas as outras situações potenciadoras de exclusão. Penso igualmente nos desafios que o desenvolvimento sustentável coloca a nível da adaptação dos comportamentos individuais e de sociedade. A meu ver, há que desenvolver uma cultura cívica nova. A globalização exige um sentido de responsabilidade com uma dimensão vincadamente universalista.

O conceito de cidadania tem de ser redimensionado em função das realidades do nosso século. Para além de sermos nacionais de um determinado Estado e de sermos europeus, somos, antes de mais, cidadãos do mundo. A preservação da natureza, o bem-estar dos nossos concidadãos e o desenvolvimento das sociedades dependem do nosso grau de empenhamento e de participação na vida pública, quer seja a nível das organizações da sociedade civil, quer seja a nível político. É através da construção de um espaço público forte e amplamente participado que poderemos preservar os mecanismos democráticos das nossas sociedades e assegurar a salvaguarda do interesse geral. A meu ver, a Europa constitui também uma magnífica oportunidade de renovar o pacto social com os jovens e restaurar a sua cidadania e participação cívica.

As gerações mais jovens - como a vossa – já cresceram sob o signo da Europa. A paz, a liberdade e a democracia são uma constante das vossas vidas. Os efeitos da integração económica europeia têm marcado o vosso horizonte quotidiano. Participaram certamente nos programas de mobilidade estudantil. Tiveram a possibilidade de estagiar em outros países. Acolheram também, estou certo, colegas europeus nas vossas escolas ou locais de trabalho. Falam línguas. Estão acostumados ao convívio multicultural, familiarizados com outros modos de pensar e estilos de vida. Preparam-se talvez para passarem uma temporada num outro país, para enriquecer a vossa formação ou para adquirir uma experiência de trabalho multinacional.

Esperam naturalmente que os vossos diplomas de origem sejam reconhecidos, que vos sejam aplicadas regras e condições idênticas às dos nacionais, que haja garantias a nível da igualdade de tratamento e de oportunidades. Talvez até pretendam ter uma palavra a dizer no âmbito da gestão autárquica do local onde residem. Sem a Europa, tudo isto seria uma utopia. Hoje, é uma realidade de facto para alguns e uma possibilidade aberta a todos. Deveremos agora fazer com que, no futuro, a Europa se conjugue no quotidiano de todos os jovens europeus.

Para terminar, gostaria de evocar uma última questão que talvez vos inquiete. Para os jovens portugueses, para os nossos amigos húngaros e, em geral, para todos os jovens oriundos dos países de pequena dimensão, a Europa não representará muito mais um desafio do que uma oportunidade ? A Europa não será uma fonte de problemas suplementares, impondo exigências acrescidas e criando novas dificuldades, barreiras e obstáculos ? Imagino facilmente que estas são algumas das interrogações e dúvidas que as minhas palavras foram aqui suscitando. Gostaria de as poder dissipar.

É inegável que a Europa ao criar oportunidades gera desafios. Desafios tanto mais exigentes quanto mais adversas forem as condições. Mas onde há desafio, há possibilidade de sucesso e perspectivas de futuro. Este é o ponto decisivo.

Ser jovem europeu de um pequeno país, com uma economia e um grau de prosperidade e de desenvolvimento médios, como são, por exemplo, Portugal e a Hungria poderá implicar, comparativamente a outros europeus, um esforço redobrado de preparação, um sólido nível de educação e de formação profissional. Em suma, os nossos jovens terão de apostar na excelência. Mas, simultaneamente detêm um trunfo. Portugueses e húngaros pertencem, ambos, a nações com uma identidade cultural forte. Ora, a riqueza do projecto europeu reside precisamente na pluralidade de línguas, culturas e histórias dos povos que congrega. Deste ponto de vista, países como Portugal e Hungria têm um papel fundamental a desempenhar porque podem – e devem - apostar no valor da diferença cultural para a construção europeia.

Estou certo de que os nossos jovens saberão beneficiar da sua qualidade de europeus não só para fazer prosperar Portugal e a Hungria, para enriquecer a sua gesta e cultura, mas também para dar à Europa um contributo inestimável que só a sua história antiga e cultura pujante permitem. Porque, afinal, é bom não esquecermos, a identidade europeia, que nos une, é o cerne do projecto europeu e a diversidade cultural, o fundamento último da nossa casa Europa.

Muito obrigado ao Presidente Mádl.
Muito obrigado a todos.